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Marina Loures, a ribeigrandense que constituiu família em Londres, foi ao Brasil para operar o marido e abriu uma empresa de jóias nos Açores

Natural da Ribeira Grande, Marina Loures esteve emigrada durante 10 anos e, recentemente, decidiu voltar a São Miguel com a família que constituiu em Londres. Por cá, já criou a empresa Marisbella Azores, com jóias originais do Brasil, e continua a sua paixão pelo artesanato com a Arte e Fé, uma marca vocacionada para eventos e artigos personalizados. À conversa com o jornal Correio dos Açores, revela o sonho de ajudar as mães artesãs e empreendedoras da Região, pois afirma que, muitas vezes, “é essa pequena ajuda que falta para começar.” Àqueles que, tal como ela, querem voltar aos Açores, garante que este “é um lugar seguro para viver.”

Correio dos Açores – Pode falar um pouco da sua experiência no estrangeiro? O que é que a levou a emigrar em primeiro lugar?
Marina Loures – Quando acabei o curso de Organização de Eventos em São Miguel, fiz o Estagiar T e nessa altura queria uma experiência nova. Sempre tive curiosidade acerca da vida para além da ilha, e, como tinha uma amiga em Londres, decidi ir ter com ela, em 2013. Um ano depois, conheci e o meu marido e casamos em 2015. Em Londres tive vários trabalhos em restauração, limpeza, lojas, etc. Foi uma experiência de vida completamente nova.

Quais foram os principais desafios da emigração? Como se enquadrou na sociedade inglesa?
Desde que cheguei a Londres, em 2013, vivi mais com a comunidade brasileira do que propriamente com a inglesa. Tanto os meus colegas de casa, como os de trabalho eram brasileiros. Para além disso, Londres é um misto de culturas e, na verdade, torna-se um pouco difícil decifrar quem é originalmente inglês.
Temos de ir de mente aberta para aceitar culturas muito diferentes, mas para mim o mais difícil foi a língua pois não falava inglês fluentemente. O próprio sotaque do país é muito forte, mas depois também há o da Escócia e todos os sotaques provenientes da mistura de culturas que torna a compreensão ainda mais difícil. Temos de estar muito atentos.
Para além da língua, a adaptação ao sistema em si também não foi fácil. Perceber como funciona o sistema de saúde, trabalho e transportes públicos, por exemplo. Quando se emigra temos de fazer uma pesquisa sobre o funcionamento da cidade porque é um choque muito grande, principalmente para quem vem de uma ilha pequena onde nem existe trânsito.
Por outro lado, é uma cidade com muitas pessoas e, às vezes, acaba por ser um pouco solitário porque de entre aquelas pessoas todas não conhecemos ninguém

Tem momentos caricatos vividos nestes dois países que gostasse de partilhar?
São muitas histórias, mas, por exemplo, quando trabalhei na restauração, cheguei a servir várias celebridades como a Cláudia Claudia Schiffer, o Júlio César, guarda-redes da selecção brasileira. Também há a questão dos choques culturais e da adaptação. Estive muitas vezes perdida em Londres (risos)… Há 10 anos, eu não tinha telemóvel com internet e, para sair de casa, tinha de pesquisar a rua no computador, imprimir a página do Google Maps e levar o papel comigo. Uma vez estava tão perdida que tive de ligar a uma amiga que me indicou qual o autocarro de volta, mas em vez de apanhar o que ia para a zona da minha casa, fui no que estava a voltar de lá. Fiz o percurso todo ao contrário e tive de fazer aquela distância para voltar. É por situações como esta que digo que, antes de emigrar, temos de pesquisar sobre sítio para onde vamos, pois não é fácil.

Quanto tempo depois é que sentiu que ficou mais fácil?
Só um ano depois é que me senti mais adaptada. O primeiro ano é muito complicado, mas apesar disso, eu sempre adorei Londres. É cidade dos meus sonhos, onde tudo se pode realizar e onde há muita liberdade. Tudo o quisermos fazer, podemos fazê-lo. Tudo o que se quiser comprar, encomenda-se de manhã e à tarde já está em casa. É uma cidade muito bonita e onde tudo acontece com um estalar de dedos.
Nos Açores tudo leva mais tempo e às vezes não chega. Ao voltar para cá temos de abrir mão desse tipo de acessibilidade a que nos habituamos. E, claro, acaba por ser uma nova adaptação. Contudo, os pontos mais fortes como a saúde, educação e segurança superam isso. Londres está a ficar uma cidade muito perigosa.

Emigrou sem saber a língua, mas acabou por entrar numa universidade inglesa …
Tenho muito orgulho no facto de ter chegado a Londres sem falar a língua e mais tarde ter entrado numa universidade inglesa. Depois de muito esforço, consegui falar e escrever fluentemente e em 2021 fui aceite na Angila University of London. Como fiquei muitos anos sem estudar, e por ser um sistema novo, primeiro tive de fazer o “ano zero” num curso aleatório, assim, entrei em Healthand Social Care só para aprender como funciona universidade. No primeiro ano eu ia fazer Marketing and Business, mas deram-me o ano de maternidade e, entretanto, o meu marido, que é brasileiro, teve um problema de saúde que nos fez ter de ir para o Brasil em 2022.

