Chegou a vez da Madeira. A instabilidade política não se circunscreve à que atinge diretamente os órgãos de governação. Não é só neste tipo de instituições que ela ocorre com efeitos nocivos para sociedade e para a economia. Tenhamos presente que a democracia tal como a concebemos hoje, assenta na formação e na atuação dos partidos e na gestão dos seus dirigentes. Se estes funcionam mal a sociedade e economia não escapam em desconfiança e incerteza quanto ao futuro.
Não é só a administração pública (Estado) que carece de profunda reforma, também os próprios partidos, essencialmente estes, não se devem considerar como impolutos, incólumes e perfeitos. Não há governação sem partidos, como nos ensina a história. Não é com a constituição e o conselho vinculativo de “assembleias de bons cidadãos” que a reforma necessária se faz .
O presidente do Governo Regional e líder do PSD naquela Região Autónoma pediu a demissão do lugar que ocupava há vários anos porque o Partido com o qual o PSD mantinha um acordo parlamentar para formação da maioria necessária de suporte do Governo do PSD ameaçou retirar-lhe o apoio se assim não procedesse. O Presidente teve de condescender, depois de durante uns dias ter declarado que não o faria.
O ambiente político era muito pesado e incontornável o que não permitia uma permanência no lugar nem nenhuma saída airosa por muito que o presidente do Governo garantisse a sua inocência em relação aos factos e atos que alegadamente teria promovido e praticado. Estavam estes a ser escalpelizados, referidos repetidamente em toda a comunicação social com a agravante do Chefe do Executivo regional ter sido constituído arguido. Muito embora a qualificação de arguido não comprove as suspeições listadas e seja uma medida processual destinada a assegurar a defesa do visado é quase universalmente percecionada como sinal forte de indícios da prática de atos condenáveis.
A presunção de inocência até à condenação, como princípio, dificilmente é considerada quando em causa estão atos e comportamentos alegadamente imputáveis a políticos notáveis.
Além disso tinha sido posta em marcha uma ação de investigação dirigida pelo Ministério Público como nunca se tinha visto, pelo elevadíssimo número de agentes policiais e de procuradores do Ministério Público. Como também por se tratar duma Região Autónoma.
Embora sejam muito distintas recordei o desembarque no Aeroporto de Ponta Delgada – também de um avião da força aérea – e a atuação de uma “unidade da polícia intervenção nacional” que não se justificava. Um ministro em visita aos Açores tinha sido rodeado, alvo de alguma violência e invetivado por um grupo de cidadãos “retornados do Ultramar” e outros – poucos – habitantes. Nos “encostamentos” que ocorreram o ministro apenas partiu os óculos. Um caso isolado, de curta duração, perfeitamente ao alcance da polícia local. A unidade da polícia de intervenção ainda esteve dois ou três dias posicionada nas imediações do comando da PSP de S. Miguel junto a um “café” frequentado por autonomistas, ditos independentistas, o que causou alguma tensão. O regresso da unidade da polícia de intervenção só se verificou depois de conversações entre o Governo Regional e o Governo da República. Correram boatos de ocupação da estação emissora – RDP – e do aeroporto de S. Miguel. O Governo Regional fez um comunicado tranquilizador, definiu as condições do retorno à normalidade e os ânimos serenaram.
A ação de investigação do Ministro Pública na Madeira terá com certeza consequências eleitorais pelos políticos envolvidos, pela dimensão da ação e por se tratar de uma Região Autónoma. É oportuno e apropriado o comentário do Presidente da República recordando que a “justiça não tem calendário” o que apenas quer dizer que as circunstâncias, como por exemplo a proximidade das eleições não devem condicionar a sua própria e independente programação.
No entanto, um antigo e respeitado Procurador-geral da República que conhece bem os Arquipélagos portugueses, na passada sexta-feira, comentou a ação do Ministério Público na Madeira sublinhando a sua invulgar amplitude – o avião da força aérea e o número de agentes e de procuradores intervenientes – e uma matéria ou realidade institucional em Portugal que não é comum ser considerada pelos órgãos do governo central: a Madeira é uma Região Autónoma! A ação desenvolvida pelo Ministério Pública na Madeira necessita de ser explicada, disse.
Álvaro Dâmaso