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Depois de quase 10 anos a ser planeado, hotel Nine Dots, abre portas numa casa senhorial da época da laranja na Rua dos Mercadores

O hotel (de 36 quartos e 4 estrelas) demorou cerca de 10 anos a ser construído. Porque levou tanto tempo?
Catarina Simão (Administradora) – A ser construído não; o que levou mais ou menos 10 anos foi o planeamento deste hotel.
Começou primeiro com uma ideia de termos um projecto na área do turismo, e também pela nossa ligação natural aos Açores, uma vez que a família do Tiago é natural de cá.
Começamos a ver que haviam possibilidades em Ponta Delgada e encontramos este edifício, quase por coincidência, quando viemos cá num Natal. O primeiro passo foi adquirir o edifício, que continha muitos pormenores arquitectónicos interessantes que nos agradavam, uma vez que era uma antiga casa senhorial. Já tínhamos falado com amigos nossos, que são arquitectos, e eles também ficaram entusiasmados com a ideia.
Depois de adquirirmos o edifício, notamos que não tinha a dimensão adequada nem para um alojamento local nem para ser um hotel. Isto fez-nos repensar o projecto e como o poderíamos adaptar para fazer mais sentido. Nessa altura, surgiu a oportunidade de adquirir o edifício ao lado, que pertencia, na altura, à Fábrica da Igreja Paroquial de São Sebastião. Esse processo todo demorou alguns meses e aí, sim, ganhamos a escala e a dimensão que precisávamos para fazer algo à imagem do que pretendíamos. Depois disto, concorremos ao programa de incentivos ‘Competir +’ e, simultaneamente, fomos sempre fazendo o projecto de arquitectura, o que também demorou algum tempo.
A parte da construção propriamente dita só começou em Agosto de 2021. O projecto é que começou a ser pensado e a ganhar forma em 2016. Falando ainda da parte da construção, demorou mais do que o que estava inicialmente previsto pois, devido à localização do edifício e pelas suas características, toda a fase de demolição e de contenção teve que ser muito bem planeada e ser feita quase a braço. Não foi possível colocar grua nem maquinaria pesada pela delicadeza dos trabalhos que tinham que ser desenvolvidos, o que acabou por atrasar os trabalhos, mais do que o que desejamos inicialmente.
Felizmente, estamos aqui, estamos muito contentes com o resultado final porque ficou muito à imagem do que era o projecto, que foi sendo trabalho durante este tempo todo. Este tempo permitiu-nos aperfeiçoar muitos pormenores que hoje vemos espelhados no edifício.

A falta de mão-de-obra foi um problema com que tiveram de lidar?
Catarina Simão – Tivemos, claro. A construção iniciou-se em plena pandemia. Então, além de todas as questões da demolição e da contenção, também tivemos um problema de mão-de-obra, naturalmente, e das restrições que haviam no trabalho nesta altura. Há poucas empresas com capacidade para executar uma obra desta natureza. Escolhemos o Grupo Marques especialmente por causa disso, porque é uma empresa local, porque está habituada a lidar com construção em Ponta Delgada e nos Açores. Mas, evidentemente, que a falta de mão-de-obra foi uma das causas para ter demorado mais tempo.

O nome Nine Dots tem algum significado especial?
Catarina Simão – Tem (risos). Primeiro pela ligação natural aos Açores: Nine Dots, nove pontos no oceano, nove ilhas dos Açores. Depois, porque, desde a sua génese, que este projecto está ligado à arte e à cultura açoriana. Como existe a técnica de pintura chamada pontilhismo, pintar por pontos, conseguimos unir os dois conceitos: de ser um hotel nos Açores e de ser ligado à arte.
Tiago Saraiva (Administrador) – E, depois, por este conceito geográfico: são nove pontos no meio do oceano que queremos que mais pessoas venham a descobrir porque, de facto, os Açores são incríveis. As nove ilhas apresentam várias valências e são muito diferentes entre si e todas elas complementares. Neste espaço, queremos também mostrar um pouco de cada ilha. Temos artistas de várias ilhas e tentamos ser uns pequenos Açores nesta vertente cultural, nesta vertente menos conhecida mas com muito valor que os Açores também trazem.