Uma questão de saúde familiar levou-a a abandonar Londres. Quer falar sobre esse momento?
O meu marido rompeu o tendão em Maio de 2022, quando eu estava em licença de maternidade. Acontece que, depois da pandemia, o sistema de saúde de Inglaterra começou a reduzir os serviços e não queriam fazer a cirurgia. Colocaram uma bota especial e depois de 12 semanas o tendão ficou bem e ele voltou a andar. Entretanto, voltou a romper o tendão. Desta vez o sistema disse que ia fazer cirurgia, mas demorou mais de dois meses. Um ortopedista do Brasil disse para irmos de emergência para lá porque não podia esperar mais. No Brasil ele fez cirurgia, tratamento e fisioterapia durante um ano.

O que é que a motivou a voltar aos Açores após tantos a viver no estrangeiro?
Planeávamos voltar aos Açores desde 2019, mas formos sempre adiando. Primeiro veio a pandemia Covid-19, depois fiquei grávida, comecei a estudar na universidade… Foi quando o meu marido rompeu o tendão pela segunda vez que decidimos que, depois do tratamento no Brasil, não íamos voltar a Londres.
Acredito que o sistema de saúde de Região lida melhor com situações de emergência e, apesar de também haver problemas, a saúde na ilha ainda é boa. Para além disso, a educação também é de qualidade. Aqui as crianças saem da escola pública a saber ler e escrever, o que por vezes não acontece no Brasil, onde é preciso recorrer ao sistema privado. Outro factor importante é a segurança. A qualidade de vida aqui é boa e acredito que a ilha está a ir por um bom caminho.

Como surgiu a ideia de criar a marca de jóias Marisbella? Há uma história por trás do nome e da marca?
O meu público alvo são mulheres a partir dos 25 anos e eu queria um nome elegante para a marca. A ideia foi a de trazer jóias de designers brasileiros pois lá este é um mercado bem desenvolvido. As mulheres querem jóias diferente para o dia-a-dia e, por vezes, não as conseguem encontrar com uma boa relação qualidade-preço.
A Marisbella é uma marca de revenda e trabalho com quatro designers de duas fábricas do Brasil. Selecciono as peças por catálogo e encomendo directamente às fábricas. São jóias diferenciadas com uma qualidade e acabamento diferentes, com pedras bastantes coloridas e são banhadas em ouro ou prata.

As vendas têm corrido bem? Como tem sido a recepção das pessoas?
Tem corrido muito bem. Como voltei para cá em Outubro, só consegui criar a marca em Dezembro e ainda falta terminar o website.Mas, em geral, tenho tido bastante procura, inclusive peças em específico para noivas.

Onde é que podemos encontrar as suas peças e quais são os preços médios?
De momento só estou a vender através das redes sociais, pelo WhatsApp, ou pessoalmente. Se a pessoa quiser ver as jóias, posso encontrar-me com ela, isto porque o meu website ainda não está pronto. As peças vão desde os 10 aos 60 euros.
Além da marca Marisbella, também cria lembranças e terços artesanais personalizadas com a marca Arte-e-fé. Como surgiu essa iniciativa?
A “ArteeFé” é mais direccionada para eventos, em especial, lembranças como porta-chaves, sabonetes, velas de baptizado,caixas originais. Para além dos terços personalizados, também criei terços para decoração e agora estou a começar a parte de convites e logotipos. A ideia surgiu ainda em Londres, quando estava em licença de maternidade,onde senti a necessidade de um terço para rezar, mas só conseguia encontrar o tradicional.

Sempre teve gosto pelos trabalhos artesanais, ou foi algo que só surgiu nessa altura?
Sempre tive gosto por esse tipo de trabalhos e acredito que,desde muito cedo, já tinha uma veia criativa.A minha mãe tem uma loja de decoração de eventos edesde muito novaque eu criava as lembranças. Quando emigrei, e porque trabalhava muito em Londres, não tive a oportunidade de continuar, mas quando fiquei em casa, voltei a criar estas peças com a minha filha mais velha e foi aí que começou a “Arte e Fé”.

Tem em vista a expansão do seu negócio?
O meu sonho é criar um espaço físico para englobar a Marisbella e a Arte e Fé; uma loja física para as jóias com um ateliê dedicado ao artesanato, pois gostava de apoiar as mães artesãs e empreendedoras da ilha, porque,por vezes, tudo o que falta é essa pequena ajuda para começar.

Que conselho tem para jovens empreendedores que querem começar o seu negócio na Região?
Que tenham força e coragem porque a ilha precisa de jovens. Fazer croché ou renda com a avó são exemplos de coisas valiosas que aprendemos em criança e que, mais tarde, podem ser uma via de negócio.Também é importante ter pessoas que saibam aconselhar estes jovens. Porque às vezes basta uma palavra não amiga para que eles desistam das suas ideias e dos seus sonhos, portanto, têm de saber com quem falar e cultivar o gosto pelo empreendedorismo.

Que mensagem tem para os emigrantes que, tal como você, querem voltar à Região?
Àqueles que pretendem voltar, quero dizer que acredito que este é um lugar seguro para viver e está a crescer. A mentalidade também está um pouco mais evoluída e, claro, não há nada como a nossa terra!
Daniela Canha

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