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“Sou diabético e não me considero uma pessoa doente,” diz João Pedro, personal trainer que há três anos descobriu ter Diabetes Tipo 1

Assinala-se hoje o Dia Mundial da Diabetes. O Correio dos Açores foi ouvir o testemunho de João Pedro Feio, personal trainer de 38 anos, natural de Setúbal, que há três anos descobriu que tinha Diabetes Tipo 1. O instrutor de fitness, que sempre levou um estilo de vida saudável, conta que os primeiros dias após o diagnóstico foram difíceis, mas hoje reconhece que “é possível ter uma doença crónica e fazer uma vida normal,” e que com uma alimentação saudável e exercício físico os diabéticos podem ter qualidade de vida por mais tempo. No entanto, alerta para a prevalência da Diabetes Tipo 2, que é o “problema mais grave” e pode levar a doenças cardiovasculares.

Correio dos Açores – Licenciou-se em Educação Física e Desporto Escolar. Pode contar um pouco sobre o seu percurso académico.
João Pedro Feio (personal trainer) – Entrei para o curso de Educação Física e Desporto em 2008. Anteriormente, tinha tirado o curso de Gestão de Sistema Ambiental. Só trabalhei no ambiente quando fiz o estágio, na Câmara Municipal da Moita. A nível do ambiente faço apenas pequenas coisas, como a agricultura biológica e ser o mais auto-sustentável possível.
A nível do desporto, pratico desde os três anos, natação e ginástica, e quando foi na altura de ir para a universidade estava muito inclinado entre o desporto e o ambiente. Depois, mais tarde, o desporto foi o que prevaleceu. Sempre fiz várias modalidades, e acabei por ir para o ensino, neste caso. Só tenho trabalhado na área do desporto. Também já estive ligado ao futsal, durante quatro anos, quando estive na primeira divisão, com o Fabril. Fui atleta de karaté e também dava aulas de substituição. Fui atleta de basquetebol, voleibol, remo, mas o karaté foi a modalidade que fiz durante mais tempo.

Trabalha como personal trainer e director do ginásio.
Sou director técnico do ginásio. Faço serviços de personal trainer. Tento sempre dar o meu contributo pessoal, como doente crónico. Neste caso, não tenho ninguém comigo com diabetes, mas na área específica que tenho, do pré e pós-parto – costumo dar treinos a mulheres grávidas – e aí também tento consciencializar para evitar o Diabetes Gestacional, que é algo muito comum durante a gravidez. Tento sempre dar o meu contributo nesta área. Gosto muito de trabalhar também com grávidas. Dou algumas aulas básicas, como aulas de treino funcional, ou de abdominais de 15 minutos, ou um treino em circuito. O meu foco é mais o treino personalizado e aqui a parte da sala de cardio-muscular, de dar apoio directamente aos sócios e estar aqui a ajudar todos, em geral.

É diabético Tipo 1?
Sim, sou diabético Tipo 1, o chamado insulinodependente. Tomo insulina todos os dias. Os diabetes nasceram comigo, apesar de só me terem sido detectados há três anos. Há três anos é que comecei a ter os sintomas e descobri que era diabético. Tinha securas constantes, sem saliva na boca, tinha visão turva, e uma das coisas que me chamou mais atenção, foi que perdi muito peso rapidamente, cerca de 10 quilos em menos de um mês. Até que percebi que algo não estava bem com o meu corpo e decidi ir ao centro de saúde. Tive a doença escondida durante uma vida inteira, e por um despertar devido a uma causa de stress, sofri uma mutação genética, e despertou-me, então, a Diabetes. Neste caso, o meu pâncreas deixou de produzir insulina.


Como foi receber a notícia de que tinha diabetes?
Na altura não foi muito fácil. Foi primeiro em consulta no Centro de Saúde da Ribeira Grande, depois tive de ir ao hospital para o serviço de endocrinologia, fazer mais testes e verem o meu histórico familiar. Foi então que o médico confirmou que era diabético e que tinha os sintomas de um diabético. Na altura, tinha noção que havia qualquer coisa semelhante, porque os diabetes e a tiróide tornam-se muito semelhantes – mas eu estava sempre a descartar os diabetes. É claro que quando saio do hospital, já com a minha prescrição médica e ir buscar as insulinas à farmácia e tudo o mais, quando uma pessoa chega a casa é que se dá a “queda”, o abatimento, e claro que não foram fáceis os primeiros dias. Ao final da semana, uma pessoa já está um pouco mais ciente e consciente. Depois é como tudo, é uma questão de aceitação. Não é uma doença grave, é algo crónico que vive comigo para o resto da vida.
Tenho de ter pequenos hábitos alimentares, que já tinha, e no meu caso mantive-os. Não ingiro bebidas alcoólicas nem refrigerantes, apenas água. A diferença é que hoje tenho um sensor no braço e tenho de andar com a insulina comigo. Três vezes por dia, antes de cada refeição, tenho de tomar a insulina para a quantidade de hidratos que vou ter de comer, mas em tudo o resto faço a minha vida normalmente.

