Quando se atinge o essencial do homem, pouco importa o modo de vida; os costumes, os problemas práticos mudam mas os problemas fundamentais permanecem
Quem sou eu?
Quem me pôs aqui?
Para fazer o quê?
Sou amado?
O que é esta misteriosa atração da mulher pelo homem?
Passados vinte séculos a Igreja ainda tenta responder a estas questões sobre o sentido, o amor, a vida;
Infelizmente, fá-lo com palavras que não atingem as pessoas porque estas não as encontram no coração da sua vida.
Mas a verdade é que eu próprio nos meus escritos e outros em tantas palestras, encontros, proclamam grandes princípios dirigidos a pessoas que caminham penosamente pelos atalhos da existência, vivendo vidas de sereno desespero.
Hoje em dia impera a superficialidade, a tirania das modas, as pessoas estão sozinhas no meio de tanta gente; as pessoas têm breves encontros e nada mais.
Existe pouca massa crítica, isto é mestres espirituais, pedagogos que vivam aquilo que pregam.
Para formar o bicho homem é preciso tempo, tempo que falta para pensar.
Acresce que o património afetivo e ético-normativo só pode ser transmitido através da convivência prolongada entre gerações, entre pais e filhos como fazia Platão na Grécia Antiga.
Quando eu era menino e moço na freguesia dos Ginetes minha terra natal não havia mobilidade interf reguesias, o único automóvel que havia era o do senhor padre Evaristo e que só pegava de empurrão por robustos mancebos e um camponês vivia com a sua família na mesma casa desde o berço até à morte.
Em contrapartida eu, advogados, juízes engenheiros mudam de casa e de terra várias vezes na vida.
Eu próprio desde os tempos de estudante de ESTUDANTE de Coimbra já corri Seca e Meca apanhando a cinza correspondente.
O DESENRAIZAMENTO é total porque as raízes só se aprofundam com o tempo.
A juventude de hoje leva uma vida dispersiva num mundo podre e caótico, sem rei nem roque, nada sabendo acerca do percurso de vida dos seus pais e avós.
Eu já escrevi livros e artigos em catadupa e a minha filha e os meus sobrinhos não leram nenhum; pura e simplesmente não se interessam.
Falta nos corações a dimensão religiosa da vida, por isso há tanta sede espiritual, essa sede de água fresca que brota da nascente da vida.
DESDE QUE A CULTURA OCIDENTAL MATOU DEUS, os seres humanos vivem na mais completa absurdidade e eu não vislumbro saída para a condição humana uma vez que a morte não é verdadeiramente uma saída.
Esta terra dos homens hoje é uma terra de crueldade e violência, de uma terra doente.
Grosso modo todas as épocas da historia tiveram as sua doenças típicas,
A violência hoje é sobretudo neuronal.
O SINDROME referido pelo conhecido escritor coreano Byung-ChuelHan, DESGASTE PROFISSIONAL, define o panorama atual.
Ora a vida espiritual da humanidade só é possível quando existe uma atenção profunda;
Ora a atenção profunda tende cada vez mais a ser suplantada por um tipo de atenção completamente diferente, que é uma atenção dispersa, que se caracteriza por uma mudança súbita dos focos de atenção, pela alternância das fontes de informação.
É urgente no Ocidente uma pedagogia da visão.
NIITSCHE, no seu livro o crepúsculo dos deuses que faltam educadores para ensinar basicamente três coisas:
Ensinar a ver, ensinar a falar e ensinar a escrever.
O aprender a ver seria o primeiro estádiopreparatório da espiritualidade.
O conto de Melville é a esse respeito bastante esclarecedor, elencando um conjunto de doenças nervosas e psicossomáticas provocadas pela sociedade da agitação e da pressa, do stresse cronico ou cansaço crónico.
Mudando radicalmente de assunto,
Vítor Serpa, conta no Jornal A BOLA, do qual é preclaro diretor que António Lobo Antunes, conhecido e aclamado escritor lhe terá dito que “a chatice de um gajo ser velho é que fica com mais mortos no sangue do que glóbulos”.
Como disse egregiamente a poetisa sofia de Melo Breyner “cortaram os trigos, agora a minha solidão vê-se melhor!
Lembra-te o homem que és pó e que ao pó hás-de voltar.
Vale de Josefat, terra por onde correm rios de lágrimas
Dores que vão na enxurrada que o tempo leva.
Homens que vão aos trambolhões na corrente
Lástimas permanentes, almas mutiladas, almas cativas, sonhos e amores perdidos, queixas, alegria breve, a injúria dos tempos, a injustiça e maldade; os interesses mesquinhos que põem os homens contra o homem; um dia atrás de outro dia e sempre o mesmo clamor, a mesma angústia, o medo, a ignorância.
Um irmão que cai, uma mão que se fecha, uma porta que nunca se abre, a mão que não chega, a luz, a noite e o luto nas almas, a loucura e tudo esvaido desfeito em bruma.
Oiço o ruido cada vez mais forte, as figuras gastas, o sonho puído, o grotesco.
O vento que bate a chuva que cai o orvalho na flor, a terra molhada de lágrimas e de beleza, a árvore que me espante e que esconde e exprime o mistério de tudo quanto existe.
Tudo aparece e tudo desaparece
Só não morre a Primavera,
Pedro Paulo Carvalho Silva