De acordo com Rui Cardoso, Presidente da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Santa Maria, a prestação de Serviços de Socorro e Emergência para o aeroporto à ANA SA, está a “pesar negativamente no resultado financeiro da Associação.” Afirma o dirigente “mantemos um diálogo constante, difícil mas constante, com a ANA SA para os sensibilizar para a necessidade de rever as condições do contrato de prestação de trabalho estabelecido entre as duas entidades.” Outras situações, como o atraso dos apoios ao combustível, o aumento do custo dos fornecimentos de materiais e o aumento salarial dos bombeiros colocam “grandes constrangimentos e desafios à gestão financeira da Associação,” alerta Rui Cardoso, em entrevista.
Correio dos Açores – Em que condições se encontra o quartel dos bombeiros de Santa Maria? Há neste momento necessidade de intervenções?
Rui Cardoso (Presidente da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Santa Maria) – O quartel de bombeiros, que alberga também a sede da Associação Humanitária dos Bombeiros de Santa Maria, foi alvo de uma grande intervenção há relativamente pouco tempo (2018), intervenção essa que visou a ampliação da garagem e a criação de novas valências, e como tal não é o que nos dá maiores preocupações na gestão desta Associação, muito embora a cobertura e a caixilharia apresente algumas infiltrações que temos tentado resolver com o empreiteiro dessa grande obra, a Marques, nem sempre com sucesso. Para além disso, a estrutura mais antiga da sede começa a acusar o peso dos anos e são urgentes pequenas reparações de conservação, nomeadamente o tratamento de fissuras e isolamento e protecção de componentes estruturais. A nossa grande dificuldade em concretizar estas reparações está na disponibilidade de mão de obra para as concretizar. Uma outra preocupação que ainda não nos aflige muito mas que mais dia menos dia irá ser necessário acautelar será a pintura interior e exterior de todo o edifício.
Em que medida a inflação, nomeadamente o aumento do preço de combustíveis, produtos e equipamentos, está a afectar a associação?
O aumento do custo dos fornecimentos de materiais e serviços externos, sem que tenha sido acompanhado de igual aumento das receitas da Associação, associado ao grande aumento salarial dos bombeiros, justo e merecido diga-se, colocou e coloca grandes constrangimentos, e enormes desafios à gestão financeira da Associação Humanitária.
É facto que beneficiamos de verbas do fundo de coesão, para apoio às despesas com combustível, mas que nem sempre chegam atempadamente, o que nos obriga a esforços de tesouraria nem sempre fáceis de gerir, para além disso não cobrem as necessidades anuais nesta matéria.
Com o aumento generalizado dos preços tivemos que ser ainda mais rigorosos com os gastos, seja de materiais, seja de fardamento e outras necessidades sem, contudo, por em causa a operacionalidade do Corpo de Bombeiros da Associação. Para esse desiderato têm um papel fundamental os nossos Comandantes, e na generalidade todos os nossos Bombeiros, que entendem esta necessidade.
Inevitáveis são os custos com energia e comunicações, que também sofreram um grande aumento, e que nos obrigou, no caso das comunicações, e renegociar o contrato com o nosso parceiro para tentar conter o seu custo. Já no que diz respeito a energia, foi incrementada a sensibilização da utilização eficiente da energia no quartel, e efetuado algum investimento na substituição de alguma iluminação por luminárias mais eficientes do ponto de vista energético, contudo isso não evitou um forte aumento nos custos com energia em 2023.
Com quantos elementos conta o corpo de bombeiros?
O Quadro Activo do Corpo de Bombeiros da Associação Humanitária dos Bombeiros de Santa Maria conta com 57 bombeiros, 38 deles com contrato de trabalho com a Associação.
Como está a Associação em termos de recursos humanos? Há falta de bombeiros?
Para além dos Bombeiros a Associação conta ainda nos seus quadros com duas técnicas administrativas e uma funcionária que assegura a higienização de todos os espaços do Quartel e Serviços Administrativos.
Em termos gerais os bombeiros que temos são suficientes para a generalidade das solicitações com que nos defrontamos. Apesar da juventude que este corpo directivo tem na gestão desta casa, o que é claramente notório é o espírito de voluntariado e dádiva que é muito menos presente principalmente nas gerações mais novas de bombeiros. Não constitui isto qualquer crítica a nenhum dos nosso Bombeiros, mas é a constatação de uma mudança na sociedade que também estas associações e o socorro das populações em geral, têm que se confrontar e saber reagir e se adaptar.
Quais são as actuais necessidades dos bombeiros de Santa Maria?
As principais necessidades da AHBVSMA são de ordem financeira.
Foi possível, em 2023, rever e actualizar o protocolo de cooperação que mantemos com a CMVP, enquanto agentes locais de Proteção Civil, que para além de conter várias medidas de apoio directo aos bombeiros e suas famílias, engloba também um apoio financeiro à Associação.
