Face a Face…! com Carlos Melo Bento
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Carlos Melo Bento (Advogado) – Nasci no princípio da segunda guerra mundial, na Rua dos Manaias, e vivi toda a minha vida nos Açores, à excepção dos 50 meses que residi em Lisboa, a formar-me em Direito.
Fale-nos do seu percurso de vida no campo académico, profissional e social?
Depois de licenciado, em 1964, fui Procurador da República na Ribeira Grande e Povoação; Conservador dos Registos, em Vila Franca do Campo, terra de meu pai e meus avós; professor na Escola Industrial de Ponta Delgada e aqui advogado o resto da minha vida, até hoje. Presidi ao Ateneu Comercial, aos Bombeiros Voluntários a quem fiz construir o Quartel de São Joaquim (hoje PSP), ao Micaelense Futebol Clube, ao CDS/Açores e ao Partido Democrático do Atlântico. Fui eleito Presidente da Ordem dos Advogados nos Açores e membro do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, em Lisboa.
Que influencia tiveram os seus pais na sua formação académica?
Meu pai queria que eu fosse médico. Não lhe fiz a vontade mas dei-lhe dois netos e um bisneto médicos…
Como se define a nível profissional?
Um razoável advogado açoriano.
Quais as suas responsabilidades?
Faço o possível por as cumprir…
Como descreve o sentido de família no tempo de seus pais. Qual o sentido que ela tem hoje e que espaço lhe reserva?
A família, no tempo dos meus pais, era o princípio, o meio e o fim de tudo. Para mim, hoje, ela é o princípio, o meio e o fim de tudo.
Que importância têm os amigos na sua vida?
Sempre tive amigos. O primeiro, aos 5 anos de ambos, foi Jorge Gusmão meu vizinho. Cultivei sempre a amizade, guiado pelas qualidades deles e, numa fase mais avançada da vida, pela sua cultura. Infelizmente a morte tem-nos roubado impiedosamente. Tento fazer amizade com os mais novos levado pela política e pela cultura, mas a diferença geracional tem tantos obstáculos…
Para além da profissão que actividades gosta de desenvolver no seu dia-a-dia?
Jornalismo de opinião, estudo e divulgação da História Açoriana.
Que sonhos alimentou em criança?
Incontáveis. Curiosamente, todos nos Açores…
O que mais o incomoda nos outros?
Pouco.
Que características mais admira no sexo oposto?
A beleza física e moral e, sobretudo, a feminilidade.
Gosta de ler? Diga o nome de um livro de eleição?
Leio três livros diferentes por dia.
Como lida com as novas tecnologias e que sectores devem a elas recorrer para melhorarem o respectivo rendimento?
O milagre da nossa geração. Quando vi dois sobrinhos crianças, na América, brincarem com computadores, concluí que também podia fazê-lo, apesar de já ser sexagenário. Contratei um familiar mais novo para meu professor a troco de lhe comprar o computador “só com 2 anos”, pelo preço que tinha custado e cá vou tant bien que mal… pelos Windows, Facebook, Whatsapp e por aí fora.
A inteligência artificial está no centro do debate e pode por em risco o ser humano. Até onde deve ir essa inovação?
Não sei. A primeira coisa que li com tarelo sobre isso foi o artigo do Prof. Doutor Armando Mendes no Correio dos Açores e que, fora as insuportáveis siglas de que os cientistas usam e abusam, me deu uma vaga noção do assunto. Mas não chega para responder…
Costuma ler jornais?
Todos os dias.
Gosta de viajar? Que viagem mais gostou de fazer?
Gostei muito de viajar por esse mundo fora e sempre que possível assistir a julgamentos e até participei em dois: um em Londres outro em Fall River. A viagem de que mais gostei foi a Atenas, em busca dos lugares por onde andaram o imortal Sócrates e o seu mais famoso discípulo: Platão.
Quais são os seus gostos gastronó-micos? E qual é o seu prato preferido?
Sempre gostei de chicharrinhos fritos com pimenta e batata cozida. Favorito: filetes de abrótea, no Gilberto da Relva.
Que notícia gostaria de encontrar amanhã no jornal?
Desculpe, mas isso é segredo…
Se desempenhasse um cargo gover-nativo descreva uma das medidas que tomaria?
Negociações com americanos e canadianos para que recebessem os repatriados, que enxameiam os Açores, a troco de facilidades na Base…
Qual a máxima que o inspira?
“Faz aos outros o que gostarias que te fizessem a ti”.
Em que época histórica gostaria de ter vivido?
Nesta.
Enquanto advogado experiente, que análise faz ao sistema judicial nos Açores?
O nosso sistema judicial é bom e funciona bem. Não é fácil fazer julgamentos na maior parte das ilhas onde os factos ocorreram e os que são feitos por teleconferência não são iguais aos julgamentos presenciais. Mesmo assim, a elevada categoria e a honradez da nossa Magistratura tem conseguido manter em alto nível a qualidade da Justiça produzida quer no sector criminal quer no civil. Quem perde nunca fica satisfeito, é certo, mas a Justiça tem os olhos vendados para as pessoas e apenas vê factos e leis. No sistema americano e inglês, os juízes têm muito menos formalismos medievais a obedecer e a escrever, o que lhes poupa tempo infinito, sendo que as suas decisões não se afastam das nossas no final. Vi na América, um só juiz despachar mais de 10 casos numa manhã. Tudo verbalmente; o funcionário chama as pessoas pelo microfone, toma-lhes o juramento e o juiz apenas decide! Tudo gravado (como cá) e quem quer recorrer que transcreva e se desenrasque. Aqui, é tudo para cima dos juízes. Muito fazem eles.
Que analise faz à situação política regional?
Perigosa para todos nós, incluindo para os partidos.
Qual é a leitura que faz dos resultados das últimas eleições legislativas regionais? Os eleitores não terão dado a indicação de quererem um Governo de maioria absoluta entre a coligação PSD/CDS/PPM e o CHEGA?
Não me parece. Esse partido é um epifenómeno passageiro. A Coligação é uma experiência nova e, pelos vistos, a preferida da maioria relativa dos votantes.
Os Açores são ingovernáveis com um Governo de maioria relativa como o da coligação do PSD/CDS/PPM e com a decisão reiterada do seu líder de não fazer acordos escritos de incidência parlamentar, muito menos fazer governo com o CHEGA? Quer explicar?
Os Açores são ingovernáveis por gente inculta e com inteligência meramente futebolística. Quem deitar o Governo Bolieiro ao chão ficará a saber o que pensam os eleitores votantes dos causadores dessa queda.
Acredita em entendimentos sucessivos de legislatura entre o Governo de maioria relativa da coligação e o PS/Açores?
Enquanto o jogo da política for mais importante que o interesse geral dos açorianos, não acredito.
Se o programa de Governo e/ou o Plano e Orçamento não passarem na Assembleia Legislativa Regional e o líder da coligação PSD/CDS/PPM não quiser apresentar uma segunda solução de Governo de maioria absoluta com o CHEGA, em novas eleições, os eleitores, em sua opinião, vão penalizar quem?
Quem provocar a sua queda.
A questão que se coloca é, em caso de nova crise política e novas eleições, os eleitores vão dar maioria absoluta à coligação PSD/CDS/PPM ou vão reforçar ainda mais a votação no CHEGA?
Não é fácil a resposta. Muito dela vai ser dada pelo resultado das eleições nacionais de Março próximo.
Quer acrescentar algo mais que considera importante no âmbito desta entrevista?
Que os açorianos deveriam pensar duas vezes antes de votar…
João Paz