Nuno Raposo, advogado de Ponta Delgada, reflectiu sobre a exortação pós-sinodal Amoris laetitia e as consequências para uma pastoral da “reconciliação e solicitude”
As comunidades cristãs “não podem nem devem” abandonar os pais divorciados e até os devem estimular a educar os filhos na fé cristã, afirmou Nuno Raposo na VIII Conversa na Sacristia, uma iniciativa da pastoral da cultura da Igreja de São José, em Ponta Delgada.
Independentemente das circunstâncias do divórcio, afirma o advogado, “um pai e uma mãe divorciados precisam do apoio da Igreja; se houver apoio espiritual será um consolo que depois se reflete no acompanhamento dos filhos”.
“ A Igreja deve apoiar espiritualmente os divorciados porque eles precisam desse apoio; esse apoio será um alicerce não só para o divorciado como para os filhos, para que não se acrescentem outros pesos a uma situação que muitas vezes é indesejada e que é sempre dolorosa” explicita Nuno Raposo sublinhado a importância de “ajudar a cuidar das feridas espirituais dos pais, cuidando também das dos filhos”.
“Nesta experiência, que é sempre traumática, ainda que integrada, ninguém deve ser excluído” refere o advogado que refletiu sobre um aspecto da exortação pós-sinodal sobre a família- A Alegria do amor- colocando no centro a relação da Igreja com os recasados ou em situações de união de facto depois de um divórcio.
“O divórcio é um mal e um mal preocupante que nos deve fazer refletcir pelo seu aumento” referiu lembrando que a “nossa tarefa mais relevante como comunidades cristãs junto das famílias nessa situação é inclui-las procurando reforçar os laços de amor e ajudar a curar as feridas, para impedirmos o avanço”.
O advogado começou por apresentar o documento, “extenso e com grande densidade filosófica”, como “um olhar actualizado sobre a realidade da família no tempo e no espaço, atendendo à sua diversidade” e a sua leitura resultante da sua condição pessoal de “advogado e uma pessoa com família”.
“Trata-se de uma visão da Igreja sobre a família moderna” que continua a ser considerada “como uma célula fundamental da sociedade, estruturante e por isso há que estudá-la, compreendê-la e defendê-la”.
“Acompanho o Papa quando considera a família como um lugar crucial de crescimento humano e espiritual”, disse destacando a palavra “Inclusão” como sendo a chave de leitura de todo o documento papal, que refere 384 vezes a palavra amor.
Não havendo uma orientação hierárquica explicita e generalizada sobre o que fazer em relação às novas e variadas expressões e organização de famílias, o documento, diz ainda Nuno Raposo, apresenta uma postura da Igreja “muito actual e atenta aos sinais dos tempos”, consciencializando-se das dificuldades das famílias e identificando respostas diferentes para situações diversas, nomeadamente, categorizando as diferentes situações que levam à separação num primeiro matrimónio.
“Julgo que o caminho de discernimento proposto é interessante” refere frisando a importância do acolhimento e da inclusão, sobretudo de todos os “que refizeram as suas vidas, numa relação consolidada no tempo, com fidelidade comprovada, compromisso cristão,” disse.
“Quem age com respeito e amor está num compromisso e não pode ser excluído”, conclui, alertando para a necessidade de, neste caso, a “doutrina e a pastoral irem à frente da lei” que “se calhar tem de ser mudada”.
“É uma viragem que se dá com este Papa e penso que vai ter desenvolvimentos e demonstra que a Igreja está em diálogo com o mundo e é uma instituição atual e moderna que sabe ler os sinais dos tempos”, conclui.
Nuno Bettencourt Raposo, é advogado, mestre em Direito do Urbanismo e Cônsul Honorário da Suécia nos Açores.
As “Conversas na Sacristia” são um projecto de evangelização e pensamento da fé através da cultura, das artes e da ciência, num processo de escuta, de acolhimento e de diálogo com todos, de uma Igreja de portas abertas para os sentidos, para a espiritualidade contemporânea, para a partilha da palavra, das sensações e das emoções, para “uma cultura inédita” que “palpita e está em elaboração na cidade”, como escreve o Papa Francisco, na Exortação Apostólica, Evangelii gaudium, sobre o anúncio do Evangelho.