O Apiário Margaridas permite que os seus visitantes experienciem o que é estar na pele de um verdadeiro apicultor. Para além desta vertente pedagógica e da produção de mel, o projecto pretende preservar e desenvolver a biodiversidade dos Açores, em especial, a floresta Laurissilva. Carolina Ferraz, a criadora do Apiário, explica que as espécies nativas “são interessantes do ponto de vista alimentar para as abelhas” e que estão a ser desenvolvidas experiências para desenvolver um mel diferenciado e que preserva a essência nativa da Região.
Correio dos Açores – Como é que surgiu o gosto pela apicultura e qual a história por detrás do Apiário Margaridas?
Carolina Ferraz – Em 2014 fui desfiada por uma amiga para termos uma colmeia. Confesso que na altura fiquei reticente porque tinha um pouco de medo de abelhas, mas resolvi fazer uma formação de apicultura na Cooperativa Casermel e apaixonei-me, desde logo, por elas. Neste mesmo ano tivemos a nossa primeira colmeia, a qual multiplicamos durante estes anos. Entretanto, a minha amiga foi embora e quando o meu filho nasceu tive de suspender a apicultura porque não conseguia trabalhar sozinha e não tinha disponibilidade para tratar das colmeias.
Foi em 2020 que voltei a perceber que esta era uma paixão que me movia verdadeiramente e que fazia sentido criar um projecto que juntasse a minha paixão pelas abelhas e o meu conhecimento profissional relacionado com a comunicação de ciência. Assim, nasce o Apiário Margaridas, um apiário pedagógico onde pretendemos levar as pessoas a visitar e a ter uma experiência imersiva com as abelhas vestindo a pele de um verdadeiro apicultor. Para além da componente pedagógica, também estamos focados na produção de mel. Mas, este projecto não está apenas ligado à apicultura e também pretende de promover a biodiversidade dos Açores.
Como é que tem sido a evolução do Apiário Margaridas?
Começamos em Janeiro de 2023 com este projecto do apiário pedagógico. Tivemos de preparar o terreno de acordo com a nossa filosofia que tem a ver com plantar espécies nativas, ou seja, recuperar um bosque de espécies nativas. No que diz respeito à produção, neste primeiro ano ainda não tivemos um volume de produção de mel muito grande, até porque estamos a fazer uma experiência no sentido de criar um mel diferenciado.
Abrimos o nosso apiário à visitação e até agora já recebemos perto de 200 pessoas. Em 2023, a maior parte dos visitantes que procurou este tipo de visita foram turistas, mas recebemos também alguns contactos de grupos escolares, mais especificamente de escolas profissionais e, depois, também tivemos contactos de escolas, algumas a que formos dar uma palestra e fazer uma actividade. Outras escolas ficaram de marcar para este ano porque ainda não tínhamos equipamento suficiente para receber crianças. Quando são crianças muito pequeninas, optamos sempre por ir à escola fazer uma actividade porque é um risco muito grande submete-los a esta actividade, principalmente na parte de abrir a colmeia.
A escolha do nome tem algum motivo especial?
Todas as minhas colmeias têm nomes de mulheres. Para além de gostar muito das flores e do próprio nome, a minha primeira colmeia estava instalada na numa quinta chamada Quinta das Margaridas. Então, o nome do apiário é uma homenagem a esta minha primeira colmeia, onde surgiu todo este projecto.
Quantas colmeias tem actualmente? Que outros nomes lhes deu?
Neste momento tenho 35 colmeias e todos os nomes são foram dados em homenagem a mulheres, da minha família e grandes amigas, que foram importantes na minha vida. São Lúcias, Teresas, Elisas, Graças, Mafaldas, Gieselas, Franciscas…
O Apiário Margarida alia a apicultura com a conservação da Natureza. Quer falar um pouco mais sobre esta questão?
Este projecto não inclui apenas a parte da apicultura pois também está apostamos na promoção da biodiversidade dos Açores e, neste momento, estamos a reconverter um antigo pasto num pequeno bosque de espécies Laurissilva, a floresta nativa dos Açores. Isto porque a Laurissilva está muito degradada e nós queremos que seja possível olhar para a paisagem e esta não ser uma monocultura, mas que tenha ainda alguns pequenos bosques e pequenos resquícios destas espécies nativas.