Tencionam fazer exposições com artistas locais?
Tiago Saraiva – Nós sabemos, à partida, que existem artistas açorianos fantásticos. Ao longo destes quase 10 anos tivemos o cuidado de ir construindo a colecção de arte do Nine Dots. Até agora, o nosso foco foi muito orientado para artistas mais antigos, que já faleceram. Foi muito um trabalho de pesquisa e quase pesca à linha para encontrar trabalhos destes artistas. Agora, com o hotel aberto, a nossa missão muda drasticamente. A ideia é estarmos virados para o espaço contemporâneo, para os novos artistas e fazer residências artísticas. Temos um espaço para fazer exposições temporárias onde vamos estar abertos a trabalhar e promover artistas. O hotel também possuiu espaços de alimentação onde poderemos fazer sessões de apresentações de livros e divulgação de outro tipo de arte. Tentamos abrir o espaço para a comunidade e ser um espaço de divulgação e de promoção.

Que expectativas tem em termos de afluência para a época alta?
Catarina Simão – Acreditamos que temos um produto com valor e distinto do que existe na ilha e, sobretudo, em Ponta Delgada. Achamos que isto vai atrair turismo, na parte do alojamento. O restaurante está aberto a toda a gente, turistas e locais.
Em relação ao alojamento, a nossa expectativa é ter uma taxa de ocupação razoável nesta época. Agora mais do que encher o hotel, que é um dos objectivos, queremos abrir bem. Queremos abrir com qualidade, com um nível de serviço que esteja adequado ao que queremos oferecer e destacarmo-nos pela positiva.
Tiago Saraiva – Temos um produto inovador. Para os Açores sem dúvida, mas mesmo à escala nacional temos um produto inovador. E este produto adequa-se ao que vimos na BTL da Visit Açores. Nós queremos ter um hotel que funciona todo o ano, que funciona com um restaurante e zona wellness que está aberta à comunidade. O conceito do restaurante não é o típico restaurante de hotel. É uma cozinha internacional e acessível. Não é um restaurante pretensioso. É um hotel na categoria lifestyle onde, no fundo, tentamos promover uma identidade e cultura muito própria. Achamos que é um conceito que vai encaixar bem na oferta.

Muitos trabalhadores de hotelaria falam das condições precárias do trabalho. Houve alguma dificuldade em fazer o recrutamento de trabalhadores?
Catarina Simão – Começamos a fazer recrutamento fora da época alta, o que facilitou o processo. Mas este era um dos nossos receios, que houvesse dificuldade em encontrar trabalhadores. Felizmente não tivemos esta experiência. Temos uma equipa muito coesa, que começa a trabalhar na abertura do hotel. São pessoas que andaram a montar os espaços e que vestiram a camisola, como se costuma dizer. Sabemos que este é um sector onde o trabalho é precário e gostávamos de fazer diferente. Se o vamos fazer, esperemos que sim, temos esse objectivo. A fase de abertura é uma fase muito exigente. O nosso primeiro objectivo é gerir os turnos para que a vida pessoal dos nossos trabalhadores seja respeitada. Queremos que as pessoas se sintam bem e que queiram manter-se connosco. Nós damos essas condições. Sabemos que há uma grande rotatividade neste sector, mas queremos fixar uma equipa que, de facto, se identifique com este hotel e com a nossa maneira de trabalhar e que permaneça connosco. Vamos fazer esforços nesse sentido.

