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“Um dos projectos que quero concretizar é o de levar ioga aos lares de idosos dos Açores”

Neuza Duarte começou a praticar ioga para melhorar a sua respiração, mas foram as circunstâncias da pandemia que a levaram a querer ensinar esta prática milenar. Nesta entrevista, destaca os benefícios do ioga para a mobilidade e saúde mental em vários estágios da vida, como a gravidez e a velhice. Neste momento, está a finalizar o curso de especialista em exercício físico, que a capacita a oferecer um acompanhamento diferenciado e avançar com um projecto destinado a introduzir ioga em lares de idosos.

Correio dos Açores – O que levou a praticar ioga e a tornar-se professora? Houve alguma experiência ou momento específico que influenciou essa decisão?
Neuza Duarte – Comecei a praticar ioga há cerca de sete anos pelo simples facto de perceber que não conseguia controlar a minha respiração. Pois, já fazia exercício físico e, de certa forma, isso comprometia a minha actividade pois não conseguia atingir alguns exercícios. Então, comecei a praticar ioga num ginásio e a professora Raquel encantou-me. Acredito quem ensina também influencia muito a experiência.
Entretanto, veio a Covid e fiquei teletrabalho no callcenter da NOS. Senti a pandemia como uma altura muito pesada e o facto de as aulas de ioga terem parado acabou por me afectar muito. Então, comecei a praticar em casa e acabei por gostar. O facto de me poder colocar no tapete e eu fazer eu própria a minha sequência, fez-me sentir muito bem. Entretanto, mesmo no contexto da pandemia comecei a procurar cursos de ioga e acabei por tirar o curso online da escola YogaPro, com a duração de um ano. Devido à pandemia, o curso foi quase todo online, mas fui Lisboa duas vezes para finalizar a parte prática.
Depois do curso, comecei logo a dar aulas por iniciativa própria. Ou seja, aluguei espaço e também dei muitas aulas ao ar livre de forma a aproveitar o ambiente maravilho da nossa ilha. Criei uma turma e, felizmente, mantenho quase todas as alunas até hoje. Dei aulas em alguns ginásios e também comecei a criar alguns eventos relacionados com energia, em especial energia feminina.
Este ano, também tirei o curso de Especialista em Exercício Físico na Fitness Academy, uma escola do continente que há cerca de cinco anos faz este curso em São Miguel. Como fui mãe recentemente, falta-me completar o estágio, o que acontecerá ainda este Verão. Para mim, este curso foi uma forma de adquirir mais conhecimento a nível físico, ou seja, perceber melhor como funciona o corpo humano para poder ajudar ao nível de acompanhamento personalizado.

Que outras práticas associa ao io-ga?
Principalmente a meditação pois acredito que o ioga não é só a prática no tapete. Para mim, o ioga passa por acordamos e termos controlo sobre os nossos pensamentos, conseguir organizar o nosso dia e conectarmo-nos connosco próprios. A partir daí, claro, a meditação está interligada com o ioga, ou seja, mesmo que não envolva a parte física, se a pessoa está a fazer meditação, para mim está a praticar ioga.
Em relação aos retiros de energia feminina, posso começar por dizer que acredito que todas as pessoas têm a energia feminina e masculina, mas o que muitas vezes acontece é que estas duas energias se encontram um bocadinho desequilibradas. Actualmente, as mulheres têm a tendência de estar com a energia masculina mais activa porque o mundo à nossa volta pediu-nos isso. Assim, trabalhamos a energia feminina muito no sentido de voltar a ouvir o instinto natural, de voltar à calma e paz pois muito daquilo que precisamos de saber já está dentro de nós. Por exemplo, como recém-mãe senti que que existe tanta informação e tanta opinião à nossa volta que se torna difícil encontrar o nosso instinto maternal. Mas, a verdade é que o bebé precisa da mãe que tem e daquilo que ela sabe por instinto.
Os últimos retiros que fizemos foram na praia e normalmente junto outras pessoas que trabalham nestas áreas. Por exemplo, uma vez juntei o Luís Senra, que trabalha com cristais e a Carolina Portugal, que também trabalha com energia feminina. Tanto no ioga como nos retiros, tento trazer momentos para parar e respirar fundo. Com a rotina complicada que algumas mulheres têm — com filhos, casa e trabalho —, por vezes é difícil sequer pensar em voltar a si própria. A minha mãe, por exemplo, nunca pensou em parar para respirar e só aos 50 anos, quando eu comecei a praticar ioga, é que ela começou a abrandar. É esta a atenção que gostava de trazer às mulheres: tudo bem que tiveste de assumir esse papel, mas não te esqueças daquilo que está dentro de ti. A nossa energia feminina activa-se quando estamos em descanso, num momento de pausa e paz.