Para além disso, também percebemos que as espécies nativas são interessantes do ponto de vista alimentar para as abelhas. Assim, resolvemos fazer uma experiência onde colocamos uma colmeia na floresta Laurissilva na Serra da Tronqueira, para perceber se as abelhas sobreviviam e usavam as espécies nativas como recurso alimentar. E, depois, perceber quais eram as preferências das abelhas relativamente a estas espécies para as plantarmos nos nossos apiários. Estamos a tentar aumentar e a dar continuidade à biodiversidade dos Açores com as plantas Laurissilva que, depois, agregam um conjunto de outras espécies, como insectos e aves, que estão associadas às florestas.
Quais são as particularidades do mel dos Açores?
Nos Açores produz-se três tipos de mel: o mel de incenso, o mel multifloral e o mel de trevo. No Apiário Margarida optamos por não produzir mel de incenso porque o incenso é uma espécie intrusiva e nós queremos o contrário disso, queremos ter a floresta Laurissilva que é a floresta nativa dos Açores, ou seja, queremos produzir um mel diferenciado com base nas espécies nativas dos Açores, criar um mel com características diferentes daquilo que se produz actualmente cá.
Como descreve a apicultura no quadro da actividade agrícola da Região?
Existem muitos apicultores e apiários na ilha, mas é uma área muito pouco profissionalizada. A maior parte dos apicultores tem a apicultura como um hóbi e penso que é este motivo para não haver grandes investimentos governamentais na apicultura. No entanto, já vejo algumas melhorias, nomeadamente, a ajuda que está a ser dada por colemia aos apicultores. Mas isto são passinhos pequeninos que se vai dando à medida que o sector vai crescendo. Quanto mais apicultores profissionais houver, mais massa crítica vai haver para se investir na apicultura da Região.
Onde é que podemos encontrar o mel das Margaridas?
Ainda não temos o mel disponível no mercado local, apenas vendemos no nosso apiário. Portanto, para obterem o mel basta que nos contactem através das redes sociais e vendemos directamente ao consumidor.
Para além da produção de mel, também fazem visitas guiadas para aqueles que querem vestir a pele de um verdadeiro apicultor. O que é que os interessados podem esperar destas visitas?
Nós recebemos visitas no nosso apiário pedagógico na Lagoa com a duração de uma hora e meia a duas horas. Há um briefing inicial onde se explica um bocadinho sobre a biologia das abelhas, o seu ciclo de vida, o que é que vão encontrar quando abrimos a colmeia, etc. Vestimos o fato de apicultor e, depois, os visitantes são orientados por mim para abrir a colmeia e ver em tempo real tudo aquilo que foi explicado no briefing inicial: têm oportunidade de ver as abelhas a trabalhar; ver a diferença entre o mel já pronto e o mel ainda aberto; como é a organização da colmeia, dos quadros, das larvas, dos ovos das abelhas, ver as diferentes castas etc.
Em parceria com outro negócio local, o Pão com Alma, no final da visita é feita uma degustação de mel com o pão de mel e uma laranjada com limão galego, muito típica dos Açores.
Tem em vista outros projectos para desenvolver a parte pedagógica deste projecto?
Sim. Na verdade, para já estamos muito focados na parte da experiência da apicultura, da abertura das colmeias. Mas, a ideia é que neste apiário pedagógico se façam actividades de descoberta da Laurissilva, de identificação de espécies aquáticas, porque temos também um charco, ou seja, estão a ser desenvolvidos recursos no apiário para fazer actividades pedagógicas, não só da apicultura, mas da biodiversidade em geral. Pretendemos criar um centro de visitantes onde as pessoas possam visitar, ver uma exposição, aprender um bocadinho sobre a parte de extracção do mel, etc. Mas este é um projecto para o futuro.
Tem alguma mensagem que queira partilhar com os nossos leitores?
É muito importante a preservação não só das abelhas, mas de todos os insectos colonizadores. Para poderem estar comprometidos e ajudar na preservação destes insectos, nada melhor que plantar, por exemplo, espécies aromáticas, que eles adoram!
Daniela Canha