A Reitora da Universidade dos Açores, Susana Mira Leal, afirmou ontem que, com o contrato-programa estabelecido com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior “se perdeu mais uma oportunidade de estabelecer um modelo de financiamento que, de forma definitiva e estrutural, atenta às circunstâncias específicas das instituições, às dimensões insulares e ultraperiféricas das universidades dos Açores e da Madeira e à dimensão tripolar em descontinuidade territorial da Universidade dos Açores. E viria assim proporcionar condições efectivas de desenvolvimento a todas as instituições de forma estável e sustentável em benefício do ensino superior português e da coesão territorial e social”.
Apesar disso, Susana Mira Leal reconheceu “a coragem” do Ministério para trazer para o palco da discussão públicas “matérias sensíveis mas cruciais para a ciência do ensino superior”.
Neste contexto, registou “o cumprimento da palavra que nos deu na primeira reunião que tivemos em Julho de 2022 com a formalizarão de Dezembro último do contrato programa com a Universidade dos Açores, desbloqueando um impasse que durava há três anos, com claros prejuízos para a Universidade dos Açores, para a Região e para o ensino superior português“.
Considerou, em sequência, “relevante” a parceria com a Direcção Geral do Ensino Superior, o Governo dos Açores, a Fundação para a Ciência e Tecnologia, a Fundação Luso-americana para o Desenvolvimento, o Air Center e a Agência Espacial Portuguesa a cujos representantes agradeceu a parceria.
Abordou o contrato-programa para quatro anos no valor global de 14.670 mil euros que contempla um valor anual de 750.000 euros para compensação de alguns sobrecustos da insularidade e da ultraperiferia e 750.000 para reforço do corpo docente e de investigação e para a criação de novas ofertas formativas orientadas para a aprendizagem contínua e a qualificação e reconversão profissional designadamente cursos técnicos superiores profissionais, formação pós-graduada, cursos de curta duração e micro credenciações.
Integra também o apoio à tripolaridade que o Governo dos Açores “sempre cumpriu, independentemente da assinatura do contrato programa e cujo montante aumento progressivamente nos últimos anos e se cifrará em 950.000 euros a partir de 2024”.
Constitui-se ainda, prosseguiu, “uma importante componente” do referido contrato: a implementação do programa temático de investigação e desenvolvimento Açores, transição ecológica espaço e oceanos.” Com um financiamento competitivo de 750.000 euros anuais a disponibilizar pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, o programa tira partido das competências e do conhecimento existentes na Universidade dos Açores, visando “reforçar e ampliar a capacitação científica institucional, potenciando o posicionamento no Atlântico e as características naturais dos Açores e os objectivos de desenvolvimento da Região”.
O contrato-programa prevê, igualmente a criação de três cátedras internacionais num montante global de 900.000 euros co-financiadas pelo Governos dos Açores, a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, o Air Center e a Agência Espacial Portuguesa. O objectivo “é promover a contratação de três cursos especializados na área das engenharias em particular, para consolidação da oferta formativa na área, e reforço da investigação e das parcerias com aquelas entidades exponenciadoras com particular enfoque nas áreas da transição ecológica, do espaço e dos oceanos”.
Ainda não estão reunidas
condições para lançar concursos
para residências universitárias
O Reitora da Universidade dos Açores relevou que, apesar do contrato-programa ser a acção que “mais visibilidade pública” teve em 2023, o ano “manteve-nos em grande azafama interna, na implementação de um conjunto de acções, as quais também com elevado potencial estratégico para a instituição. Ocuparam-nos algumas dezenas de concursos internos e internacionais para docentes, investigadores e colaboradores técnicos e operacionais; o registo da primeira Spin Off com a marca UAc; A criação de um novo doutoramento; 3 mestrados; 3 pós-graduações não conferentes de grau e um TESP.”
E novos projectos se adivinham em 2024 incluindo o objectivo de formação do nosso corpo docente em formação de ensino à distância em colaboração com a Universidade Aberta com a criação de novas ofertas formativas nesse modelo de ensino.
