Iniciou-se no Tribunal de Ponta Delgada o julgamento de um homem de 58 anos de idade, da freguesia do Pico da Pedra, pelo crime de violência doméstica contra a sua ex-mulher. Um dos filhos do ex-casal é igualmente arguido no processo, embora não tenha marcado presença ontem no tribunal. A este propósito, o procurador do Ministério Público defendeu que a sua ausência não impedia o decurso dos trabalhos e o juiz, que presidia o Colectivo de Juízes, confirmou que a presença deste arguido não era imprescindível para o início da audiência.
Após um casamento de 29 anos, o casal acabaria por se divorciar no final do mês de Maio de 2017. Aquando do divórcio, ficou decidido que a habitação ficaria para usufruto da vítima, pelo que, a 20 de Março de 2022, as fechaduras da casa foram trocadas e o arguido foi avisado de que não podia entrar naquela residência.
Destaque-se que o arguido já tinha sido condenado no Tribunal da Ribeira Grande pelos crimes de violência doméstica e desobediência, e estava impedido de contactar com a vítima por um período de dois anos, assim como o filho de ambos, arguido neste processo.
No entanto, segundo refere o Ministério Público, ambos desrespeitaram as indicações e não tendo abandonado a casa, continuaram a contactar e a destratar a queixosa. No que diz respeito ao filho, é relatado que este arguido exigia dinheiro à mãe para os consumos e que quando esta negava, ele gritava, partia objectos e subtraía dinheiro para consumir droga. Terá chegado, inclusive, a levar desconhecidos para casa, para os consumos.
Quanto ao ex-marido, que se encontrava a viver num anexo situado no quintal da propriedade, é referido que este a insultava constantemente, prometendo-lhe pancadas com as muletas.
Segundo consta na acusação do Ministério Público, após o julgamento na Ribeira Grande, o arguido “bebia muito” e provocava discussões, aproximando-se constantemente da vítima. Além disso, é mencionado que o homem controlava as suas horas de entrada e saída.
A acusação narra um incidente em específico, em que a vítima terá saído de manhã no autocarro e só terá regressado ao final do dia. O ex-marido ter-se-á dirigido à paragem de camioneta para esperar a vítima, pedindo-lhe justificações e agredindo-a em seguida.
Outro incidente remonta a 5 de Janeiro, quando o arguido terá insultado a vítima, despindo-se de seguida e urinando no quintal.
É relatado outro episódio, ocorrido no dia 15 de Abril deste ano, em que o homem de 58 anos terá insultado a vítima e ter-lhe-á dado várias pancadas com uma bengala.
Uns dias mais tarde, a 27 de Abril, pelas 15h00, o homem terá entrado na casa e insultado a ex-mulher, acusando-a de estar envolvida com outros homens e tendo-lhe desferido várias pancadas com a canadiana. Em mais do que uma ocasião, o arguido ter-se-á dirigido à rua e dito a homens para levaram a vítima “para o cerrado.”
É, ainda, acusado de desligar a água e a luz da residência, com o intuito de impedir a vítima de usufruir destes bens e de deixar a torneira do quintal aberta, para que a factura de água da vítima fosse mais elevada.
Alegadamente, quase todos os dias, pelo meio-dia, batia com uma bengala na porta e dizia à vítima que queria comer, exigindo que esta cozinhasse para ele.
O arguido optou por se pronunciar acerca dos factos sobre ele imputados. Admitiu ter insultado a ex-mulher em múltiplas ocasiões, porém afirmou que nunca lhe bateu e negou ter entrado na habitação.
“Tenho medo dele”
Chegada à altura de a vítima dar o seu testemunho, o arguido foi afastado da sala de audiências. Dando a sua versão dos factos, a ofendida proferiu “tenho medo dele”. Envergonhada, relatou as agressões de que foi alvo e enumerou os nomes que o ex-marido lhe chamava. Confessou, ainda, não se lembrar da quantidade de vezes que foi agredida, por ser algo recorrente.
O Ministério Público entende que estes maus-tratos provocaram ofendida “humilhação, medo, ansiedade, angústia” e afirma que os arguidos agiram de forma consciente e deliberada contra a lei, apesar de saberem que não podiam entrar dentro da habitação.
Tendo em conta que o arguido já tinha sido julgado no Tribunal da Ribeira Grande, tendo sido avisado que não podia entrar em casa da vítima e que tinha de se afastar dela, pende também sobre o homem de 58 anos um crime de desobediência.
O arguido encontra-se, desde 27 de Julho de 2023, detido no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada, onde aguarda julgamento.
Carlota Pimentel