Baseado na sua experiência, quais são os principais benefícios físicos e mentais de manter uma prática regular de yoga?
Em relação à parte mental, um dos maiores benefícios é o controlo tanto a nível de pensamento interno, como aquilo queremos exteriorizar. É possível adquirir este controlo através da meditação, pois a partir do momento em que conseguimos controlar a nossa respiração e em conexão connosco próprios, activamos o nosso consciente para o resto do nosso dia, o que vai interferir com os nossos pensamentos e acções de forma positiva. Uma vez que a mente comanda tudo o resto, melhores pensamentos vão melhorar a nossa saúde de modo geral.
A nível físico, ganhamos força muscular e mobilidade. O ioga tem muitos movimentos funcionais que fazem com que o nosso corpo se prepare para a velhice. Aqueles movimentos que tomamos por adquiridos, como o alcançar, baixar, etc., mas que infelizmente vamos perdendo ao longo da vida. E o ioga faz com que as pessoas continuem a ser independentes a nível motor mesmo na velhice.

Há algum estilo particular de ioga que prefere ensinar?
Sim, existe vários tipos de ioga, e a nível ocidental já criaram muitos mais. Já a nível da Índia, temos o ‘Hatha Yoga’, que é o que pratico e que contrasta um pouco com o ‘Ashtanga’, por exemplo, que é uma prática, diria eu, mais exigente pois tem por base uma lista de posturas fixa e só é possível passar à seguinte quando a pessoa já domina a anterior. A ‘Hatha Yoga’ está mais ligada à correcção de postura e à aquisição de mobilidade. E também engloba a parte espiritual, em todas as aulas fazemos a meditação espiritual. Ou seja, em comparação à ‘Ashtanga’, é uma prática mais livre.
Para além disso, também temos o ‘Yin Yoga’, que trabalha muito mais a mente e o espírito do que propriamente a força física e mobilidade. É uma prática muito mais calma, onde a pessoa se obriga a estar em conexão consigo própria e a acalmar o coração. Acontece que muitas pessoas têm mais dificuldade com o ‘Yin Yoga’ do que numa prática que trabalhe mais a parte física. Isto acontece devido à necessidade de aqui ter mesmo de parar e desacelerar e, pelo menos para as minhas alunas, esta prática tende a ser mais difícil.

Quantos alunos tem e onde acontecem as suas aulas actualmente? Como podem os interessados se inscrever ou saber mais?
Em média, tenho à volta de 10 pessoas por aula. Mas este número varia pois tenho muitas alunas que trabalham por turnos e não podem ir a todas as aulas da semana. Neste sentido, não trabalho apenas com plano mensal e é possível pagar por aula.
Em relação à comunicação, actualmente compartilho as actualizações através da página de Instagram neuzayoga. E, para além disso, mantenho sempre um grupo activo pelo WhatsApp, quer para partilhar informações com as pessoas que estiverem interessadas, quer para manter um acompanhamento mais pessoal com as minhas alunas.
As aulas acontecem num espaço perto do Centro Comercial Parque Atlântico. É uma residência privada com uma espécie de sala de ginástica, com um espelho enorme e uma energia muito boa. Já no Verão, sempre que possível passo as aulas para o exterior. Normalmente vamos para o Parque Urbano, em especial ao Domingo de manhã que é uma das aulas com mais adesão.

No seu percurso como professora de ioga, qual foi o maior desafio que enfrentou?
Acredito que o maior desafio são aqueles dias em que também eu não estou muito bem comigo própria. Nestes dias, tenho de trabalhar comigo antes de lhes passar a minha energia. Não se trata de fingir que estou sempre bem, mas acredito que as minhas alunas merecem que eu esteja no meu melhor. De resto, ao nível de ter ou não pessoas ou espaço para as aulas, tento sempre aceitar aquilo que o universo me dá. Portanto, mesmo nos dias em que tive menos alunos ou que tive de procurar mais soluções, não vi isso como uma dificuldade.

E qual foi a experiência mais marcan-te?
Tenho várias experiências. Dar aulas na Associação de Doentes com Paralisia Cerebral é um dos momentos que me marcou mais e for precisamente na primeira aula que senti aquela energia boa. Desde então, continuo a dar aulas nesta associação e pretendo continuar. A convite do Fernando Vicente, que faz o Tai Chi, participei num evento na lagoa das Sete Cidades onde dei uma aula a cerca de 80 pessoas. Também foi um dia que me marcou imenso porque nunca tinha dado aula a um público tão grande. Mas, existem muitos momentos que me marcam a cada aula, momentos simples e que me fazem dizer ‘é por isto que continuo a fazer o faço’. Foi por isso que me despedi do meu emprego fixo na pandemia e a partir continuei a seguir o coração.

