Ana Beatriz Silva, mestre em Ciências Económicas e Empresariais
Correio dos Açores – Qual é o motivo para que o tema da sua dissertação de mestrado na Universidade dos Açores tenha sido sobre a percepção dos alunos das escolas do concelho da Ribeira Grande sobre os comportamentos aditivos, dependências, escolaridade e mercado de trabalho?
Ana Beatriz Silva (Autora da dissertação de mestrado) – Juntei o útil ao agradável. Desde tenra idade preocupo-me com a sociedade e a sua envolvência e, é notório que uma grande fatia da faixa etária mais jovem já teve contacto com as drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas. Este foi um dos motivos que ingressei em Serviço Social e, como colaboradora da instituição, ARRISCA, tenho um papel activo na sociedade nesta problemática através da dinamização de sessões de Prevenção e Promoção da Saúde nas Escolas. Também intervenho no acompanhamento e no tratamento das pessoas com comportamentos aditivos e dependências, doentes mentais e pessoas em exclusão social grave, educando-os para evitar comportamentos de risco que poderão conduzir à doença.
Porquê um estudo sobre os alunos de turmas do 7.º ano das escolas do concelho da Ribeira Grande?
Na altura que optei por este estudo estava a dinamizar sessões com os alunos do 7.º ano das escolas do concelho da Ribeira Grande e dado que é nesta altura que os jovens estão a iniciar a adolescência, é uma fase chave do desenvolvimento humano.
Caracterizado por rápidas mudanças de ordem biológica, psicológica e social, o adolescente envolve-se e experiencia novos comportamentos, que influenciam o olhar sobre si próprio, o mundo que o rodeia, as relações que estabelece com os outros e a sua projecção no futuro. O risco ou a probabilidade do adolescente se envolver em comportamentos de risco que podem colocar em risco o desenvolvimento futuro saudável, verifica-se na confluência entre a vulnerabilidade e a resiliência, e a relação entre os contextos micro (família, escolar, pares e instituições da comunidade) e os contextos macro (comunidade onde o adolescente se insere, cidade, país).
Quais foram os tópicos abordados no seu inquérito?
O inquérito consistiu em avaliar os determinantes da adição ao jogo eletrónico, do nível de dependência da internet e do consumo de substâncias psicoativas, tais como drogas lícitas (álcool e tabaco) ou drogas ilícitas (heroína, cocaína), entre os adolescentes das escolas do concelho da Ribeira Grande; avaliar os determinantes da opinião destes adolescentes sobre os efeitos, ou seja, as consequências, do consumo de substâncias psicoativas ao nível do desempenho educativo, nomeadamente, notas obtidas, probabilidade de reprovação e abandono escolar precoce, o efeito que a adição ao jogo eletrónico e a dependência da internet e do consumo de substâncias psicoactivas exerce sobre as “aspirações” dos adolescentes no que concerne ao prosseguimento de estudos após a conclusão da escolaridade obrigatória, assim como sobre as preocupações que manifestam sobre a qualidade do emprego a ter no futuro.
Qual foi o resultado desta investigação? Qual foi a percepção dos alunos das escolas do concelho da Ribeira Grande?