Em 2023 foram também reforçadas as transferências de verbas do Governo Regional através do Serviço Regional de Protecção Civil para, entre outras coisas, fazer frente aos aumentos salariais contemplados na actualização da Portaria de Condições de Trabalho (PCT).
Contudo, continua a não ser suficiente para uma gestão e planeamento que nos permita acudir a todas as necessidades dos Bombeiros, e acima de tudo poder gratificar, reconhecer e incentivar o muito trabalho que é realizado para além do exigível.
Outra grande necessidade, fruto de muitos anos de desinvestimento, é a renovação da chamada frota vermelha, utilizada principalmente no combate a incêndios e no desencarceramento, em que a média de idades das viaturas do nosso parque já ultrapassa os 27 anos. Em 2015 foi abatido um auto-tanque pesado, com capacidade para 8 mil litros de água, que ainda não foi substituído, e que, principalmente nos períodos de Verão, é fundamental para constituir uma garantia de água em zonas sem acesso à rede pública ou bocas-de-incêndio, uma realidade muito presente principalmente no meio rural.
Que balanço faz ao ano de 2023?
Apesar de tudo temos que considerar 2023 um ano positivo. Foram dados passos muito positivos em matérias como a necessidade de regulamentar o financiamento das Associações Humanitárias assim como no Regime Jurídico (vulgo Estatuto Social) do Bombeiro, para a Região Autónoma dos Açores. Obtivemos, finalmente, a certificação da Associação Humanitária como Entidade Formadora, e conseguimos cumprir os nossos compromissos com todos os trabalhadores e fornecedores.
No lado menos positivo deste ano estão as prestações de serviços tanto com a ANA SA, para o Serviço de Socorro e Emergência para o Aeroporto de Santa Maria, como com a Unidade de Saúde de Ilha, para o transporte não urgente de doentes, que continuam muito deficitárias e a pesar negativamente no resultado financeiro da Associação.
Quais são os projetos e ambições para 2024?
Para 2024 temos como ambição reverter a tendência negativa nas prestações de serviços deficitárias anteriormente referidas. Mantemos um diálogo constante, difícil mas constante, com a ANA SA para os sensibilizar para a necessidade de rever as condições do contrato de prestação de trabalho estabelecido entre as duas entidades, pois está a ser muito prejudicial para a Associação, que é uma entidade sem fins lucrativos e que tem como principal propósito a prestação de serviços de socorro à população. Não pode, de maneira alguma, ser uma entidade com estas características a suportar, mesmo que parcialmente, os custos com o socorro e emergência no aeroporto, quando este foi concessionado a um privado que recebe contrapartidas para garantir esse serviço. Em simultâneo é preciso ter presente que é este contrato que permite suportar quase 3 dezenas de bombeiros nos quadros da Associação, e consequentemente quase 50% do quadro activo dos bombeiros que asseguram o socorro à população.
Também com a USI mantemos um diálogo constante, e apesar do conhecido e reconhecido subfinanciamento crónico na saúde, vamos procurar soluções para inverter a tendência deficitária no transporte não urgente de doentes, que é fundamental para a população que dele se socorre para os tratamentos hospitalares, mas que não pode funcionar à custa da Associação de Bombeiros.
Para 2024 procuraremos colocar a funcionar em “velocidade de cruzeiro” o nosso Centro de Formação, com cursos dentro da nossa área de actividade e que vão de encontro com aquilo que são as necessidades do tecido empresarial mariense, mas também da população em geral, procurando desta forma, com mais esta valência, aumentar as fontes de receita da Associação Humanitária.
Em 2024 continuaremos a promover uma gestão rigorosa da Associação para cumprir com todos os nossos compromissos para com os nossos trabalhadores, fornecedores e, acima de tudo, para continuar a prestar um serviço de socorro exemplar à população.
Em jeito de Votos para 2024, seria muitíssimo importante que o trabalho que foi desenvolvido até então em matéria de Regime Jurídico do Bombeiro e do Financiamento das Associações Humanitárias de Bombeiros, mas que foi interrompido pela dissolução da Assembleia Regional, pudesse ser retomado o mais breve possível, qualquer que seja a composição da Assembleia Legislativa Regional após as eleições de Fevereiro p.f, e que pudesse ser uma realidade a por em prática antes do final de 2024.
Há alguma outra questão que gostaria de apontar?
Nunca é demais referir a necessidade de reconhecer, apoiar e acarinhar estes homens e mulheres que dedicam a sua vida a fazer o bem sem olhar a quem.
A população em geral acarinha os bombeiros, mas é preciso mais. Façam-se sócios da Associação, participem na sua atividade, sempre que possível façam os seus donativos, aproxima-se a época de todos nós entregarmos a nossa declaração de IRS e podemos doar uma percentagem do nosso IRS para a Associação (informações disponíveis na página da Associação), sem outros custos para qualquer de nós…
Em suma, procurem ajudar aqueles que estão sempre presentes nos momentos mais difíceis, os que acorrem quando todos os outros correm, e que o fazem sob o lema “Vida por Vida!”.
Mariana Rovoredo