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Espécies endémicas de caracóis dos Açores estão em risco de extinção, revela artigo científico de Frias Martins, Diamantino Henriques e Robert Cameron

O trabalho de investigação “Os caracóis endémicos dos Açores estão a desaparecer. De quem é a culpa?,” publicado na Revista de Estudos Açoreana, na edição de Dezembro de 2023, dá conta de uma tendência para o declínio do número dos moluscos (caracóis) endémicos dos Açores. Os investigadores consideram a situação “preocupante.”
Algumas espécies, nomeadamente em Santa Maria, uma das mais ricas em termos de moluscos endémicos, estão em risco de extinção e outras já desapareceram. As alterações climáticas e a destruição do habitat, juntamente com a introdução de plantas e animais invasores, podem ser responsáveis por tal fenómeno, de acordo com o artigo da autoria de António Frias Martins, Diamantino Henriques e Robert Cameron.
A vulnerabilidade das ilhas açorianas e das suas espécies endémicas é atribuída a vários factores, como a estreita adaptação ao nicho, as mudanças provocadas pela actividade humana e a introdução de predadores, aos quais se juntam as alterações climáticas, que intensificam os efeitos. Segundo o presente estudo, “a análise de parâmetros meteorológicos (temperatura do ar, precipitação, humidade relativa) proporcionou evidência para influência da alteração climática, e inspecção do uso da terra ao longo dos anos mostrou extensa fragmentação do habitat, aumento da floresta secundária e propagação de espécies invasoras. Sugere-se que as alterações climáticas e a destruição do habitat, juntamente com a introdução de plantas e animais invasores, são responsáveis por tal desaparecimento.”

Santa Maria é a mais rica em
espécies endémicas, mas algumas foram extintas e outras estão em risco

A investigação abordou e apresentou, pela primeira vez, os impactos destes factores nos moluscos terrestres endémicos da ilha de Santa Maria (a mais rica em caracóis endémicos) através do número de espécimes colectados em diversas missões durante cerca de 50 anos.
O artigo mostra uma tendência para a diminuição da abundância das espécies de moluscos endémicas após 1990, em concreto, no caso de Santa Maria. Quatro espécies (imagens de A a D) são consideradas extintas, por nenhum exemplar ter sido encontrado há mais de 20 anos: Leiostyla tesselata; Leiostyla elegan; Azorivitrina angulosa; Moreletina sp. c. Três outras espécies (imagens de E a G) tornaram-se tão raras que se presumem poderem entrar em extinção: Oxychilus micromphalus; Azorivitrina pelagica; Oxychilus agostinhoi.
De acordo com o estudo, as espécies das montanhas são as mais afectadas. Aquelas que vivem em baixas altitudes, algumas perto da costa, são menos afectadas, “assim como as espécies que podem ser encontradas desde a costa até ao ponto mais alto” (Pico Alto.)
A publicação lembra que nas primeiras expedições nesta ilha, que datam aos anos 50 do século passado, quando os naturalistas franceses Arthur Morelet e Henri Drouet conduziram a primeira maior expedição sobre os moluscos dos Açores. Os cientistas registaram 32 espécies endémicas, oito das quais foram apenas observadas em Santa Maria. Em 1975, numa revisão, foram registadas 35 endémicas, sendo que 10 eram encontradas apenas nessa ilha. Em 1976, a criação da Universidade dos Açores levou a uma nova colecta e descrição de moluscos terrestres: o número de endémicas aumentou para 53, e 19 destas eram restritas a Santa Maria. Posteriormente, o departamento de Bilogia da academia açoriana organizou expedições anuais, de duas a três semanas de duração, abrangendo todas as ilhas, e através das quais foram realizadas extensas e intensas colectas de material, refere ainda o artigo.
As conclusões basearam-se no estudo de cerca de 50 anos de recolhas de moluscos terrestres, que estão depositadas na Colecção de Referência do Departamento de Biologia da Universidade dos Açores (DBUAç-MT). O sumário do artigo explica que “esse enquadramento temporal é usado aqui para investigar alterações na abundância, e eventualmente procurar possíveis causas de variação. A metodologia utilizada durante as várias missões de recolha (procura selectiva de endémicos e recolha manual dos exemplares) não permite tratamento estatístico formal das abundâncias relativas na malacofauna ao longo do tempo. No entanto, ao enviesar o esforço de procura para os endémicos, tal abordagem de recolha evidenciou de modo mais convincente uma tendência para o declínio nos endémicos, de modo acentuado durante os últimos 20 anos.”
O foco nos moluscos endémicos deveu-se à sua suposta menor resiliência à alteração do habitat, “devido a estreita adaptação ao nicho,” quando comparada com as espécies não endémicas, que são maioritariamente introduzidas e propensas a adaptação. A investigação teve foco nas espécies endémicas de Santa Maria, a mais rica em moluscos endémicos.

