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Aprendizagem para as pessoas surdas tem melhoradonos últimos anos aos olhos de duas gerações de açorianos

Hoje, 23 de Abril, assinala-se o Dia Nacional da Educação de Surdos. O Jornal “Correio dos Açores” esteve à conversa com elementos ligados à Associação de Surdos da Ilha de São Miguel (ASISM), a presidente Ema Gonçalves, de 57 anos, e João Oliveira, de 31 anos. Ambos os entrevistados fazem parte da referida associação, que contou ainda com a presença da intérprete de língua gestual, Carolina Nunes.

A perda de audição aconteceu
nos primeiros anos de vida

Ema perdeu a audição aos seis anos, devido a uma miringite, enquanto João perdeu a sua audição aos dois anos. Os pais do João ficaram preocupados, foram ao médico e queriam colocar um implante, mas estavam na dúvida. Na altura, estava lá uma intérprete, a Ema e o Hélder que lhes disseram que o implante não seria adequado. João aprendeu a língua gestual através da Ema, desde logo.
Sobre o significado do Dia Nacional da Educação de Surdos, Ema e João concordam que o dia é “muito importante” para a comunidade surda e ambos sentem que há uma melhoria face ao passado.

Educação sofreu
muitas alterações
– a experiência de Ema

Ema afirma que na sua altura, as pessoas surdas da ilha de São Miguel iam para uma única escola, nos Arrifes, onde não havia uma intérprete de língua gestual e era obrigada a usar o oralismo, devido ao Congresso de Milão de 1880 – cujo congresso declarou que a educação oralista era mais apropriada do que a de língua gestual e aprovou uma resolução que preferencialmente seria utilizado o uso da língua oral na escola.
A actual presidente da Associação de Surdos da Ilha de São Miguel tinha de usar um aparelho auditivo, visto que o “oralismo predominava”, ia muitas vezes à terapia da fala e, em segredo, com os seus colegas, utilizava muitas vezes códigos de mimica para comunicar. Apesar disso, Ema gostou muito da sua educação e dessa escola.
A partir do 5.º ano, Ema deixou de estar integrada num grupo de surdos e passou a estar numa turma somente com ouvintes. Ema admite que sofreu muito na altura, visto que não tinha ajuda de nenhuma intérprete de língua gestual, tinha de escrever e utilizar a visão para poder copiar os apontamentos do colega ao lado e também pedia os apontamentos.
Depois de ter concluído o secundário, esperou uns anos até ingressar na Licenciatura em Língua Gestual Portuguesa, e o Mestrado em Educação dos Surdos, ambos os ensinos foram tirados na Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa.
No ensino superior, Ema contava com o apoio de intérpretes para ajudar e facilitar na compreensão da matéria. A actual presidente da ASISM afirma que quando era mais nova rejeitava imenso o oralismo, visto que se sentia “ansiosa” e que não gostava.
“Quando estava no 12.º ano, comecei à procura de um trabalho e percebi que tinha curiosidade na área de língua gestual portuguesa, visto que aqui era só a Língua ASL (Língua Gestual de Sinais Americana). Entretanto, percebi que não havia Língua Gestual Portuguesa (LGP), fui a Lisboa durante um ano, aprendi LGP, fui adquirindo essa língua, aprendi essa língua muito rapidamente, visto que tenho uma identidade surda, que é a minha língua materna, e aqui percebi que era importante educar, então decidi tirar uma licenciatura e mestrado para adquirir mais competência. Trabalhei com alguns alunos, trabalhei com o João, desde os seus dois anos e meio, mais ou menos, e ensinei-lhe a língua gestual portuguesa”, explica.
A educação de João foi diferente. A sua escola estava integrada com ouvintes e apesar de ter tido ajuda de uma intérprete, tinha alguém que lhe dava um “certo apoio” no seu percurso.
Educação sofreu
muitas alterações

  • a experiência de João

Ao contrário de Ema, que a partir do 5.º ano não tinha ajuda de nenhuma intérprete, João contou com a ajuda de um intérprete de língua gestual no 5.º e no 6.º ano, e foi nessa altura que percebeu “a existência dos intérpretes”.
O próprio salientou que esteve ainda na UNECA, que era uma unidade de surdos na altura, todas as Sextas-feiras, onde também estava a professora Ema e aprendia a língua gestual.
João começou a “sentir as barreiras” quando se mudou para a Escola Secundária Domingos Rebelo, para começar o curso profissional que está relacionado com arquitectura. Na altura, ficou “muito zangado” porque não havia intérprete. O próprio afirma que a sua mãe foi à “luta”, visto que também tinha um colega surdo que necessitava de ajuda.
“A minha mãe foi à luta, porque havia também mais um surdo, outra pessoa que também queria um intérprete de língua gestual. Como é que fazia? A comunicação não era possível. A minha identidade era surda e era um direito que eu tinha”, afirma.
Quando surgiu uma intérprete, depois de seis meses, João sentiu que “já tinha perdido imenso informação” porque o primeiro nível já estava concluído – o curso era feito por níveis – e acabou por sair do mesmo.
Posteriormente, tirou um curso profissional em cozinha durante dois anos nos Arrifes, e gostou muito da experiência, onde contou com a presença de uma interprete de língua gestual.
Recorda que chegou a estudar em Lisboa, no Centro de Educação e Desenvolvimento Jacob Rodrigues Pereira, e no Porto, e afirma que “antes achava a qualidade de vida superior no Porto”, mas agora acredita que “a qualidade de vida é superior nos Açores em comparação com o Porto”.
Hoje em dia, João tem conhecimento de pessoas surdas que estão a ser acompanhadas nas escolas.

Dialectos diferentes
na língua gestual

A língua gestual tem diacletos. A actual presidente da Associação de Surdos da Ilha de São Miguel fez a sua dissertação de mestrado sobre a diferença entre a Língua Gestual nos Açores e em Portugal Continental, cujo título é “Estudo Diacrónico dos Gestos da Língua Gestual Portuguesa nos Açores”.
Ema Gonçalves afirma que na altura em que a escola situada nos Arrifes abriu, começou um concurso para ser professor de língua gestual portuguesa, sendo que, neste caso, vinham de Portugal Continente para cá, e “eles tinham dialectos”. Na altura, Ema afirma que as crianças açorianas sofreram “um bocadinho” no início, mas acabaram por adquirir competência. “Uma coisa é aprender a língua gestual aqui nos Açores, outra é aprender com alguém de Portugal Continental com a língua gestual de lá”, explica.

Planos da ASISM para
o futuro e o evento
do Sábado

No dia 20 de Abril, a ASISM preparou um evento que contou com a presença do jurista Filipe Venade, do Porto, o primeiro cidadão surdo na categoria profissional de Direito, com uma larga experiência na área e largo conhecimento da história dos surdos, onde esteve a divulgar a sua informação e explicou a importância do dia 23 de Abril.
Ema Gonçalves, presidente da ASISM, afirma que pretende criar um projecto de sensibilização para as pessoas em São Miguel, a nível da Língua Gestual Portuguesa, para quebrar as barreiras existentes e haver mais abertura.

           Filipe Torres
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