Como define a sustentabilidade do hotel?
Paulo Araújo (Hotel Manager) – Mais do que a sustentabilidade inerente ao edifício, à parte energética e à gestão de resíduos, é um projecto que tem uma ligação à Região. O destino já por si merece que os projectos tenham este olhar mais aprofundado sobre a sustentabilidade do mesmo. Nós temos um conjunto de factores que juntamos desde o nascer do projecto, que é o Go Beyond.
A nível de sustentabilidade energética, temos um sistema de controlo que nos permite ter um olhar analítico sobre o consumo. Temos aproveitamento de água da chuva, temos os painéis solares. Temos uma boa certificação energética e temos um olhar para investimentos futuros nessa área.
Quanto à sustentabilidade e à aproximação da comunidade local, temos um apoio muito grande. As mesas do bar foram feitas por instituições locais e estamos sempre atentos para as propostas que venham acrescentar valor para que possamos contribuir na Região.
Catarina Simão – Desde a fase de construção que a nossa perspectiva sempre foi a de procurar primeiro localmente. Senão for possível, então procuramos a nível nacional e só em último caso internacionalmente. Temos noção que a pegada ecológica no transporte de matérias é grande. E temos a mesma visão agora no que toca à operação. O Go Beyond, para além da responsabilidade ambiental, também tem uma responsabilidade social. Temos alguns projectos que vão neste sentido, como por exemplo o projecto ‘Mãos que criam’, que é uma parceria que fizemos com a Casa de Saúde de São Miguel. É um projecto de cerâmica, onde a loiça foi feita especificamente para nós. Este projecto pretende ocupar pessoas que estão na Casa de Saúde de São Miguel, nas várias fases do processo produtivo. A qualidade dos produtos é extraordinária. Fica ao nível de qualquer outra empresa de produtos cerâmicos nacional. Assim, ao mesmo tempo estamos a ter esta vertente social e de ligação com a comunidade. Temos também uma parceria com a Musa, que faz o aproveitamento da planta da bananeira. Temos alguns produtos, nomeadamente cestas, que estão nos quartos e que são feitos de planta da bananeira. Eles têm um projecto muito interessante, porque conseguem aproveitar desde o centro do caule até à casca da banana em várias utilizações.
Não é só falar em sustentabilidade como bandeira mas, de facto, procuramos nas nossas acções fazer valer esses valores.
Tiago Saraiva – Mesmo na modernização do edifício, já que é uma construção nova do ponto de vista prático, houve uma série de materiais que foram reaproveitados. As pedras, que não se adequavam numa estrutura de betão armado como são os pisos de cima, foram aproveitadas nos jardins, na zona de spa, para fazer o balcão da recepção ou as mesas do bar. Tivemos o cuidado de reaproveitar e reutilizar o máximo que podemos das muitas coisas de valor que existiam nos edifícios pré-existentes e que tiveram que ser modernizados, obviamente, para uma operação deste tipo. Estamos muito contentes com esta combinação que conseguimos fazer entre o moderno e o antigo juntamente com o equilíbrio do ponto de vista do aproveitamento.

Que percentagem da sua equipa é natural dos Açores?
Catarina Simão – Entre 80 e 90%. Algumas pessoas já cá estavam há vários anos. Não são originárias dos Açores mas já cá estão há muitos anos portanto é como se fossem. Mas a grande maioria da equipa é originária de cá.

O que distingue o Nine Dots dos outros hotéis?
Tiago Saraiva – Desde logo, é um hotel independente. Não temos que nos reger por nenhum padrão de marca internacional. É um hotel de base açoriana, uma vez que era uma casa senhorial que era utilizada na época da laranja. Reaproveitamos toda esta cultura que havia na época. É uma construção nova mas dentro de edifícios pré-existentes em que se vê muito dessa arquitectura. As escadas de pedra originais, o trabalho da pedra de basalto trabalhada nas suas várias formas, as madeiras trabalhadas e por isso temos uma série de elementos mesmo únicos.
Catarina Simão – Mesmo a decoração foi feita tendo isto em mente. Foi feito um estudo do que foram as culturas açorianas dos últimos séculos, quais são as cores que estão associadas a essas culturas e isto está espelhado na decoração do hotel. A cor das paredes, a cor dos estofos e os materiais que são usados têm muito isso. Dão um certo conforto pela harmonia dos tons, mas é mais do que isso. Vai mais além.
É o tal resultado destes anos todos de trabalho. Deu para articular as várias peças. Somos um hotel que combina, um bocadinho, o conceito de alojamento local, de proximidade e contacto com o hóspede com o conforto de um hotel que tem um spa, um restaurante e serviço de quartos. Temos aqui um bocadinho desta proximidade de um hotel lifesytle. Não é um hotel que pretende ser de luxo, não pretende ser demasiado ostensivo mas que, na realidade, prima pelo conforto, pelo serviço, pela proximidade e pela ligação ao mundo onde estamos e à realidade local.

Diria que tanto podem receber o hóspede mais familiar como o hóspede de mochila às costas?
Tiago Saraiva – Sim, e o facto de estarmos no centro da cidade abre esta possibilidade. O hóspede pode conhecer a cidade de outra maneira. Não tem a necessidade de alugar um carro, visto que estamos perto das actividades de animação turística. Podem, perfeitamente, contratar serviços de animação turística tanto no mar como na terra, já que existe uma oferta interessante para descobrir, e também estamos perto dos serviços de transportes. Também temos o serviço de bicicletas do hotel que permitem aos hóspedes explorar a ilha de bicicleta. Abrimos o leque de possibilidades, sempre com essa proximidade de ter as pessoas da recepção atentas às necessidades específicas de cada hóspede para poder, no fundo, encaminhar naquilo que será a melhor experiência possível dos Açores. A localização dá-nos esta vantagem.

Frederico Figueiredo

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