Um Colectivo de Juízes do Tribunal de Ponta Delgada começou a julgar um homem de 38 anos por dois crimes de homicídio qualificado na forma tentada e de um crime de detenção de arma proibida. As vítimas são os pais da ex-companheira do arguido, de 74 e 76 anos de idade.
O casal manteve um relacionamento durante alguns anos, do qual resultaram três filhos, tendo o término da relação ocorrido no mês de Maio de 2021.
De acordo com a acusação do Ministério Público, na audiência que decorreu ontem, o arguido não terá aceite o fim da relação e acreditava que os pais da ex-mulher eram culpados por instigar a filha contra ele.
Assim, no dia 7 de Março deste ano, antes das 06h00, motivado pela alegada vingança, o arguido ter-se-á munido com uma catana de 62 centímetros de comprimento e um martelo de pedreiro, e terá conduzido até à residência dos progenitores da ex-companheira, no Pico da Pedra. Ao chegar ao local, o homem é acusado de danificar a fechadura da cancela que dá acesso ao logradouro da habitação, bem como de partir a fechadura e o vidro da porta da rua com o martelo, de forma a conseguir entrar na moradia, ao mesmo tempo que proferia ameaças aos gritos.
O casal terá acordado com o barulho e o aparato causados, e a vítima de 76 anos ter-se-á dirigido à porta de entrada para perceber o que se passava. Surpreendido com o arguido já dentro da sua casa, a vítima ter-se-á refugiado no seu quarto de cama, junto da sua esposa, trancando a porta. O arguido ter-se-á dirigido ao quarto do casal e desferido várias pancadas na porta de madeira, acabando por conseguir parti-la e entrar na divisão. O arguido empunhava uma catana. Enquanto alegadamente gritava “vou-vos degolar, velhos” e “vocês estragaram a minha vida”, terá empurrado o ex-sogro, projectando-o contra a parede, o que fez com que caísse ao chão.
De seguida, terá empurrado a mulher de 74 anos, que terá batido contra o parapeito da janela, desferindo-lhe de seguida, com a catana, um golpe na cabeça, provocando-lhe um ferimento no mesmo local onde tinha sido sujeita a uma intervenção cirúrgica devido a um tumor. O marido da vítima terá tentado sair do quarto para pedir socorro, altura em que o arguido o terá agarrado pelo pescoço, levando-o para o exterior da casa. Já no quintal, o alegado agressor estaria prestes a desferir um golpe com a catana no ofendido, não fosse a intervenção de um vizinho do casal que terá conseguido afastar o homem, até à chegada das autoridades. Fruto destas agressões, o casal teve de ser transportado ao hospital para receber tratamento. O queixoso sofreu, além dos danos psicológicos e emocionais, um traumatismo no maxilar inferior, com perda de dois dentes e a ofendida um ferimento na cabeça.
O Ministério Público acredita que o arguido teria matado o casal, caso não existisse esta intervenção por parte dos vizinhos e, posteriormente, da PSP. Entende, ainda, dada a idade avançada das vítimas, que o arguido tinha consciência de que as vítimas eram pessoas que não ofereciam grande resistência, nem se saberiam defender propriamente.
Destaque-se que o arguido foi julgado esta semana pelo crime de violência doméstica contra a ex-companheira.
Versão do arguido:“Estava embriagadíssimo e tomei comprimidos a mais”
O arguido ouviu os factos sobre ele imputados e optou por prestar declarações em Tribunal. Começou por salientar que, na altura dos factos, estava a tomar medicação para a depressão. Mostrou-se arrependido e declarou que “em condições normais, não faria isso.” E prosseguiu: “estava fora de mim. Estava embriagadíssimo e tomei comprimidos a mais”.
Questionado por um dos juízes do Colectivo, o homem admitiu que “queria pregar-lhes um susto”. Disse, ainda, não se recordar de alguns factos do incidente, mas afirmou que não tinha intenção de matar os pais da ex-companheira. O arguido justificou, por várias vezes, o seu comportamento devido ao consumo de álcool e à mistura explosiva desta substância com medicação.
Testemunho das vítimas: “Vi a morte ali”
O progenitor da ex-companheira foi a primeira testemunha a ser ouvida em Tribunal. Após relatar os factos e de ter afirmado que viu a morte naquele momento, a vítima referiu que, desde o incidente, “deixei de ser o que era. Qualquer coisa, assusto-me.”
Referiu, ainda, que actualmente só sai de casa para se deslocar ao hospital ou para ir ao supermercado. O ofendido, que é doente cardíaco, tem tido acompanhamento regular por parte de uma psicóloga desde a altura do ocorrido.
Por sua vez, a vítima de 73 anos à data do crime afirmou ter ficado com medo de estar sozinha em casa e, inclusive, de ir à casa de banho durante a noite.
O arguido encontra-se detido no Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada desde a altura do incidente, onde aguarda o termo do julgamento.
Carlota Pimentel