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O PSD/A e EU

I
TUDO TEM UM PRINCÍPIO

O Partido político é um organizado agregado ideológico homogéneo de pessoas que num determinado Estado ou Região territorial autónoma, encontra condições que lhe permitem disputar eleições universais, livres e justas. Obtendo o maior número de votos é lhe constitucionalmente confiado o exercício de poderes legislativo e executivo no respeito pelo princípio democrático da separação de poderes de Estado, da liberdade e da igualdade. Assim aconteceu no Arquipélago dos Açores quando foi constitucionalmente reconhecido como Região Autónoma de Portugal.
Solicita a estrutura regional do PSD nos Açores – Comissão Política Regional – a minha participação com um testemunho memorial a incorporar no livro comemorativo dos 50 anos da sua atividade política neste Arquipélago.
Considero o convite que me foi dirigido como uma exigência de respeito pela integridade e pela verdade com que o PSD/A conduziu a instauração da Região Autónoma dos Açores e não como uma homenagem formal em dia de aniversário.
Assim, cumpro!
É com gosto que aceito o convite e que correspondendo preencho as próximas linhas, respeitando o tema que me foi dado e reproduzindo o que a minha memória conserva do tempo durante o qual fui militante e dirigente do Partido Social Democrata; em nome dele membro do Governo Regional, na qualidade de Secretário Regional do Trabalho, Secretário Regional das Finanças, Secretário Regional da Economia e deputado eleito para a Assembleia da República e para a Assembleia Legislativa Regional.
Devo esclarecer que não era simpatizante ou militante do PSD quando foi constituída a respetiva estrutura partidária regional, muito embora tenha sido, ainda em 1974, convidado para dela fazer parte na qualidade de militante.
Todavia, só uns anos depois, decidi filiar-me no Partido e integrar a Comissão Política da Ilha de S. Miguel. Razão pela qual não posso incluir neste meu testemunho quer a fundação quer os primeiros tempos de vida e ação do PSD/A.
Contudo, posso escrever que também não procurei aproximar-me nem associar-me a nenhum outro Partido… Embora me encontrasse com bons amigos que militavam noutras formações políticas regionais e com eles tivesse mantido longas conversas sobre o futuro político do Açores e de Portugal e as soluções políticas possíveis locais e regionais.
Política e ocasionalmente, antes de ingressar no PSD, estive presente numa reunião dirigida pelo, então, Governador dos Açores, nomeado pela comissão militar nacional que geria os destinos do País.
Participei, integrado num conjunto de forças partidárias com atividade na Ilha de S. Miguel. Confesso, que nem sabia distinguir com rigor a filiação política individual que compunha todo o conjunto.
O encontro fora convocado pelo Governador, um notável micaelense, que acabara de assumir funções no novo ambiente político nacional bem diferente do que antes o condenara politicamente.
Destinava-se a reunião a encontrar um consenso relativamente à nomeação que o governador tinha de fazer, a do presidente interino da Câmara de Ponta Delgada.
Considerados os curricula de vários cidadãos que reuniam as condições necessárias, o conselho unânime recaiu num comerciante de Ponta Delgada, com família constituída nos Açores e oriundo do Continente português e militante do PSD/A. Um homem bom, realizador e gestor inteligente. Defendi a sua nomeação e creio, ainda hoje, que contribuí para influenciar a decisão.
Intervim com outros representantes de formações políticas que me haviam pedido para estar presente e em representação duma delas que nem partido era, mas apenas um movimento político democrático que a comunicação social de então relacionava com o Partido Comunista.
Foi a única ação política pública relevante em que participei antes de ingressar no PSD/A.
Se recordei o facto é apenas porque ele se relaciona com o que a seguir descrevo.
Uns anos mais tarde, mas poucos, haveria de ser chamado a ocupar o lugar de Diretor Regional pelo mesmo cidadão antes nomeado para presidente interino da Câmara de Ponta Delgada. No intervalo, passara a integrar o primeiro Governo Regional do PSD/A como Secretário Regional das Finanças.
Tomei posse do lugar administrativo acidentalmente, mas que era politicamente relevante, sem estar filiado no PSD e sem esta condição a satisfazer, o que me encheu de orgulho e de consideração pelo PSD/A. Assim começou a minha simpatia pelo PSD/A que se associava à que tinha pelo Presidente da estrutura política regional e ao qual dedico o presente trabalho.
Iniciei os primeiros contatos com o PSD/Açores no âmbito dum programa de conhecimento e interação por mim próprio definido e que me conduziria mais tarde à filiação na estrutura regional do Partido onde ainda hoje me mantenho como filiado, mas sem qualquer ação de índole partidária, desde o último trimestre de 1996.
A verdade, devo reconhecê-la, é que nunca fui propriamente um militante de base efetivo e combativo ou dirigente com intensa atividade partidária, embora tenha pertencido à Comissão Política de Ilha (S. Miguel) e à Comissão Política Regional (Açores) do PSD/A.
Recordo-me de que nos dias que se seguiram ao movimento militar que pôs termo à ditadura portuguesa de quase meio século e possibilitou a implantação da democracia em Portugal, a transição de regime político no ambiente político -geográfico dos Açores decorreu pacificamente. Apenas tenho registo de alguns desacatos no centro da cidade de Ponta Delgada junto da sede da estrutura regional do Partido Comunista Português e contra este Partido molestando com alguma severidade os militantes que lh se encontravam e um automóvel dum dirigente regional da ilha do Faial que foi lançado ao mar. Plágio insular de ações mais violentas que se registavam então no Norte do território continental português.
Lembro-me ainda hoje os desacatos localizados e intencionalmente dirigidos a uma estrutura partidária com mágoa verdadeira porque uma das militantes foi muito maltratada e, em integral nudez, exposta publicamente: era uma senhora micaelense por nascimento e que eu tinha conhecido como colega na faculdade de direito de Lisboa.
Recordo ainda, não por ter presenciado, mas por ter tido conhecimento, da prisão de várias personalidades açorianas, pela calada da noite, alegadamente, por defenderem a “independência dos Açores”, na verdade, uma parábola política mal avaliada e muito empolada que haveria de perdurar durante muito tempo como uma arma política, curiosamente usada por várias forças políticas em conformidade com os seus interesses ocasionais.
O PSD/A não participou na insubordinação política antipartidária, do que tomei nota com agrado. Como também não alardeou em frente das instalações da PIDE local que nos tempos da ditadura, cumprindo o cardápio político – policial, quando tinha de deter políticos locais críticos do regime sempre os tratara humanamente respeitando os direitos do homem.
II
SEM ALICERCES NÃO HÁ CONSTRUÇÃO