Que cuidados tem de ter na alimentação?
Neste caso específico, não tenho de ter o cuidado normal que um diabético Tipo 1 tem. A maior parte dos diabéticos do Tipo 1 é hiperglicémico. No meu caso, sou hipoglicémico, tenho falta de açúcar no sangue. Por isso no meu dia-a-dia faço a minha alimentação normal. Como, à mesma, a minha refeição com proteína animal e vegetal, acompanhada com o hidrato, neste caso, arroz normal, massa integral ou esparguete integral, com índice glicémico mais baixo, mas numa quantidade mais aceitável, neste caso continuo a não fazer a contagem de hidratos, porque faço os meus níveis por estimativa, enquanto um diabético Tipo 1 comum faz a contagem de hidratos para aquilo que está a comer. Ainda faço só por estimativa, mas mais tarde provavelmente, o melhor será fazer a contagem dos hidratos para ter então o nível de insulina certo para aquela refeição que estou a ter e os níveis estarem muito mais regulares. Posso dizer que não faço uma alimentação muito rigorosa porque eu posso comer hidratos à mesma, dentro do controlado.
Tenho de ter sempre dois ou três pacotes de açúcar comigo, mas evito ao máximo usar o açúcar refinado. Como qualquer outro diabético, numa crise de uma hipoglicémia é o açúcar que nos safa. É o açúcar que nos mata, mas também é o açúcar que nos faz viver. Por isso é uma relação de amor e ódio com o açúcar. Perante aquilo que a maior parte das pessoas perguntam, que é se podemos comer açúcar ou não: claro que sim. Uma vez por semana peco também um pouco e gosto do meu doce. O meu objectivo é ter os níveis de açúcar minimamente controlados.

Os diabéticos devem fazer exercício físico? Traz-lhes benefícios?
Claro que sim. Tanto ao Tipo 1 como ao Tipo 2. O diabético Tipo 1 nasce com a diabetes. Somos insulinodependentes. O Tipo 2 é diabético porque quer e normalmente está relacionado à obesidade. Por isso, o diabético Tipo 2, se tiver cuidados alimentares e se fizer actividade física, pode deixar de ser diabético. É claro que com uma actividade física moderada e uma alimentação mais equilibrada, é muito mais fácil termos uma qualidade de vida melhor, até porque a diabetes, num estado mais avançado, causam também perda de peso, pode causar cegueira e amputação dos membros. Por isso sim, recomendo a actividade física em qualquer tipo de diabéticos, seja o 1 ou seja o 2.
O benefício é um melhor controlo, neste caso, fisiológico e hormonal. Consigo ter os meus níveis muito mais controlados do açúcar, porque ao ingerir açúcar ele vai em fazer subir o índice glicémico, mas ao mesmo tempo, vai me fazer baixar depois o índice glicémico. Por isso consigo ter o meu aporte calórico normal, para poder fazer a minha actividade física no meu dia-a-dia, mas ter sempre os níveis mais controlados. É muito mais fácil.

Na sua óptica, qual é a importância de se assinalar o Dia Mundial da Diabetes?
É importante assinalarmos este dia porque, para já, marca um acontecimento histórico, também, da descoberta da insulina, que é o que nos salva, e, sobretudo, para fazer uma maior consciencializar daquilo que é a Diabetes. Primeiro, um diabético pode fazer a sua vida normalmente. Segundo, o facto de sermos diabéticos não nos impede de fazer actividade física nem outro tipo de actividades, ou podemos comer, às vezes, de forma diferente. Mas também para sinalizar, sobretudo, crianças e pessoas mais velhas, com a Diabetes Tipo 2, que é muito mais problemática. Neste caso, em Portugal, estamos a falar de um milhão de diabéticos Tipo 2. Os diabéticos Tipo 1 são oitenta mil. É uma diferença muito grande. No meu ponto de vista, o Diabético Tipo 1 é o diabético mais consciente, o problema está nos diabetes Tipo 2, que é uma doença que aparece devido a maus hábitos alimentares, falta de actividade física, nomeadamente associada a problemas cardiovasculares e obesidade. Aí sim, é um problema muito grande.
O facto de assinalarmos o Dia Mundial da Diabetes, se calhar, é mais importante para consciencializar para a Diabetes Tipo 2, e para outras pessoas que podem não ter diabetes, ainda, mas que podem vir a ter. Tento dar o meu cunho pessoal. Sou diabético, sou profissional de Educação Física, mas sou saudável, e tento passar o máximo possível de informação às pessoas de que é possível ter uma doença crónica e fazer uma vida normal.

Mariana Rovoredo

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