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“A cor é uma característica na minha vida”,afirma Zaida Ponte, que abriu uma página no Facebook para divulgar as suas obras

Natural da freguesia da Salga, município do Nordeste, Zaida Ponte, de 67 anos, é uma professora aposentada que sempre teve um gosto pela arte, mais concretamente, pela pintura, sendo que as principais bases utilizadas são a tela e a porcelana. Em entrevista ao Correio dos Açores, explica como consegue agarrar em qualquer objecto e transformar em algo diferente, como surge a inspiração para começar as suas obras, sempre afirmando que é uma ‘autodidacta’.

Correio dos Açores – Como surgiu o gosto pela arte?
Zaida Ponte – Desde criança. Para mim, a cor é uma característica na minha vida. Eu gosto de ver cor na vida, na pintura, no nosso dia-a-dia e em tudo. Aliás, na minha família, houve sempre pessoas relacionadas com a arte, nas mais diversas maneiras. Por exemplo, a minha avó era uma artista a bordar, a minha mãe pintava diversos materiais como garrafas, vidros, pratos, entre outros. Inclusivamente, tenho uma tia que foi artista plástica com uma galeria de arte no estrangeiro. Na adolescência, o gosto intensificou-se, com uns trabalhos como pintura no Liceu (Escola Secundária Antero Quental), onde pintávamos vários objectos, como pedras e sacos. A experiência a valer foi na Academia das Artes, em Ponta Delgada. Nessa altura, eu já era casada, na década de 80, e comecei a gostar mais, intensificando-se o ‘bichinho’. Tive aulas lá durante vários anos, onde tive aulas com a Dona Liliana Lopes e artistas convidados, nomeadamente, o Sr. Soares Branco e artistas estrangeiros. A Academia das Artes foi a minha grande rampa de lançamento.

Quem são as suas inspirações nesta área? E quem são os seus ídolos?
Na minha opinião, tu serve para a pessoa se inspirar. Quer seja um dia bom, quer seja um dia mau, quer seja a flor, quer seja a pedra, quer seja o céu. Mas o mais importante é ter a vontade. Quanto aos ídolos, há vários nomes fantásticos. Posso-lhe dizer que Vincent Van Gogh e Oscar-Claude Monet, dois dos principais impressionistas, são nomes que nem conseguimos adjectivar devido à sua influência nas artes. Os principais pintores impressionistas são sempre inspiradores, quer seja na cor, quer seja na poesia transmitida nas suas obras. Eu não digo que sou uma pessoa inspirada em apenas uma coisa, tudo serve de ponto de partida.

Como é o seu processo criativo? Quanto tempo demora a fazer as suas obras?
Posso ser rápida, tal como posso lenta. Tenho umas obras paradas no ateliê que vejo todos os dias e noto sempre algo que está bem ou mal – tenho algum receio em acabar. No entanto, não pretendo a perfeição. Eu acho que pretender a perfeição é algo muito pretensiosa. Quando alguém pensa que atinge a perfeição, acaba por ficar estagnado, visto que pensa ‘já que sou perfeito, não tenho mais nada para aprender’. Eu tenho muitas imperfeições, que gosto de tentar resolve-las. Há duas obras que comecei, numa certa época da minha vida, e não acabei, deixando uma marca, sendo que não consigo ir além (acabar a obra).

As suas obras são de que estilo de arte?
Qualquer suporte me serve. Os básicos são a tela e a porcelana. Eu consigo agarrar em qualquer objecto e transformar. Eu pinto os troncos das árvores do quintal, também as pedras que estão lá. Tudo me serve. Aqui, em casa, também já pintei os pratos, os vasos, os candeeiros, as velas, as caixas de onde o meu marido colecciona as suas conchas do mar, o banco do meu neto e, ainda, uma peça que a minha avó me ofereceu. Eu gosto de transformar as coisas, de lhes dar cor e vida.

Os seus trabalhos já estiveram expostos em que espaços?
Os meus trabalhos já passaram por várias exposições aqui na ilha, tal como no Convento Franciscano da Lagoa, no Museu Vivo do Franciscano da Ribeira Grande, no Museu Casa do Arcano da Ribeira Grande, no Museu Municipal da Ribeira Grande, no Centro de Cultura de Ponta Delgada, no Centro de Cultura da Maia, também já tive na Vila Franca do Campo, na Galeria de Arte do SolMar de São Gonçalo e, ainda, uma exposição nas Portas do Mar. As minhas obras ainda não foram expostas nas outras ilhas do arquipélago. Tenho obras que já foram vendidas para Portugal continental.