Depois de alguns anos de atividade como Diretor Regional, assumi funções governativas, em ambos os casos com dedicação exclusiva até 1985, quando interrompi a minha permanência nos Açores para cumprir uma missão política no plano nacional que modificaria totalmente a minha vida.
A minha atividade política nos Açores, foi quase uma década de afirmação, de realização pessoal e conjunta – governo e partido – no âmbito da edificação dum sistema político administrativo de autonomia política e de gestão própria, designadamente na área das finanças públicas regionais e da gestão patrimonial.
A Constituição e o Estatuto Político-Administrativodos Açores eram as leis habilitadoras à edificação do regime de autonomia político-administrativa. Porém, a matéria essencial residia no modo e no tempo de execução de tais inéditas faculdades constitucionais e legais: (1)assegurar a transferência – e garantir o reconhecimento legal -dos poderes que eram do Estado para os órgãos de governo próprio regionais como determinava a Constituição e o Estatuto Político-Administrativo; (2) obter a entrega das verbas orçamentais que estavam alocadas no orçamento do Estado para a Região Autónoma;(3) assumir a responsabilidade pela gestão dos serviços que pertenciam à administração do Estado.
As dificuldades foram naturalmente muitas, mas o governo do PSD/A consciente da complexidade e com competência conseguiu definir o ambiente necessário para o exercício dos poderes regionais que a Constituição inequivocamente lhe outorgava, não só no âmbito administrativo (funcional), mas também prospetivo como:

  • A elaboração de um Estatuto Político Administrativo que substituísse o Provisório em vigor;
  • O reconhecimento da faculdade de dispor dum sistema fiscal diferenciado, adaptado à realidade social e económica insular;
  • A gestão do património que o Estado abandonava por encerramento dos seus serviços locais;
  • A problemática gestão da costa marinha e das pescas nas áreas internacionalmente definidas como exclusivas;
  • A participação efetiva no acompanhamento dos acordos e tratados internacionais que lhe diziam respeito e o beneficio das contrapartidas financeiras que os EUA deveriam entregar anualmente a Portugal relativamente à utilização da base das Lajes na ilha Terceira, assim como a França que utilizava a aeroporto das Flores e zonas adjacentes para vigilância de mísseis, sem ogiva nuclear, que eram disparados daquele País e cruzavam o Atlântico Norte;
  • A lei das Finanças Regionais que, uns anos depois, quando alterada e ampliada, favoreceu o Estado, como é do conhecimento geral e se encontra agora em revisão exigente
    Para os Açores foi um período de permanente e produtiva interação do Executivo regional com o Partido, indispensável, considerando que a primeira prioridade era constituir uma nova administração pública verdadeiramente insular e realmente autónoma como obrigava a própria história do Arquipélago.
    A questão essencial era já, indiscutivelmente, técnica e política, simbiose, ao tempo de difícil compreensão.
    Devo sublinhar que a ação conjunta ou partilhada entre governo, deputados e estrutura partidária foi fundamental, porque foi possível fazer convergir vários fatores:
  • Políticos
  • Técnicos Regionais

Se assim não tivesse sido, a tensão fervorosa e vãs disputas de caráter, ainda que dentro de casa, teriam perturbado e impedido a instauração de um regime de autonomia político administrativa adequado.
Houve com certeza, regionalmente, uma compreensão generalizada baseada nos interesses regionais e não em egos pessoais e interesses partidários: governa quem o povo escolheu, mas tem de o saber fazer com isenção, equilíbrio e ciência.
A prossecução do interesse regional exigia cooperação e não táticas de guerrilha palaciana ou de praça pública. Valeu a valorização coletivado interesse da defesa do interesse regional que era um “denominador comum” partidário.
Não foi tão-somente a cooperação entendida como ajuda, apoio necessário para o alcance de objetivos muito complexos e novos pelos quais os açorianos lutavam há quinhentos anos. Foi também a assunção criteriosa duma responsabilidade recíproca entre os poderes regionais legislativos e executivos com o envolvimento da componente política pura, a estrutura partidária, porém não exclusiva. Só assim foi possível num curtíssimo espaço de tempo erguer uma região autónoma insularmente repartida, mas desejavelmente unida, num país de forte pendor centralista. Posso afirmar, com comparado conhecimento de causa, que não ficou atrás de nenhuma outra região autónoma europeia, insular ou continental, antes existente.
Uma lição política que conservo, recolhida no comportamento e ação da estrutura regional de um Partido (PSD) que edificando a Região Autónoma não negou Portugal, mesmo nos momentos mais difíceis e soube destrinçar entre o principal e o acessório, entre o Verão quente e improdutivo e o Inverno frio e consequente.
Passadas que são cinco décadas recordo todos os feitos e os efeitos, com regozijo, mas não punitivo, sempre que observo o que se passou e ainda hoje se passa no plano nacional com propósitos ínsitos de que nas Regiões Autónomas aconteça algo de semelhante.
No decurso do processo de instauração da autonomia regional houve um respeito integral pela democracia, pela unidade e coesão nacional assim pelo interesse regional reconhecido e respeitado ao fim de 500 anos de antinomia.
O PSD/A foi o principal defensor desta realidade, por si próprio e muitas vezes, que eu testemunhei, discordando veementemente do poder central e da sua lentidão relativamente ao que lhe competia.
(Continua…)

Álvaro Cordeiro Dâmaso

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