O CCI-Centro Comum de Investigação Científica da União Europeia, criado para centro de investigação nuclear pela Euratom em Ispra, uma cidade do norte de Itália, foi desde 1960 uma verdadeira capital europeia da Ciência. Conhecido pela sigla inglesa JRC-Joint Research Centre, ou pela francesa CCR- Centre Commun de Recherches, contava em 2020 com mais de 3.000 ativos, dispersos hoje por Institutos localizados em Ispra (Proteção e Segurança dos Cidadãos; Saúde e Proteção do consumidor; Ambiente e Desenvolvimento Sustentável) na Bélgica (Materiais e Medidas),nos Países Baixos (Energia e Transportes), na Alemanha (Elementos Atómicos Transurânicos, em Karlsruhe) e em Sevilha (Prospetiva Tecnológica). A sede do CCI é em Bruxelas e tem como Diretora – GeralIliana Ivanova, de nacionalidade polaca, nomeada em julho de 2023 pela Presidente da Comissão Europeia. Segui atentamente as atividades do CCI desde 1985, pela simples razão de em maio desse ano, num congresso sobre luta integrada contra pragas agrícolas havido na Sicília, ter sido convidado para adjunto do Professor Raffaelle Cavalloro, então responsável no CCI pela área da biologia e da ecologia. A ligação à Universidade dos Açores, reforçada pelo convite feito em agosto de 1985 pelo Presidente Mota Amaral, para ser o primeiro representante dos Açores no Parlamento Europeu, fizeram que só conhecesse Ispra nessa qualidade.
Porém, a ligação aos trabalhos do CCI permaneceu por via das comissões parlamentares de Agricultura, do Ambiente e da Ciência e Tecnologia do PE, agora continuada através da informação recebida através da Associação dos Antigos Deputados Europeus. Foi assim que repesquei uma newsletter do Centro, datada de 2003, onde o assunto era a aposta nas fontes renováveis de energia. As5 principais matérias abordadas eram de fundamental importância há 20 anos, mas atualmente constituem um autêntico manual de sobrevivência europeia. O tema do sistema de referência e informação sobre as tecnologias energéticas sustentáveis (SETRIS, sigla francesa) abre a discussão sobre a integração do saber-fazer (know-how) das competências e dos resultados das atividades dos diferentes institutos, no domínio da energia, visando fornecer atempadamente informação válida sobre as tecnologias aplicadas. Seguidamente, constata-se que há 2 décadas o Centro Comum de Investigação já previa o uso generalizado de pilhas de combustível, quer no futuro aprovisionamento energético, quer “a longo prazo, substituindo grande número dos sistemas atuais de combustão em todos os setores de consumo final”. Acrescentava a newsletter que estas pilhas, designadas de modo geral por fuel cells, uma vez usadas conjuntamente com as diversas tecnologias de produção de hidrogénio, iriam oferecer “a médio e longo prazo, um enorme potencial às economias de energia e à diminuição das emissões de CO2 e de substâncias poluentes”. Por isso o CCI investia na operacionalidade, respeito pelo ambiente e segurança das pilhas e baterias, sem descurar a sua competitividade e eficiência energética. Sendo assim, é de questionar porque se levou tanto tempo a descobrir o óbvio, para mais como se fosse uma novidade, o que todos sabemos possível num mundo dominado pelos petroleiros e petrolíferas.
Continuando a análise das matérias consideradas prioritárias em 2003 pelo CCI, encontramos a questão do armazenamento e segurança de utilização do hidrogénio, uma eco tecnologia de ponta agora muito falada. Dos processos de fabrico ao consumidor final, nota-se uma prioridade dada à segurança e ao uso na mobilidade, onde se consideravam os transportes, incluindo a aviação, uma das principais fontes poluidoras.
Finalmente, a publicação foca a elaboração de normas para fabrico de células solares fotovoltaicas, resultantes da inovação que teve origem no programa espacial europeu, permitindo reduzir 1000 vezes o preço do metro quadrado dos painéis solares num período de 30 anos, graças ao uso de materiais semicondutores. Raras vezes se ouve falar destas reduções de custos de produção, sendo mais frequente instalar na mente do consumidor a ideia da dependência dos fornecedores internacionais, de que Taiwan aparece como emblema. Para um observador mais atento, nenhum destes jogos surge por acaso, mas antes como resultado de uma lucrativa estratégia de “transições convenientes, onde as eco tecnologias têm lugar reservado. Uma prova desta interpretação é a constante manipulação mediática da energia nuclear, enquanto os arsenais atómicos das grandes potências não cessam de crescer. A Scientific American, no número de dezembro findo, espelhou na capa um relatório especial, intitulado The New Nuclear Age, onde detalha os pormenores de um investimento de 1,5 trilhões USD (trillions/milhões de milhões) para ir aumentar o poderio nuclear norte-americano. Conforme explicam, o mais controverso é o plano que espalhará por 5 Estados do país, centenas de silos com mísseis, numa reformulação do sistema terrestre de armazenamento e lançamento. Segundo a revista, a próxima década verá um boom das armas nucleares – e todos sabemos que há mais gente nesta competição suicida. Entretanto, na mesma revista, umas discretas cartas ao editor revelam que a empresa Skunk’s Works da Lockeed Martin, está desenvolvendo reatores de fusão nuclear compactos, suficientemente dimensionados para propulsar aviões a jato e navios, ou fornecer eletricidade a pequenas cidades, apostando numa eco tecnologia com futuro.
Vasco Garcia