Edit Template

MANUEL CARLOS – O que se espera para o ano de 2024

“Continuamos a combater os pobres em vez de criarmos soluções integradas que os retirem da pobreza…”

O que é preciso fazer para que se acredite no Estado, e que reformas devem ser pensadas?
Cónego Manuel Carlos Alves (Reitor do Santuário do Senhor Santo Cristo) – Temos de voltar aos clássicos, aos grandes pensadores do Estado e da política para entendermos os atalhos por onde nos estamos a meter e que nos podem fazer entrar em autodestruição.
É elementar, mas também importante insistir: o Estado foi criado para servir/ajudar os cidadãos na “polis”. Hoje temos a sensação, perante a maioria das decisões que o Estado toma, que os cidadãos é que estão ao serviço do Estado. Lembram-se da frase “ai!, aguenta, aguenta”? É a mentalidade dominante, e terá de ser dominada.
Por outro lado, é importante percebermos que a formação ética dos cidadãos foi gradualmente desvitalizada porque, pensou-se que bastava a lei, cumprir a lei. O problema é que não há leis perfeitas e “o lobo” está sempre à espreita. É sempre o mais forte a ditar a lei: olhem para os bancos… a cobrar taxas e taxinhas quando é preciso aumentar os lucros! Onde está o Estado?

Perante o fenómeno do abuso inflacionista, onde está o Estado? A arrecadar impostos?
A promiscuidade entre sectores da Justiça e da comunicação social é uma máquina destruidora de reputações e democracias que se esgota nisso mesmo.
No sector social, no combate à pobreza, continuamos a combater os pobres em vez de criarmos soluções integradas que os retirem da pobreza. Os pobres não se combatem, dignificam-se como pessoas. A Sociologia já estudou tanto a pobreza, tem milhares de conclusões e uma visão integrada para uma mudança social sustentada. Só é preciso ir ter com quem sabe…Veja o nosso caso: quanto já gastámos sem frutos concretos, sem conseguirmos ter sempre o rótulo dos mais pobres entre os pobres da Europa.
Temos de voltar à ética, uns e outros. Todos! E a ética do Estado é colocá-lo ao serviço do bem comum e não apenas de alguns.

O próximo ano é um ano de eleições para a Assembleia Legislativa dos Açores; para a Assembleia da República; e para o Parlamento Europeu. Como vê estas eleições e que políticas devem ser adoptadas por cada Parlamento para que os governos possam responder aos desafios com que a sociedade está confrontada?
As eleições são a festa da democracia, também tempo de muita luta pelo poder dentro dos partidos e entre os partidos e, por vezes, até entre parlamentos. E como festa da Democracia requer a participação e o envolvimento de todos e, portanto, esforço, paciência e vigilância, porque diante da complexidade da Democracia, há sempre quem chegue com soluções e propostas fáceis, tentadoras, mesmo. O que não pode acontecer é que fiquemos anestesiados por elas e devemos exigir que os partidos esclareçam ao que vêm e que programas e soluções trazem para os problemas concretos das pessoas e das famílias: como o acesso à habitação e à educação, o direito ao trabalho e a um salário digno, a proteção às famílias, às crianças e aos mais velhos… São apenas algumas questões concretas que merecem respostas sérias e não milagrosas e fáceis, como alguns populistas nos querem dar. A sociedade tem de exigir isso aos partidos.
As circunstâncias em que vivemos não mudarão de imediato; todavia, podemos olhar para a realidade de maneira nova, podemos viver com renovada paixão os desafios na construção do bem comum. A política como serviço ao bem comum significa apostar na amizade social.
Aprecio nos políticos sobretudo coragem, seriedade, audácia e capacidade de decisão. Grandes camadas sociais reagem com apreensão ou até mesmo medo perante a mudança. Há que decidir com solidez de convicções, explicando objectivos e meios para os alcançar. É precisa muita seriedade.
Com frequência se percebe que alguns parlamentos mais parecem ringues do que anfiteatros, em que quase só importa desvalorizar ou apoucar as ideias alheias. Chega-se por vezes ao cúmulo de pré-anunciar chumbos a documentos que… ainda nem estão escritos.

O que deve ser feito para pôr termo em 2024 às guerras em Israel e na Ucrânia?
Estou convencido que essas guerras só terminarão como consequência dum sobressalto civilizacional, do âmago da humanidade.
Ninguém pode esperar ganhar seja o que for com a guerra, mas todos nós podemos ganhar com a paz.
Qualquer fruto da guerra está manchado de sangue humano, é profundamente imoral, é uma loucura. E aqueles que se beneficiam tanto da guerra quanto do comércio de armas são criminosos que matam a humanidade, também a humanidade que há si mesmos.
A comunidade internacional tem de fazer uma frente glacial contra a guerra. Qualquer guerra! Todos contra um! Quem quer que seja!
A carnificina tem de parar. O mal – tenha a forma que tiver – tem de ser detido. Por isso rezo e por isso me empenho. Só a paz interessa à humanidade, ao desenvolvimento, ao respeito pelo irmão.

Com que desafios está a Igreja confrontada para 2024?
Em primeiro lugar a sinodalidade. Na Igreja existe muita gente que pensa que as soluções do passado é que respondem – com segurança – aos desafios de hoje; mas muita gente também pensa que devemos ter novas respostas, em fidelidade ao Evangelho, às questões que se colocam ao homem de hoje. E têm tanto o dever como o direito de tentar isso mesmo.
Em alguns países a Igreja está cansada de esperar, outros têm medo do futuro. O Papa Francisco percebeu os dilemas e lançou o desafio: temos de caminhar juntos, escutando-nos mutuamente – todos têm razões! – e é possível caminharmos juntos. Uns, refreando a pressa e outros, procurando acelerar o passo. Juntos é que teremos de caminhar. “Que todos sejam um como Eu e Tu somos um” pediu Jesus.
Nos Açores, passados 30 anos, estamos a retomar a caminhada do Congresso Diocesano de Leigos. O nosso Bispo, D. Armando Domingues, está a pedir a cada uma das nossas comunidades que seja protagonista da sua história, caminhando juntos em Ouvidoria, por Ilha, na caminhada única da Diocese, que ouse construir à sua volta o Reino de Deus.
Algumas comunidades, mais dependentes do clericalismo, poderão sentir desorientação nos tempos mais próximos, mas estou convencido que à medida que forem descobrindo a riqueza e a beleza do caminho, irão desabrochar e empenhar-se na missão conjunta e única.
Em termos mais pessoais, como reitor do Santuário do Senhor Santo Cristo espero corresponder ao serviço que me é pedido: o Santuário é um local de encontro entre a humanidade fragilizada e um Deus que se fez homem, rico de misericórdia e que vem em nosso auxílio para nos socorrer e salvar.
Espero que o Santuário seja um lugar onde todos, todos, todos se sintam acolhidos pelo amor paternal do Senhor Santo Cristo dos Milagres e todos se sintam impelidos e amparados – como resposta de gratidão a Deus – a trabalhar na construção de um mundo melhor.

Edit Template
Notícias Recentes
Nove detidos por tráfico de haxixe na Ilha da Terceira e na Grande Lisboa
PS com proposta que pretende garantir mais respostas sociais às crianças e uma maior estabilidade laboral às Amas
Suspeito de tentar passar com passaporte falso no aeroporto de Ponta Delgada foi detido pela PSP
Novo parque para estacionarem Vila Franca do Campo
Programa ‘Novos Idosos’ é hoje “um sucesso inegável” destaca Artur Lima
Notícia Anterior
Proxima Notícia
Copyright 2023 Correio dos Açores