Projecto LIFE Natura@night implementado pela SPEA
As pessoas preocupam-se com a poluição luminosa, e apoiam medidas ambiciosas para a reduzir. São estas as principais conclusões de um inquérito realizado no âmbito do projecto LIFE Natura@night, às populações dos Açores, Madeira e Canárias.
Dos 2.207 residentes destes arquipélagos que responderam ao questionário, 87% manifestou-se a favor de reduzir a iluminação pública da sua rua entre a meia-noite e as 6h, o período em que consideram que a iluminação pública é menos utilizada.
Nestas ilhas, as pessoas estão muito cientes do impacto da poluição luminosa na biodiversidade: 92% dos inquiridos “concorda totalmente” ou “tende a concordar” que a luz artificial afecta negativamente as aves marinhas como os cagarros, e 94% diz que salvaria ou já salvou uma ave marinha encandeada.
“As pessoas claramente estão conscientes do impacto da luz artificial nos animais nocturnos, e querem mudar isso, mesmo que implique algumas alterações nas suas vidas”, diz Tânia Costa da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), organização coordenadora do LIFE Natura@night.
A maioria (mais de 90%) declarou que apoiaria alterações de iluminação pública na sua freguesia para proteger a vida selvagem. Dos vários tipos de iluminação apresentados no inquérito (festiva e de Natal, residencial, de parques e jardins, ornamental, rodoviária, de parques desportivos, de áreas comerciais e de sinais luminosos), as luzes de áreas comerciais e sinais luminosos são as consideradas “mais incómodas e menos necessárias”: pelo menos 83% dos inquiridos considera que “se podem reduzir ou são até dispensáveis”.
Em termos de protecção da biodiversidade, 77% dos inquiridos “vai mais longe, concordando que dentro das áreas protegidas não exista iluminação artificial.”
O inquérito, que visava avaliar percepções sobre poluição luminosa, conhecer preferências e medir o apoio das populações à iluminação artificial e pública, foi realizado entre Outubro de 2022 e Maio de 2023 pelo projecto LIFE Natura@night, tendo sido implementado pela SPEA nos Açores e Madeira e pela Sociedade Espanhola de Ornitologia nas Canárias. Foram recolhidas respostas de 114 residentes dos Açores, 1.875 da Madeira e 218 das Canárias.
A poluição luminosa causa impactos na sociedade, individualmente e na sua actividade. Na saúde provoca cansaço visual, perturbações no descanso (devido à diminuição da produção de melatonina), dor de cabeça e stress, e patologias associadas como a depressão e alterações de humor. Afecta a actividade da astronomia, sendo que na maioria das urbanizações e principalmente em grandes cidades, é quase impossível observar as estrelas.
Na Macaronésia existem dez espécies de aves marinhas pelágicas nidificantes e que são vítimas de poluição luminosa. Devido aos seus olhos sensíveis e comportamentos nocturnos, são vítimas de encandeamento. Desorientadas, colidem contra edifícios, carros ou postes de luz, caindo no chão, e tornando-se vulneráveis ao atropelamento, à predação por gatos e ratos, à caça ilegal e até à desidratação. Devido à sua inexperiência, os juvenis são os mais afectados por esta problemática.
Quase um quarto das espécies de morcegos está sob ameaça em todo mundo. Estes animais nocturnos estão entre os grupos mais afectados pela poluição luminosa, que influencia as interacções ecológicas e tem efeitos adversos no seu comportamento de alimentação, reprodução e comunicação. Na Macaronésia ocorrem nove espécies de insectívoras que desempenham um papel fundamental na saúde dos ecossistemas terrestres através do controle de pragas e de insectos transmissores de doenças.
Os insectos nocturnos também são afectados pela poluição luminosa. Atraídos pelas luzes e com o sentido de orientação comprometido, tornam-se mais susceptíveis a predadores, voando incessantemente em redor das luminárias. Com um importante papel nos ecossistemas, o declínio das suas populações causa efeitos negativos também nas aves, morcegos e outros polinizadores. Na Macaronésia são conhecidas cerca de 170 espécies de borboletas nocturnas que carecem de informação a nível de distribuição e estatuto de conservação actualizado.