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“O turismo não está massificado, está é mal trabalhado” nos Açores, afirma Paulo Bettencourt no Dia Internacional do Guia

Começou por ser guia não certificado devido às diversas línguas que falava, tendo prosseguido à sua certificação. Paulo Bettencourt falou ao Correio dos Açores sobre a dificuldade que era de ser guia e que problemas existem actualmente no turismo.

Correio dos Açores – Qual tem sido o seu percurso profissional?
Paulo Bettencourt (Guia-intérprete) Sou guia-intérprete há cerca de 30 anos, embora durante algum tempo tenha exercido outras actividades. Até 2015/2016 era impossível para um guia exercer esse tipo de actividade e pleno e então trabalhava também em recepção hoteleira. A partir de 2016 entrei em pleno nessa actividade. Sou certificado desde 2007, mas comecei a exercer a actividade um pouco antes, no âmbito de transferes, mas como falava outras línguas difíceis de encontrar no mercado, como o italiano e o francês, por vezes e há uma excepção na legislação regional para que se possa exercer essa actividade não sendo certificado. Foi nesse âmbito que começo a exercer a actividade antes de ser certificado.

O que o levou a ser guia-intérprete?
O que me levou a exercer essa actividade foi o chamamento que senti, uma vez que é uma actividade muito interessante, que nos permite interagir com pessoas de diferentes nacionalidades. À parte dessa interacção há o amor que temos pela nossa terra, pelas nossas ilhas e por querermos passar uma imagem correcta dos Açores. Para passar essa imagem correcta temos que nos debruçar um pouco sobre tudo (história, geologia, botânica). Embora cada guia esteja mais a vontade consoante a sua área, temos de saber um pouco de tudo. O facto de querer passar esta informação fidedigna aos nossos visitantes fez com que me tenha dedicado bastante a esta actividade.

É difícil ser-se guia em São Miguel?
É diferente do que era há 10 anos atrás. Tínhamos muito menos turismo. Por um lado, era muito mais fácil em termos de certificação dos sítios principais, nomeadamente as lagoas e os miradouros principais. Mas, hoje em dia, há muito mais trabalho para todos os guias e é muito mais rápido para todos nós. Embora o trabalho seja difícil e ter que ser regulamentado como foi na Lagoa do Fogo, em que, normalmente, em época alta as viaturas param dos dois lados da montanha e depois o transporte é feito através de shuttles até ao miradouro principal.
Penso que este é um modelo a replicar noutras zonas, mas é o Governo que terá de estruturar isso. Inclusive, a freguesia das Furnas começa a ficar muito sobrecarregada com viaturas de aluguer e seria de pensar já de construir um parque exterior à freguesia e depois transportar as pessoas para o interior da mesma em miniautocarros ou shuttles. O ideal seriam veículos eléctricos uma vez que somos uma Região que se diz sustentável.
Este modelo também deveria ser replicado na Lagoa das Sete Cidades e no miradouro, embora já tenham feito o portão de vento que veio facilitar o acesso mas ainda não é o ideal.
Uma alternativa seria a de desenvolver os transportes públicos, uma vez que pararam no tempo. Já que é dada a facilidade das pessoas subirem em shuttles para a Lagoa do Fogo, os parques de estacionamento deveriam de estar mais abaixo, quer na Lagoa quer na Ribeira Grande, o que permitiria aos turistas que não querem alugar carro ir até ao shuttle de autocarro, uma vez que o sítio onde está o shuttle não é acessível para quem viaja no transporte público. Isto iria permitir o desenvolvimento do turismo nessas zonas.