Para além de trabalhar com doentes com paralisia cerebral, tem em vista mais algum projecto específico para trazer o ioga para benefício da comunidade?
Sim, tenho vários projectos em vista. Em especial agora que tirei o curso de especialista em exercício físico que me deu muitos conhecimentos por exemplo a nível de hérnias e de correcção de postura e, portanto, questões de saúde física. Tenho vários projectos planeados para o final deste ano, no entanto, fui mãe há pouco tempo e não consigo desenvolver as coisas com a rapidez que pretendia. Mas, um dos projectos que quero concretizar é o de levar ioga aos lares de idosos. Como ainda me falta o estágio, pretendo terminar o curso antes de lançar qualquer projecto pois no caso dos lares, por exemplo, requer um trabalho ainda mais cuidado e personalizado. Por um lado, estou ansiosa pelos conhecimentos que vou poder aplicar e melhorar no estágio. Mas, por outro lado, estou a aproveitar este momento com o meu bebé, pois é uma altura única. A partir de Maio, recomeço com as aulas de ioga com a minha turma.

Como é que o ioga influenciou a sua experiência de gravidez? Existiram práticas específicas ou modificações na prática regular que possa partilhar com as outras mães?
Em relação ao ioga na gravidez, a parte física é muito importante para preparação do parto, principalmente no que diz respeito a aberturas de anca e trabalho da pélvis que também ajuda imenso na recuperação pós-parto. É importante manter uma prática física durante a gravidez. Inclusive, há ioga específico para grávidas. No meu caso, continuei sempre a dar as aulas, mas apenas fazia os exercícios indicados para grávidas e, nos restantes exercícios, pedia a uma das minhas alunas para demonstrar. A nível mental, e com base naquilo que senti na minha experiência pessoal, foi que devido às hormonas e a todas as alterações que estão a acontecer connosco, existem muitos pensamentos intrusivos, em especial devido aos nossos medos. No meu caso, tinha um desejo muito grande de ser mãe e tinha muito medo que acontecesse alguma coisa com o bebé. Nessa altura, percebi que, se não cuidarmos destes pensamentos intrusivos, eles podem tomar conta de nós. Então, uma das coisas mais importantes que encontrei no ioga durante esta fase foi que aprender a respirar também nos ajuda a controlar os nossos medos. Um dos mantras que usava sempre que aparecia um pensamento mais abusivo foi o seguinte: “Confio no meu bebé, confio no meu corpo e confio no Universo”. Estas três frases podem parecer muito simples e modestas, mas ajudaram-me muito ao longo de toda a gravidez.

Que conselho daria a alguém interessado em começar a praticar ioga, mas que possa estar hesitante ou incerto sobre como iniciar?
Em relação ao ioga e como em tudo na vida, acredito que estamos aqui para viver. Então, devemos desligar esses medos e pensamentos que nos impedem e ir experimentar. Para aqueles que querem recomeçar, não há nada como voltar ao tapete e ver como nos sentimos novamente, pois aquilo que a pessoa sentiu há dez anos não será o mesmo que irá sentir agora, pois são pessoas diferentes. Para além disso, se não se identificarem com uma professora, experimentem com outra pois a relação com quem está guiar a prática de ioga é uma muito importante. Todos absorvemos as coisas de forma diferente e está tudo bem com isso. Tentem formas diferentes, mas não desistam. Ou, mesmo que experimentem e percebam que não se identificam com o ioga, façam algo pela vossa saúde pois o exercício está na base da nossa saúde mental e física.

Como vê o futuro da prática de ioga na Região e qual considera ser o seu papel enquanto professora neste contexto?
Felizmente, vejo com muita alegria que o ioga na Região está a evoluir, tanto no número de professores e alunos, como nas diferentes práticas. Já temos, por exemplo, o ‘Aerial yoga’, o ioga suspenso, que é uma prática muito bonita. Portanto, vai evoluir e vão aparecer novos tipos de ioga para que seja possível chegar a toda a gente, tanto um ioga para idosos, como para jovens que conseguem ficar suspensos, o que torna o ioga mais divertido.
Em relação ao meu papel como professora de ioga, quero continuar com a minha turma fixa; e, na parte dos projectos sociais, quero também continuar com a minha associação e poder trabalhar com crianças e idosos. Por fim, pretendo continuar a passar a minha mensagem, em especial sobre a importância de aprendermos a parar e respirar sempre que a vida nos tenta tirar do nosso caminho. Como é que conseguimos isso? Praticando algum exercício físico e, na minha opinião, o ioga é o exercício mais completo porque trabalha não apenas a parte física, mas também a parte mental e espiritual.

Daniela Canha

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