Alterações climáticas, fragmentação/destruição de habitats e introdução de invasores/predadores colocam moluscos endémicos em risco

Os autores do artigo “Os caracóis endémicos dos Açores estão a desaparecer. De quem é a culpa? “ consideram que “muitos factores podem ser convocados para explicar esta preocupante tendência da diminuição das populações ou desaparecimento de espécies,” mas concentraram-se em três: alterações climáticas; fragmentação de habitat/destruição e introdução de invasores/predadores.
O aumento de temperatura é o factor mais evidente das alterações climáticas, aponta o estudo. “Ainda assim, outros factores meteorológicos concorrentes, nomeadamente, a precipitação e a humidade relativa, influenciam o meio ambiente e os habitats moluscos adaptam-se a eles.”
Por sua vez, a fragmentação e destruição de habitats dos moluscos, nomeadamente através da intensa desflorestação que as ilhas sofreram ao longo de várias décadas, levaram à diminuição ou extinção de várias comunidades e espécies de caracóis, explica o artigo.
Os Açores foram também receptores de várias espécies de plantas invasoras. O estudo dá conta de alterações provocadas por espécies invasoras, que prevaleceram sobre as endémicas, estas que por vezes contribuíam para manter o solo húmido.
Apesar do evidente impacto do aumento de temperaturas nas espécies, o desaparecimento dos caracóis endémicos deve-se, “provavelmente” a uma confluência de factores e “enquanto a associação do aumento de temperatura aos tais declínios e extinções é forte, o aumento da pressão antrópica pode confundir as causas da mudança. Ainda assim, a tendência aqui notada pelas endemias de Santa Maria em ambiente fortemente influenciado pela acção humana, foi detectada em ambientes em estado puro, livres de influência humana direta,” lê-se.
Os investigadores concluíram que não há somente um culpado pela tendência de declínio do número de caracóis endémicos dos Açores. A hipótese mais correcta é a de que a conjugação de todos estes factores tem contribuído para ameaçar os moluscos, potenciando os efeitos uns dos outros e acelerando o ritmo em direcção a um “ponto crítico.”

LIFE SNAILS NAT/PT001377
quer contornar situação
De acordo com os cientistas, trata-se de uma situação muito preocupante e não é possível ser travada fácil e rapidamente. “As alterações climáticas não podem ser travadas num ano ou numa década. Em muitos lugares, já provavelmente chegaram a um limiar de irreversibilidade.” No entanto, referem ainda, pode-se ainda realizar esforços para mitigar o problema.
Neste seguimento, foi implementado o projecto LIFE SNAILS NAT/PT001377, que está agora a funcionar na Reserva do Pico Alto, em Santa Maria. Tem objectivo de reduzir a fragmentação do habitat em áreas de distribuição das espécies endémicas; aumentar a idoneidade do habitat; melhorar a qualidade do habitat; repovoar áreas; e sensibilizar o público para a problemática.
Mariana Rovoredo

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