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RUI BETTENCOURT – O que se espera para o ano de 2024

“Se falharmos (…) não faltará gente a colocar a Autonomia dos Açores em causa”

Reforma do Estado
O que é preciso fazer para que se acredite no Estado, e que reformas devem ser pensadas?
Rui Bettencourt – Sou dos que acham que na base de qualquer reforma do Estado encontram-se dois aspectos, a revisitar.
O primeiro tem a ver com o que se quer para o Estado: a consolidação e uma melhoria de um Estado Social moderno, viável, funcional e próximo das pessoas, sem prejuízo de ter concomitantemente, um Estado Estratega, ou, sob pretexto de que alguns aspectos destes Estado Social não funcionam bem, ou funcionam injustamente, recuar para um Estado individualista?
Um segundo aspecto, que deve ser colocado, é a eficácia da acção pública: Como fazer, e com quem fazer, para que a acção pública, como elemento fundamental da acção política, seja mais eficiente, valorizando as acções eficazes e justas e abominando o palavreado oco, descredibilizado?
Feito isto, teremos certamente, uma muito maior clareza nas políticas de Saúde, na Educação, na Ação Social e Cultural, no Desenvolvimento e nas estratégias de criação e distribuição de riqueza, que, defendo, sejam feitas essencialmente pela valorização do trabalho.

