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“Os profissionais de saúde têm um papel importante no manuseamento e prescrição de Fentanil e obrigação de informar sobre o bom uso do medicamento”

O Correio dos Açores esteve à conversa com Pedro Fins, Director Regional de Prevenção e Combate às Dependências dos Açores, para debater e perceber a actual situação do uso de Fentanil na Região, em comparação com outras áreas de Portugal. Nesta entrevista são abordados temas como a prescrição e o consumo de Fentanil nos últimos anos, as medidas preventivas em vigor e a possível colaboração entre entidades para lidar com o problema.

Correio dos Açores – Como avalia a situação actual do uso de Fentanil nos Açores em comparação com outras regiões do país?
Pedro Fins (Director Regional de Prevenção e Combate às Dependências) – Diria que a situação é semelhante. O uso deste medicamento é usado em contexto clínico de curta duração durante um período anestésico ou num contexto de dor crónica ou severa, nomeadamente em situações oncológicas. Este fármaco está disponível nestes casos, onde os utentes são vigiados e acompanhados em contexto clínico. Mas também poderão acontecer situações muito residuais de consumo à margem deste acompanhamento médico.

Existem dados sobre casos de dependência de Fentanil na Região?
Não existem casos notificados de dependência desta substância na Região, mas existem, pontualmente, casos positivos para Fentanil em contexto de tratamento no âmbito dos comportamentos aditivos e dependências, e em equipas de rua que dão suporte à população dos sem-abrigo na ilha de São Miguel.

Como a prescrição e o consumo de Fentanil têm evoluído nos últimos anos nos Açores?
A prescrição de medicamentos com Fentanil tem sofrido as alterações normais que um medicamento eficaz teria. Existem plúrimas situações clínicas em que o Fentanil é mais eficaz do que outros medicamentos a tratar doentes. Ainda assim, em linha com a Europa, tanto em Portugal continental como nos Açores, tem-se adoptado uma postura cautelosa com regras mais apertadas para a sua prescrição, quando comparadas com as dos Estados Unidos da América. Referimo-nos aos EUA por ser este o país com mais problemas relatados ligados a este fármaco. Apesar disso, existem casos de má prescrição, como infelizmente acontece com outros fármacos. Os casos específicos que têm sido noticiados não devem servir para representar toda a realidade. O alarme social que se vem criando, à vez, com substâncias diferentes, nem sempre é o eco da realidade, mas de uma ansiedade colectiva que procura informações aviltantes.
Sendo um opióide sintético, já foi detectado como droga de corte em opiáceos “tradicionais”, mas sem grande representatividade nas amostras disponíveis.
Atendendo à realidade, a Região continuará atenta à evolução desta substância e procederá, sempre que necessário, a intervenções directas, de prevenção e tratamento, e a intervenções de cariz legislativo.

Quais são as preocupações em relação à saúde pública decorrentes do uso de Fentanil?
A possibilidade de se comprar Fentanil no mercado negro, a acessibilidade em termos de preços e o facto deste opióide poder ser misturado com quase todas as outras substâncias psicoactivas, apresentam-se como factores de risco para os consumidores, uma vez que o consumo destes opióides sintéticos com outras substâncias possibilita um maior risco de overdose, constituindo um problema de saúde pública.

Que medidas preventivas estão a ser adoptadas para evitar o aumento do consumo de Fentanil nos Açores?
As medidas preventivas essenciais estão tomadas com a aplicação das normas para a prescrição e venda. Cumprindo estas regras, e elas estão a ser cumpridas na grande maioria dos casos, o aumento do consumo sê-lo-á sob vigilância médica apertada, diminuindo a possibilidade de mau uso do medicamento. A formação técnico-científica de quem manuseia este tipo de medicamentos implica um conhecimento aprofundado acerca do potencial aditivo do Fentanil, sabendo da imperiosidade de cumprir as normas de prescrição. Isto diminui de forma significativa a possibilidade de má prescrição. Os profissionais de saúde têm um papel importante, e que tem sido louvável, de informar acerca do bom uso do medicamento.
Outras medidas preventivas, selectivas ou indicadas, dizem respeito ao contacto com os grupos de risco através das equipas especializadas. Estes contactos permitem a passagem de informação e avaliação de risco.
A Direcção Regional de Prevenção e Combate às Dependências tem, por outro lado, desenvolvido uma intervenção preventiva, que abrange toda a população, potenciadora da reflexão acerca da relação que temos com todas as substâncias psicoactivas. Se é importante reflectir sobre substâncias específicas como o Fentanil, sabemos que o trabalho preventivo começa na relação primordial que se cria com outras substâncias que são mais aceites socialmente e, por isso, mais insidiosas.

Estão a ser envidados esforços para informar os profissionais de saúde e a população em geral sobre os riscos associados ao uso de Fentanil?
Qualquer profissional de saúde que lida com este fármaco está informado e capacitado para perceber os riscos de manuseamento e controle do em contexto hospitalar e familiar. Não sendo neste momento um problema de saúde pública, entende-se despropositado causar alarmismo sobre as causas e efeitos associados ao uso de Fentanil.

Entende que deveria existir uma colaboração entre diferentes entidades, como a saúde pública, serviços sociais e aplicação da lei, para lidar com o problema do Fentanil nos Açores?
Entendo que deve existir, até porque saliento que no dia 30 de Outubro foi tema de apresentação na quinta reunião da task-force “Mudança de paradigma de consumos/ Fentanil”. Este tema foi abordado sob o olhar das várias entidades, nomeadamente sector da Justiça, Saúde, PSP, Polícia Judiciária, em contexto açoriano.

Se, por um lado, entende ser despropositado causar alarmismo sobre as causas e efeitos do uso de Fentanil, por outro, o facto de já ter sido tema de debate na quinta reunião da task-force é um contra-senso…
Não há contra-senso porque a task-force procura, no seu trabalho, antecipar-se aos problemas que possam eventualmente surgir e não apenas aos existentes, já que a prevenção é uma das componentes fundamentais da luta contra as dependências.

Considerando a situação nos Estados Unidos da América, de que forma os Açores estão a aprender com estas experiências internacionais no combate ao uso do Fentanil?
A aprendizagem com a situação nos Estados Unidos foi complementar a um cuidado já existente no que toca a certos fármacos. Isto é, a necessidade de prescrição médica para obter medicamentos com componentes opiáceos inclui o Fentanil, que é usado em Portugal, para fins médicos desde 1967. Portanto, as normas estão delineadas há algum tempo. O problema nos Estados Unidos da América serviu para focarmos ainda mais a atenção, reforçando a aplicação das regras já em vigor. Como se sabe, os Estados Unidos não têm um Serviço Nacional de Saúde e cada um dos 50 Estados tem legislação diferente. Esta organização administrativa do país facilita o acontecimento de fenómenos como o referido. Não que Portugal ou os Açores estejam imunes. Infelizmente, isso não acontece. No entanto, no tocante ao Fentanil, temos ferramentas para controlar de forma eficiente o fenómeno. Não deixa de ser um desafio difícil, mas que não nos deve desviar a atenção de outras substâncias que causam mais dano à nossa população.
Carlota Pimentel

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