Como surgiu o ateliê?
Quando se tem o ‘bichinho’ de pintar, está sempre a criar. Eu não sou capaz de passar um dia sem ir para o ateliê. Em muitas ocasiões, nem pinto, mas acabo por preparar tintas, leio e faço pesquisas. Eu já não sou nova, tenho vários anos de muitos trabalhos feitos. Há vários trabalhos que são oferecidos, outros que são vendidos e outros que acabam por ficar aqui em casa. Já perdi a conta com a quantidade de obras que já fiz. Esta é a minha vida, é a minha essência. E tem piada, visto que, hoje em dia, é tudo muito limpo e minimalista. As pessoas quando entram em casa, tem sempre a preocupação de como se limpa a casa. Nós, a minha família, não temos essa preocupação. Gostamos desta cor, alegria. É o nosso mundo e a nossa vida.

Já tentou criar obras sem ser de pintura?
Eu já fiz um workshop de modelagem em barro, eu gosto, mas não é para seguir. Eu gosto de mexer no barro e de sujar as minhas mãos. Mas não tenho grande apetência para isso. Agora, eu gosto de tudo o que é pintura. Procuro sempre evoluir e de ganhar mais conhecimentos. Assim que me aposentei, fui logo para Londres, onde fiquei três meses numa universidade a fazer cursos de pintura. Foi uma experiência engraçada, visto que conheci várias pessoas de diversos países e de outras mentalidades. Aprendi muito. Na área da porcelana, também procuro evoluir. Eu já fiz pequenos cursos com artistas de renome na área de pintura de rosto em porcelana, os espatulados em porcelana. Não sou nenhuma profissional, mas sim uma autodidata. Procuro aperfeiçoar-me com as oportunidades que aparecem. Falo por mim, é difícil de ficarmos satisfeitos connosco próprios, visto que há sempre uma ânsia de querer melhor e de fazer diferente.

Todos os quadros vendidos foram obras com inspirações suas, ou foram pedidos para fazer um certo quadro?
Há das duas maneiras. Quando me pedem obras com muitos entraves, muitos condicionalismos, eu digo muitas vezes que não. Há exemplos como ‘o condicionalismo da cor tem de dizer com algo’, isso acaba por cortar a nossa liberdade. De um modo geral, as pessoas que gostam de ter obras em casa, não costumam colocar condições.

Seguiu uma licenciatura nesta área?
Fui formada na área da educação. Eu sempre fui professora. Agora, como professora, atendendo que era uma área de que eu gostava, eu tive sempre muito ligada às artes. Quer seja leccionando turmas, eu direccionava sempre as minhas aulas através da arte. Estive durante uns vários largos, requisitada pela Direcção Regional de Educação na altura, como professora de artes, portanto a minha missão e de mais duas colegas era ir pelas escolas do Grupo Oriental dos Açores (a Ilha de São Miguel e a Ilha de Santa Maria), onde fazíamos formação e apoio aos professores com maiores dificuldades nessa área. Isso foi um trabalho me agradou muito. Eu fui professora do 1.º ciclo, mas acabei por dar aulas ao 2.º ciclo e fiz formação a vários jovens. Uma vida de 34 anos de serviço dá para fazer várias coisas. Quando comecei a frequentar a Academia das Artes, ainda era professora, e foi lá onde encontrei a minha primeira mestre na porcelana, a Dona Ugolina Ferreira, na pintura de alto fogo, também é uma grande senhora e pintora. Exerci a profissão de professora com bastante entusiasmo, sempre.

As entidades regionais dão valor aos artistas açorianos? Ou deveria haver um maior investimento?
Sinceramente, acredito que as coisas estão muito diferentes, mas para melhor. Neste momento, há muita gente nova licenciada em áreas da arte desde a escultura, a pintura, entre outros cursos. Esta geração está muito bem formada. Há muitos artistas novos muito bons. Pelas exposições que eu, normalmente, vou ver, acredito que já há um certo apoio e interesse das entidades, como, por exemplo, os museus. Na área da cultura, acredito que nós, açorianos, estamos muito dinâmicos.

Como tem sido ministrar workshop em casa?
É deveras entusiasmante. As pessoas aparecem porque gostam. Na altura, quando me aposentei, comecei a fazer estes workshops e disseram para dar aulas às crianças. No entanto, não queria fazer a mesmo e comecei a apostar num grupo adulto, sendo que neste momento tenho um grupo de senhoras. Não há aquele compromisso rígido de aparecer. Gosto da convivência entre todas nós, das descobertas, das pinturas e do intercâmbio de experiências.

Quais são os planos para o futuro? Planeia fazer parte de mais exposições?
Sempre que sou solicitada para participar em exposições, adiro sempre, excepto quando não consigo mesmo. Vou continuar a pintar, visto que já faz parte do meu dia-a-dia e da minha maneira de ser.

Tem algo mais a acrescentar que considere relevante no âmbito desta entrevista?
Os artistas açorianos, hoje em dia, são pessoas muito bem formadas e com muita qualidade. Acredito que as pessoas devem sentir livre dentro de aquilo que gostam de fazer e na sua área.

Filipe Torres
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