O Próximo ano é um ano de eleições para a Assembleia Legislativa dos Açores; para a Assembleia da República; e para o Parlamento Europeu. Como vê estas eleições e que políticas devem ser adoptadas por cada Parlamento para que osgovernos possam responder aos desafios com que a sociedade está confrontada?
Nós teremos três eleições que serão determinantes. Provavelmente serão as eleições mais decisivas, respectivamente, da história da Autonomia dos Açores, da Democracia portuguesa e da construção da Europa.
Nos Açores, em especial, confrontam-se, sorrateiramente, fraqueza e instabilidade com credibilidade, segurança e dinamismo, que tem de ser melhorado. De facto, o que está aqui mesmo em causa é a demonstração, perante os açorianos e perante os que nos observam a nível nacional, da nossa capacidade para nos auto governarmos. Se falharmos, na próxima etapa não faltará gente a colocar a Autonomia dos Açores em causa. Por isso, não podemos mesmo falhar. Nem podemos partir para experimentalismos.
Igualmente, a nível nacional, estará em causa a capacidade de fazer frente aos muitos desafios no Estado Social. A instabilidade governativa espreita e a deriva populista é uma séria ameaça, à busca de falhas e pretextos. A campanha eleitoral deve poder informar os portugueses para que possam escolher em consciência, não podendo estes esquecer que vimos de longe desde a crise cheia de sacrifícios de há uma década.
Na União Europeia, a capacidade de mobilização, de liderança para o desenvolvimento, de articulação entre estados europeus, da afirmação da Europa no mundo, e, sobretudo, de resposta concreta aos problemas dos cidadãos (que tão bem foram colocadas por alguém que agora nos deixou, o Jacques Delors) são fundamentais, mas não são tudo.Coloca-se, aqui, de novo, a eterna questão da desejável proximidade dos cidadãos às instituições europeias. E os Açores têm um lugar especial nesta União Europeia.
Há uma forte investida, para o Parlamento Europeu, por aqueles que não querem a construção da Europa e que, à imagem de Nigel Farage, que defendeu o Brexit, se querem eleger para dissolver a União Europeia, por dentro, em nome da “liberdade” de pensamento, mas, de facto, desejando um regresso ao passado, ao espírito friorento dos estados fechados sobre si e querendo um ponto final na liberdade de circulação.
Globalmente, temo pelo que possa acontecer a nível regional, nacional e europeu. Tanto mais que há uma vaga de fundo no sentido da descredibilização da política, a par do discurso do ódio, da desconfiança, do populismo, da apresentação insistente das ineficácias, anomalias ou “pequenas historietas” da acção pública sem, respondendo mal, sem verdadeiras propostas às legítimas aspirações das pessoas.
E isto desenrola-se numa perigosa amálgama de ideias, de valores e até de vocábulos, onde, à imagem do que colocou George Orwel, no seu livro “1984”, se invertem o sentido das palavras: liberdade é poder fazer tudo, inclusive ser livre para acabar com ela, a mentira é verdade (alternativa), a humildade é arrogância, o desgoverno é estratégia e o banal é histórico.
Eis que as palavras são ditas, esvaziadas do seu significado ou significando, de facto, o inverso, e perigosas ideias são lançadas. Uns por estratégia consciente – os engenheiros do caos -, outros manipulados, outros, fracos, outros defendendo pequenos interesses, outros, ainda, por mimetismo – repetindo. Isto, substituindo a política, corrompe a Democracia e fragiliza a Autonomia.
Isto também se desenrola num ambiente onde se tenta substituir, perigosamente, a ação política – persistentemente apresentada como algo de negativo, quando, como referia John Kennedy, é “a mais nobre das actividades”, por algo de corporativo sem verdadeira responsabilidade perante os cidadãos. É que o que a política tem de bom é que os políticos, em democracia, devem prestar contas às pessoas que os elegeram. E isto deve ser central no funcionamento da nossa sociedade.
É este o contexto em que se desenrolam estas três eleições.
Mas, também sou otimista: tenho a “esperança do bom senso”. Mas tendo o bom senso não como uma atitude mole, mas como uma atitude firme de convicções de progresso, de democracia e de respeito pelo outro. É possível que, se assim não for, se não houver um saudável sobressalto, estas três próximas eleições venham a ser das últimas de um ciclo de aprofundamento da autonomia, de consolidação da democracia e de construção da Europa democrática.
Note-se que devíamos estar a entrar na maturidade, nos 50 anos da democracia portuguesa, em 2024, à beira dos 50 anos da Autonomia dos Açores, em 2026, e dos 600 anos da nossa História, em 2027. Igualmente teremos em 2029 os 50 anos do Parlamento Europeu. Que deviam ser momentos marcantes dos próximos anos.
Quanto à Autonomia dos Açores, que se compare! O padre Silvino Amaral, há um ano, num magnífico testemunho à RTP Açores, sintetizou perfeitamente a questão: Que se compare, por exemplo, a Ribeira Quente – mas, de facto todas as freguesias e ilhas do Açores -, de antes da Autonomia com a de agora. E que não se ponha no mesmo pé de igualdade, melhorar a eficácia da nossa governação autónoma (sim, sim, deve ser feito) com a existência ou não da Autonomia. Tal como não deve ser confundida a melhoria do Estado Social e da Governação da República com a existência da Democracia portuguesa. Tal como não se deve confundir as dificuldades da governação europeia com a construção da União Europeia.
Creio que para estas três eleições concentradas nestes primeiros seis meses de 2024 – as regionais, as nacionais e as europeias –, mais do que a exibição de um programa, como um rol de medidas, será importantíssimo regressarmos às convicções, à firmeza, à frontalidade, aos valores, onde as ideias e as palavras claras, referendadas pelas pessoas, são consequentes e levam a acções fortes, onde as palavras não sejam ocas e as acções fracas, medianas, cinzentas. E termos uma ação política participada, eficaz e ousada. E até ousaria uma expressão que deveria entrar no vocabulário político nos Açores: entusiasmo.

O que deve ser feito para pôr termo em 2024 às guerras em Israel e na Ucrânia?
Há que compreender o que está a acontecer na sua globalidade e termos consciência quer das nossas limitações quer da importância de nos comprometermos. Concordo com a análise de Jacques Attali, que considera que os actuais três grandes conflitos mundiais – abertos ou em surdina -, na Ucrânia, no médio oriente e em Taiwan, decorrem todos de regimes que convivem mal com as democracias vizinhas. Nestes conflitos, Von der Leyen, na Comissão Europeia; Vasco Cordeiro, no Comité das Regiões e António Guterres, na ONU, têm tido papéis de grande lucidez e afirmação. Mas a ONU não é um governo mundial.
Devemos, entretanto, como cidadãos, mantermo-nos bem atentos com a situação.

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