Susana Mira Leal falou, depois, da preparação do processo da construção de três novas residências estudantis com 50 camas na Horta, 100 na Angra do Heroísmo e 120 em Ponta Delgada como sendo outro dos empreendimentos “a que nos dedicamos em 2023”.
Realçou que, neste inicio de ano, “impõe-se dar, pois, o passo fundamental neste processo com o lançamento dos procedimentos concursais”.
Sublinhou, em sequência, que “o atraso no processo de contratação PRR, o agravamento dos custos de construção e a limitada capacidade das empresas do sector instaladas na Região face ao elevado volume de obras com financiamento PRR em curso, colocam-nos contudo alguns desafios. O prazo é manifestamente apertado para a execução de alguns dos projectos e o financiamento PRR concedido é limitado e não atende ao sobrecusto da construção da Região,” afirmou.
“Pese embora o apoio já manifestado pelos municípios de Angra do Heroísmo, Hora e Ponta Delgada, a cujos autarcas agradeço publicamente o empenho e o apoio a estes projectos, não se encontram ainda reunidas as condições financeiras para garantir o lançamentos dos processos concursais”, conclui.
Regime jurídico das instituições
do ensino superior em debate
A Reitora começou a sua intervenção considerando que 2023 “foi um ano intenso e exigente para a ciência e ensino superior em Portugal, ocupando diversas e importantes discussões”. Desde logo, Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (JIES), documento que considerou “fundamental da relação da constituição, atribuições, organização, funcionamento e competência das instituições de ensino superior portuguesas.”
Deu particular enfoque à análise da aplicação do regime jurídico das instituições de ensino superior. Disse, a propósito, que dezassete anos de experiência “permitem já uma avaliação amadurecida e demandam uma revisão esclarecida do JIES. Todavia, volvidas várias dezenas de audições, pareceres, inquéritos e conferências promovidos pela comissão nomeada par ao efeito no inicio de 2023, o relatório apresentado em Dezembro” salienta “a complexidade da matéria e os reptos que enfrentamos”.
Depois, deixa algumas questões: “Deve o país prosseguir o regime dual? Num contexto em que a orientação mais profissionalizante, prática e aplicada do politécnico é hoje socialmente reclamada para a universidade? Em que a orientação investigativa do universitário é cada vez mais uma demanda do politécnico? Em que a designação Universidade já não é exclusiva? Os ensinos universitário e politécnico parecem cada vez mais indistintos. Mas que vantagens e riscos existem nesta distinção? Devem todas as instituições de ensino superior universidades e politécnicas poder oferecer todas as tipologias e graus de formação superior? Se a Assembleia da República decidiu recentemente que os politécnicos podem conferir doutoramento porque não poderão as universidades disponibilizar TESP? E que fazer ao regime fundacional? Manter e aprofundar para algumas instituições? Estender a todas? Cessar? Substitui-lo por outro modelo que garanta o aprofundamento da autonomia das instituições? E a investigação? Que é distintiva no ensino superior, que espaço lhe dedica o JIES? O que distingue afinal os docentes dos investigadores de carreira? Se os últimos são pagos e aos outros cumprem igualmente exigências de produção científica. E o que fazer para erradicar a precariedade laboral dos investigadores e o crescendo de docentes convidados?”.
Este último desafio “levou-nos de resto a mais uma importante discussão de 2023. O emprego científico e o programa CT10. Sucedendo a outras medidas de estilo ao emprego científico, com resultados modestos face à dimensão do programa. O CT10 prevê 1.400 vagas para a carreira académica em contratos por tempo indeterminado para investigadores e docentes. Apresentando uma esperança de estabilidade para cerca de 2.500 investigadores com contrato a termo no nosso país, representa contudo, e permitam-me a metáfora natalícia, uma meia desemparelhada no sapatinho das nossas instituições.”, disse.
Frederico Figueiredo