A diversificação dos produtos lácteos nos Açores é um objectivo dos sucessivos governos regionais, das associações agrícolas e da Federação Agrícola e as estatísticas voltam a evidenciar que a Região continua longe de atingir esta ambição. O esforço da indústria açoriana para aumentar o mercado do queijo que fabrica e que é o produto de maior valor acrescentado (mesmo recorrendo a um mal menor: as marcas brancas), não tem resultado face à concorrência.
O que os números mostram é que não há vantagem comparativa quando se fabrica queijo numa ilha para o colocar no principal mercado (o continental português), a 780 milhas marítimas, se este queijo não for diferente e de qualidade superior a outros queijos que chegam muito mais baratos por serem fabricados a custos mais baixos e a mais curtas distâncias.
O custo dos transportes marítimos para que o queijo da indústria de lacticínios açoriana faça a ponte de 780 milhas marítimas é uma agravante. Este custo poderá ser mais baixo com outro modelo de transporte marítimo. Mas, mesmo assim, o preço do queijo no seu mercado tradicional continuará a não ser suficientemente competitivo para que, na Região, se produza menos leite em pó, menos leite UHT e mais queijo.
Toda a fileira do leite nos Açores sabe que a independência económica e financeira deste sector de actividade só se consegue com queijos típicos de elevada qualidade que singram em determinados nichos de mercado, onde o preço não seja problema. E a verdade é que o esforço que se está a fazer não é suficiente. E só depois de haver este queijo típico, é que será mais fácil chegar a outros mercados onde se valoriza mais a qualidade que o preço.
O queijo de São Jorge DOP já é distinguido no mercado nacional. Há alguns poucos queijos que atingem já níveis de qualidade acima da média. Mas é possível e necessário fazer melhor.
Só que, pelo rumo que a indústria de lacticínios seguiu nos Açores, com linhas, sobretudo, de queijo bola e de leite UHT, com uma parte significativa destes produtos a ser vendida como marca branca, só se atingirá a qualidade de excelência com profundos planos de reestruturação das indústrias que altere o seu paradigma para o fabrico de produtos de Qualidade de excelência.
Nada disso que escrevo aqui é novo e voltamos a este tema perante a nova quebra na produção de queijo e subida da produção do leite em pó e leite UHT. Por este caminho a fileira do leite não sai da cepa torta. É o preço do leite à produção que não é suficiente para compensar os custos. São as indústrias que têm cada vez mais dificuldades em colocar os seus produtos no seu mercado tradicional a um preço que compense o custo de produção.
Ainda esta semana, a ANIL – Associação Nacional de Lacticínios queixou-se que entrou muito queijo de outros países no mercado continental português, causando graves problemas de competitividade à venda do queijo açoriano. Mas este é um choro sem remédio que não seja a reestruturação da indústria, vocacionando-a para produtos de excelente qualidade. E este objectivo só se consegue com grandes investimentos para a criação de linhas de produção de queijo que seja único no mercado, com apoios a percentagens significativas da União Europeia. Aliás, o Governo dos Açores (seja ele qual for) só deverá financiar projectos de indústria que representem uma mudança de paradigma para linhas de produção que garantem produtos com qualidade de excelência e não para manutenção do que já existe.
O Presidente da Federação Agrícola dos Açores, Jorge Rita, há vários anos que vem defendendo a necessidade de diversificar os produtos lácteos açorianos, atribuindo-lhes a excelência que é alcançada pela maioria esmagadora dos agricultores para o leite nas explorações agrícolas. E a relação é simples: Se a indústria não se reestrutura para produzir queijos de elevada qualidade, que ganhem, pelo seu mérito, espaço no mercado e assim se atinja a rentabilidade desejada, continua-se na mesma: É o preço do leite à produção que baixa para a indústria manter o mesmo lucro e, na maioria delas, distribuí-lo pelos accionistas.
A fuga dos produtores de explorações de leite para explorações de carne foi a solução encontrada para estancar a baixa do preço do leite à produção. Mas, sendo esta alteração rentável, sobretudo enquanto o mercado da carne for favorável, quanto não custa emocionalmente deixar as vacas de leite para produzir gado de carne? Quanto a isso, a evolução da produção de leite fala por si.
E, da forma como tudo é mutável, será que o mercado da carne vai consubstanciar, durante muitos anos o rendimento que os agricultores ambicionam, e se consiga criar uma fileira consolidada que passe de geração em geração?
Não será que, na fileira do leite dos Açores, ainda se vai a tempo de reflectir sobre um plano de reestruturação da indústria de lacticínios que represente uma mais-valia para se atingir a diversificação e produtos lácteos de excelência, havendo um compromisso escrito de que, com esta reconversão da indústria, todos ganham, desde o produtor ao consumidor?
Ou, então, a Região não deveria dispo-nibilizar fundos comunitários para apoiar a construção de queijarias associadas a uma ou mais explorações leiteiras em São Miguel viradas para o fabrico de queijos únicos e de qualidade excelente – alguns de pasta mole – como já acontece em algumas ilhas do Grupo Central do arquipélago e, sobretudo, na ilha do Pico, mas também na ilha das Flores?
Queijarias com capacidade para poderem colocar o seu excelente queijo no mercado nacional e até mesmo internacional.
Questões que estas estatísticas do Serviço Regional de Estatística propiciam uma reflexão sobre o futuro do sector agro-pecuário na Região.
João Paz