Uns porque esquecidos pelos seus familiares, que ali os depositaram, têm no seu olhar, fixo no nada, a saudade dos que tanto, ainda amam, mas deles se esqueceram! Regam com as lágrimas, em silêncio, a dor que os acompanham. Outros porque constituíam um embaraço para os seus filhos foram deixados no lar. Conscientes da situação bordam as palavras de revolta, com a amargura dos dias infindáveis…
No meio desta tempestade de um palavreado dos políticos que ganha mais força à medida que se aproximam as eleições de março.
Palavras de insultos, mentiras, promessa irrealizáveis (porque já prometidas, por todos os partidos em eleições anteriores e nunca cumpridas). Em todo este imbróglio de uma opereta pobre não ouvimos falar da situação dos idosos em alguns dos lares do nosso Portugal; a falta de condições para uma vivência quotidiana condigna para seres humanosque nesta altura deveriam merecer, por direito, a uma qualidade de vida; a forma como, às vezes, são tratados, com alguma indiferença e desumanismo e ainda as deploráveis instalações degradadas, malcuidadas.
Efetivamente, algumas mais se parecem armazéns para armazenar velhos. Na verdade, Portugal nunca amou os seus velhos, basta dar uma volta pelo país e logo temos a confirmação. Porque somos um país cada vez mais envelhecido e não há lares suficientes para instalar um número tão considerável de idosos, nem mesmo juntando os lares clandestinos de qualidade duvidosa, aos quais fecham os olhos, em vez do Governo resolver o problema, porque, quer queiram quer não, este é um problema do Governo.
Em muitos lares os utentes, têm poucas condições de higiene e a degradação das instalações é flagrante. Arrumam-se dois, três ou mais utentes por quarto que não é nada recomendável. Não desconhecemos que a Segurança Social, tem brigadas de fiscalização, mas em muitos casos, ela não age porque há lares sob a sua jurisdição: vão se multar a si própria?
Mencionamos os lares que visitamos em alguns países europeus excelentes, com programas sociais, de cultura e diversão onde os velhos não se sentem velhos e marginalizados, pela dinâmica imprimida e a qualidade que desfrutam. É certo que realizaram os seus descontos, como nós descontamos (não discuto se foi pouco ou muito) o que sei é que eles têm regalias que nós não temos e merecíamos ter, nem estão submetidos a tanta burocracia.
Há três pontos que não posso deixar de mencionar:
Os governos (nacionais e regionais) devem ter uma sensibilidade social e no quadro dessa os problemas dos idosos devem estar no lugar das prioridades. Eles trabalharam, em muitos casos foram mal pagos, mas uma coisa podemos garantir: ajudaram a construir o país.
Aos que cuidam dos idosos nos lares devem ser exigidas determinadas qualidades. Se não tiverem vocação para a missão; se não amarem as pessoas; se não tiverem paciência, não devem ser aceites. Este não é um emprego para preencher uma necessidade, mas sim uma missão de apostolado. Caso contrário corremos o risco de se ouvir: “esta velha é chata” ou “este velho não presta para nada”. E outras atitudes nada recomendáveis.
Há três tipo de utentes:
Uns porque os filhos têm uma situação complicadíssima: o filho trabalha e a nora também, têm filhos. Os salários são baixos para puderem pagar alguém para ficar com a mãe que, pela idade, requer cuidados especiais e, por conseguinte, é pô-la num lar, sem nunca, porém abandoná-la.
Outros para se desembaraçarem dos pais velhos colocam-nos nos lares, onde nem sequer vão visitá-los! “Não têm tempo”. A vida é muito absorvente: viajam. Vão ao cinema, etc… Mas para visitarem os que lhes deram vida, não encontram tempo!…
Existem ainda os abandonados, a si próprios, não têm família, nem ninguém que os queiram cuidar.
É certo que há os lares para os ricos, com todas as condições, talvez em alguns, haja falta de amor, de qualquer forma têm excelentes instalações, condignas e uma alimentação cuidada.
Em Portugal a Segurança Social, entendeu, talvez por um estudo mandado fazer por por algum Ministro tecnicista, de dar em concessão os lares que estavam sob sua direção a empresas privadas. Naturalmente com exigências que nem sempre são cumpridas. É preciso não esquecer que um negócio é sempre um negócio. A diretrizes não são idênticas às da Segurança Social, nem o espírito dos diretores é movido humanamente como o comportamento dos diretores da Segurança Social. “Há que pensar que e isto é um negócio e, portanto, temos que ter lucros”.
Pelo trabalho excelente que, durante 15 anos, realizou no Lar da Boa Vista, a Dra. Ana Isabel, como diretora revelou a sua competência, eficiência, carga humana. Ali ficou um pouco da história da sua vida e muito do seu amor pelos outros. Na realidade, a Dra. Ana Isabel tem todos os itens que lhe possibilitaram ser uma diretora de excelência, com uma formação humana elogiosamente referida pelos utentes e por quem a conhece bem. Ela faz do seu trabalho, imbuído de um espírito de apostolado, o que muito a dignifica.
Infelizmente, os outros lares da Madeira, sob orientação da Segurança Social, por imposição de Lisboa, vão ser concessionados. O futuro dirá se valeu a pena ou não, privatiza-los. Neste sentido, sacrifica-se a parte humana para que se alcancem os objetivos materiais. Esse é o espírito das empresas.
Na Madeira o Lar da Bela Vista que, inicialmente, foi construído para ser um hotel, com uma vista única sobre o Funchal, foi, em julho passado, dado por contrato a uma empresa privada. Por cláusula contratual a Segurança Social, ficou ali até 31 de dezembro. Ao pessoal foi dada a possibilidade de escolherem: ficar na empresa concessionária ou permanecer na Segurança Social. Do que nos informaram, de um universo de mais de meia centena e meia de trabalhadores, apenas 17 escolheram a empresa privada.
Sou, como cidadão, contra a privatização dos lares da Segurança Social. A Segurança Social, esta continuará a subvencionar os utentes.
Há uma questão esquecida: o afeto e a relação de amizade que os utentes mantiveram, durante muitos anos, com as suas cuidadoras e que, naturalmente, sentirão a sua falta.
Este assunto tão importante dos Lares, não faz parte da agenda dos partidos, não lhes dá votos. É preferível a demagogia que atrai os eleitores ignorantes, iludindo-os com promessas irrealizáveis.
João Carlos Abreu