Existem condições para se aumentar o turismo em São Miguel?
Nós temos condições para aumentar o turismo, temos é de o dispersar mais pela ilha de São Miguel. Temos de criar roteiros alternativos. No caso do turista que vem para fazer percursos pedestres, que há muitos em São Miguel, não se consegue desenvolver uma grande rota na ilha. Já há muitos anos que se vem falando sobre isso porque os trilhos são limitados. Temos trilhos limitados a pequenas rotas, temos pequenos trilhos circulares ou trilhos de apenas 13/14 quilómetros o que condiciona as pessoa que vêm para andar a pé. São Miguel já deveria ter uma grande rota, que já existe em outras ilhas, e se conseguisse isso seria uma grande vitória. É impensável, neste momento, com o turismo que São Miguel tem que ainda não se tenha uma grande rota nos percursos pedestres e depois que não consiga desenvolver percursos alternativos para dispersar um pouco mais o turismo. Há muitas mais coisas para se fazer e para se ver para além dos miradouros tradicionais. Num dia inteiro não se limita tudo ao mesmo percurso. Há que arranjar percursos alternativos de maneira a trazer riqueza a todas as freguesias que existem na ilha de São Miguel. É por isso que passa o turismo, por dispersar a riqueza por todas as freguesias de todas as ilhas.

Acha que o turismo nos Açores está a ser sustentável?
Há ilhas onde o turismo é sustentável. Não é massificado, não existem grandes hotéis, é bem trabalhado, pretendem-se manter mais os hotéis numa perspectiva de hotéis de charme e alojamentos locais. São Miguel ainda pode ir no sentido de turismo sustentável, embora o caminho que se esteja a fazer não seja no sentido desse turismo. Ainda estamos a tempo de fazer essa viragem, mas terá que haver vontade. Temos um POTRA (plano de ornamento turístico) que nunca foi aprovado. Enquanto não for aprovado é impossível de se ter um turismo sustentável.

Na sua opinião, o turismo nos Açores tem apoio suficiente?
Era muito importante dispersar o turismo. Por exemplo agora não temos turismo, não trabalhamos o turismo de época baixa, o que é péssimo. O que defendemos é que o turismo seja trabalhado ao longo do ano. Regra geral, os Açores têm um clima bastante ameno e apelativo para povos do norte da Europa, da Alemanha e França. Os Açores não são bem trabalhados na época baixa. Devíamos dispersar mais o turismo e não concentra-lo todo numa época do ano. Também devíamos dispersar mais para outras ilhas. Santa Maria, Graciosa e São Jorge poderiam ser ilhas onde se podia expressar mais o turismo. Há parte disso tínhamos que trabalhar bastante o turismo de época baixa. Este ano foi até Setembro, mas são muitos meses em que não temos turismo. Depois vão concentrar todos os voos na mesma altura do ano, a partir de Junho a Setembro, em que deveria ser fomentado o voo de várias companhias durante o Inverno também. Não temos uma massificação, temos é o turismo mal trabalhado. Os grandes números que são anunciados pelo Governo vêm em 6/7 meses no ano e no resto não temos muito turismo.

Faz visitas em todas as ilhas?
Faço em algumas ilhas. Como falo francês e existem grupos que pedem acompanhamento durante todo o programa, costumo a ir a outras ilhas.

Que sítios costuma visitar mais?
Normalmente temos que seguir o que está delineado pelas agências de viagens e pelos operadores. Eles têm sempre alguns sítios tradicionais. Àparte disso, quando está no percurso tento ir a alguns sítios, nomeadamente a Oficina Museu e o Pedras Negras nas Capelas, a Bretanha, o Moinho da Tia Saleira, que é a sede da associação de guias, na Fajã de Cima, quando fazemos o percurso inteiro das Sete Cidades. À parte das estufas de ananás tento visitar a Igreja de Nossa Senhora dos Anjos.
Quando visitamos Vila Franca, tento fazer algum desvio. Para além de visitar o centro de Vila Franca, vamos às Olarias que é um sítio que é muito importante e que está muito ligado à nossa história.

Quer deixar alguma mensagem a quem nos visita?
Que venham não só em época alta, mas que venham em época baixa. Temos um clima muito bom, os preços são mais apelativos e podem visitar todos os locais de todas as ilhas com mais calma e presenciar o verdadeiro espírito açoriano: de bem receber e receber com tranquilidade e calma.

Frederico Figueiredo
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