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Crónica da Madeira: Os olhares suspensos da Esperança

São vários os serviços do Hospital Central do Funchal, dr. Nélio Mendonça, cuja qualidade de atendimento é extraordinária, não só no que se refere à competência dos médicos e enfermeiros, mas também à parte humana calorosa dispensada aos pacientes, o fundamental para aliviar as suas dores e fazer esquecer as preocupações. Por diversas vezes, usufrui de tratamentos e internamentos no referido hospital e sempre encontrei uma grande eficiência nos médicos e enfermeiros, fruto de um alto sentido de responsabilidade. Deste modo, os doentes ganham confiança e psicologicamente libertam-se de possíveis dúvidas que os deixam, em espaços de solidão, à beira de uma guerra de nervos, o que em nada ajuda à cura desejada.
Neste momento em que vou, de 15 em 15 dias, ao Serviço de Hematologia, inaugurado pelo Presidente Alberto João Jardim a 11 de fevereiro de 2011, atualmente dirigido por um médico especialista, uma pessoa excecional, dr. Fernando Aveiro.
Evidentemente, que as minhas andanças pelos hospitais no país e lá fora possibilitam-me que faça uma avaliação imparcial de como funcionam estas instituições e os cuidados que dispensam aos pacientes.
Do dr. Fernando Jacinto já tinha ouvido as melhores referências, por colegas e doentes. Ao consultá-lo, ao ser diagnosticado por ele, tive logo a certeza de que estava perante um Ser humano em que os outros para ele são o céu. Adivinhando-se, através das palavras a competência profissional, com a preocupação de dar ao paciente uma informação exaustiva, conduzindo-o ao conhecimento do seu diagnóstico, feito não só com muito profissionalismo, mas também com uma simpatia natural que ressalta, tão espontaneamente, do seu discurso. A maneira como fala com os doentes é meia cura. Fá-lo com uma grande carga de amor pelo próximo e com a consciência de quem não ama não entende os outros. Enquanto me transmitia o retrato do meu diagnóstico de paciente, recordei aquele célebre pensamento da Madre Teresa de Calcutá: “às vezes é melhor dar uma palavra de afeto do que o medicamento para salvar o doente.”
O dr. Fernando Jacinto está num Serviço, onde há uma presença acentuada de doentes oncológicos: mulheres, homens e jovens que vivem situações humanas muito periclitantes: de muitas dúvidas e desesperos. É aqui que entra a ação dos médicos e enfermeiros. Diria uma missão, independentemente da profissional, de apostolado, sempre olhados pelos doentes como salvadores das suas situações. É neles que os doentes se apoiam.
Não raras as vezes fazem dos enfermeiros e enfermeiras os seus confidentes: das suas aflições e esperanças; das suas dúvidas e dos seus sonhos. Estes vivem empaticamente as situações dos doentes, sobretudo quando algumas mães jovens, manifestando-lhes a preocupação, com profunda tristeza e sem esperanças de que não querem morrer porque têm filhos para criarem. Crianças que tanto sonharam em tê-las, em educá-las, em verem os seus futuros.
As enfermeiras, que também têm filhos pequenos, ao ouvirem estas pacientes, colocam-se nas suas situações, tão dramáticas. Dão-lhes um grande apoio profissional e de amor, transmitindo-lhes palavras que as deixam um pouco em paz. É uma ação psicológica tão necessária em momentos de crise e de tanta dramaticidade.
Estou certo que este grupo de enfermeiras que, tão generosamente, me atende, de quinze em quinze dias, e diariamente assistem a dezenas de doentes, conhecem que o tempo que não é passado a amar e a compreender os outros, é tempo perdido.
Na sala de espera, onde me sento, com os outros pacientes; onde espero que chegue a minha vez de ser atendido, leio as expressões dos rostos dos que me rodeiam e neles descubro esperanças e dúvidas. Há olhares que se fixam no nada e nos lábios, de algumas das pacientes, passa um ligeiro sorriso. Nos homens, que sempre considerei mais frágeis que as mulheres, escondem os seus receios numa carranca desenhada na inquietude do seu olhar. Outro dia, sentou-se ao meu lado uma doente que só conheci pela voz, uma vez que a sua transformação física era de tal forma que jamais diria que era uma minha antiga colaboradora. Apesar da sua situação, ela falou-me dos seus projetos para o futuro. Falamos de algumas coisas do passado: das suas atividades, da sua dinâmica ao realizar algumas iniciativas; das suas viagens.
De certo modo, fi-la propositadamente viajar no tempo ao passado. Fingi esquecer o seu estado de saúde. Falei-lhe de que algumas pessoas têm os orgulhos mal colocados e que a vida, um privilégio que nos foi concedido, não merece que se agrida com sentimentos ridículos que em nada adiantam uma vivência salutar. Ovídio, dizia: “despoja-te do teu orgulho se longo tempo queres ser amado”. Por incrível que possa parecer ela falou-me que os seus dois maridos tinham morrido: o primeiro com cancro, o segundo, muito mais jovem do que ela, ao salvar a vida de um estrangeiro perdeu a sua. Ela anuiu quando lhe disse que os mortos não morreram porque vivem sempre na nossa memória. Mencionei-lhe ainda que dor que se tem no coração quando se perde alguém que se ama é beleza.
Evidentemente que quando chego à sala de espera, as pessoas reconhecem-me e olham-me com uma certa admiração, vejo que elas se poem adivinhar as causas da minha presença ali. Outros tomam coragem e cumprimentam-me: “o senhor também por aqui!”.
Não posso esquecer a simpatia e a generosidade das rececionistas e das auxiliares sempre ativas. Há uma sintonia de todo o pessoal, o que dignifica o Serviço de Hematologia.
Nada a fazer pelos outros é fazer mal a si próprio. É neste pensamento que situo pela positiva o dr. Fernando Jacinto revelando, uma vez mais, as suas excecionais qualidades humanas e profissionais.

João Carlos Abreu

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