Os resultados indicam que o uso da internet não reduz o desempenho educativo e não prejudica a ambição de querer continuar a estudar após a escolaridade obrigatória, dado que os indivíduos com gosto pelo estudo utilizam a internet, em grande parte, para auxiliar no estudo e não por motivos recreativos ou diversão. Excepto quando esta se conjuga com a adição ao jogo eletrónico (neste caso diminui a probabilidade de querer continuar a estudar após a conclusão da escolaridade obrigatória). Os inquiridos que afirmam consumir alguma droga ilícita frequentemente têm menor probabilidade de pretender continuar a estudar, após a conclusão da escolaridade obrigatória. Aqueles cuja educação da mãe é inferior ao 12º ano têm maior probabilidade de não querer ir além da escolaridade obrigatória. A educação do pai parece não ser explicativa de tal intenção. A maioria dos adolescentes prefere consumir substâncias psicoativas e obter um prazer imediato no presente do que incorrer num sacrifício com vista a obter um maior investimento ou bem-estar no futuro. Ou seja, os adolescentes não estão dispostos a fazer sacrifícios no presente em troca da obtenção de benefícios futuros. Os que só se importam com o presente e não pensam no futuro têm maior probabilidade de serem consumidores frequentes. Os adolescentes que pretendem continuar a estudar após concluir a escolaridade obrigatória, ou seja, continuar a investir em educação, assim como os que se preocupam em ter um bom emprego no futuro têm maior probabilidade de achar que o consumo de substâncias psicoativas terá um efeito negativo sobre a aprendizagem e consequentemente sobre as notas obtidas. Também é de salientar que o facto de os pais falarem sobre as consequências das substâncias psicoativas aumenta esta probabilidade. Os inquiridos que se preocupam em ter um bom emprego no futuro, cujos pais incentivam o estudo e conversam sobre as consequências das substâncias psicoativas têm maior probabilidade de acharem que os consumidores de substâncias psicoativas têm maior probabilidade de ficar desempregado. O que demostra a importância da prevenção na educação dos Comportamento Aditivos e Dependências (CAD), sendo os pais a primeira instância socializadora do indivíduo.
No seu estudo, conclui que os alunos que se preocupam com o presente e não com o futuro têm uma maior probabilidade de consumir substâncias psicoativas. Na sua perspetiva, quais são os motivos para isto acontecer?
Os motivos que desencadeiam o uso de drogas pelos adolescentes são diversos e multifacetados, estando os principais relacionados às características individuais e sociais, incluindo a família e o grupo de pares. Os adolescentes desejam que as suas necessidades sejam rapidamente satisfeitas, envolvendo-se, assim, em comportamentos normalmente impulsivos, cujo objectivo é a procura de experiências e desafios, de prazer e de sensações imediatas, tais como o consumo de substâncias psicoativas, de maneira a alcançarem a satisfação máxima das suas necessidades. Evitando sentimentos e emoções associados a intenso sofrimento psíquico, como depressão, culpa, ansiedade exagerada e baixa autoestima.
Na conclusão do seu inquérito, afirma que a maioria dos adolescentes não está disposta a fazer sacrifícios no presente em troca da obtenção de benefícios futuros. Quais são os motivos?
Não será extremamente frustrante ver os seus pares investirem em formação sem conseguirem um emprego, ou conseguirem empregos precários e com salários muito baixos? Essa frustração não elevará as taxas de desconto diminuindo a disponibilidade para sacrifícios e promovendo a busca de prazer imediato? Os jovens sentem-se inseguros e despreparados para actuar como actores protagonistas na sociedade em que vivem.
Todos os encarregados de educação deram autorização para o seu educando realizar o inquérito? As escolas aceitaram prontamente a realização do inquérito?
Aproveito desde já para agradecer a todos os directores de turmas e alunos do 7.º ano das escolas do concelho da Ribeira Grande, nomeadamente a Escola Secundária da Ribeira Grande, a Escola Básica Integrada da Maia e a Escola Básica Integrada de Rabo de Peixe, que me apoiaram e que se demonstraram disponíveis para responder ao inquérito, assim como a todos os pais e encarregados de educação agradeço a confiança e apoio. Contudo, saliento que alguns encarregados de educação não autorizaram os seus filhos a participar no estudo. Acredito que em algumas famílias este assunto ainda seja um tabu.
Acredita que os jovens estão cada vez mais conscientes dos perigos do consumo de substâncias líticas?
Infelizmente, não. O tabaco e o álcool são as substâncias lícitas mais consumidas entre os adolescentes portugueses. De acordo com os resultados do estudo, embora o número de indivíduos que já experimentaram o consumo de álcool seja superior aos dos que experimentaram o consumo de tabaco, se consideramos o consumo frequente como um indicador de dependência, verificamos que é superior no caso do tabaco quando comparado com o álcool.
Acredita que os jovens com uma dependência de internet têm menos probabilidade de prosseguir os estudos?
Sou da opinião que tudo o que é demais faz mal e a excessiva utilização da internet poderá levar ao isolamento social, sedentarismo, diminuição do rendimento escolar, dificuldades em estabelecer relações e em casos mais graves poderá surgir sintomatologia ansiosa e/ou depressiva.
Filipe Torres