O Conselho Económico e Social, presidido por Gualter Furtado, deu um parecer favorável ao Plano e Orçamento para 2024 mas multiplica-se em “preocupações”, “alertas” e “recomendações” ao Governo do PSD/CDS/PPM. Desde logo, a questão de sempre: mais importante do que os números do Plano e Orçamento, é a sua execução numa Região em que as receitas próprias são tão baixas que “não dão para pagar as despesas de funcionamento”, como afirma o Presidente do CESA, que considera que “esta é uma questão estrutural que põe em causa a própria Autonomia…” Há também um apelo generalizado para que o Orçamento entre em execução “o mais rapidamente possível para que a Região deixe de estar em regime de duodécimos.” Os prazos começaram a contar a partir de ontem, dia em que Plano e Orçamento 2024 foram entregues na Assembleia Legislativa Regional.
As ante-propostas de Plano e Orçamento para 2024 partem de um contexto “de elevada incerteza, caracterizada por diversas adversidades externas, nomeadamente juros elevados, volatilidade nos preços da energia, abrandamento económico de algumas economias e grande incerteza geopolítica no plano internacional, nomeadamente pelos conflitos na Ucrânia e no Médio Oriente.”
A actividade económica “tem vindo a ser condicionada pela inflação, ainda elevada, e pelo aumento dos custos de financiamento das empresas e das famílias. O contexto económico-financeiro, marcado por decisões de política monetária bastante restritivas tem condicionado toda a actividade económica e, de modo particular, afectado as famílias com créditos bancários à habitação.”
Em Portugal, observa-se “um risco de contracção do consumo privado que poderá pressionar negativamente a evolução económica da Região.” Segundo o CESA, de forma resumida, o Plano e Orçamento para 2024 aponta para que, em 2022, a economia dos Açores “tenha crescido 6,8%. A recuperação económica em 2021 e 2022, evidenciou-se nos indicadores da actividade económica e do consumo privado, sendo impulsionada, principalmente, pela recuperação do comércio e do turismo da economia dos Açores.” Para 2023, “espera-se que seja um ano de desaceleração económica, com uma previsão de taxa de crescimento real do PIB de 2,5%, superior à média do país (2,3%), e que se manterá relativamente estável, e em linha com a economia nacional, nos próximos 2 anos (para os anos de 2024 e 2025 a estimativas do PIB real regional são de 2% e de 2,4%, muito similares à média nacional que se prevê 2% e 2,3%, respectivamente).”
Quanto ao Índice de Preços do Consumidor, a inflação está entre as principais “incertezas e condicionantes ao crescimento da economia mundial, nacional e regional”. No final de 2023, a inflação nos Açores, medida pelo IPC e obtida pela média dos últimos 12 meses, “fixou-se nos 4,9%, ligeiramente acima do estimado para Portugal (4,3%).”
Existia “uma preocupação com o facto de na última década (2010-2019) a Região apresentar progressos pouco significativos a nível da produtividade, observando-se uma divergência do PIB per capita dos Açores face à média nacional.” Contudo “nos dois anos seguintes, com evidentes sinais de recuperação da generalidade dos indicadores CESA – verifica-se “uma tendência de convergência do PIB per capita dos Açores, explicado pelo crescimento via emprego, atingindo-se os 89,7% em 2022”, mesmo assim, com um longo caminho a percorrer até atingirmos 100%.”
Segundo o Conselho Económico e Social, o Plano Regional para 2024 antecipa uma verba de 739,7 milhões de euros, num contexto de investimento público previsional de 904,1 milhões de euros, sendo a verba remanescente (correspondente a 164,4 milhões de euros) proveniente de Outros Fundos.
O montante estimado do Plano para 2024 representa um aumento de 95,8 milhões de euros, comparativamente à verba estimada no Plano para 2023 (+14,87%) e menos 41,6 milhões de euros do que previsto no Plano para 2022 (-5,3%), embora, face ao executado de 2022 revele quase mais 222,6 milhões de euros (+43,04%).
Embora registe o aumento do investimento público, o Conselho Económico e Social reafirma que, nesta matéria, “o fundamental é a alocação do investimento e a respectiva taxa de execução”.
E no entender do CESA, a execução do investimento apresentado na anteproposta de Plano para 2024, “está fortemente condicionada pelos níveis de execução que vierem a ser alcançados do PRR Açores, o que exigirá ritmos e intensidade de execuções bem maiores do que os verificados em 2022 e 2023.”
É a Secretaria Regional do Turismo, Mobilidade e Infraestruturas, através do Programa ‘Desenvolvimento Turístico, Mobilidade e Infraestruturas’ que detém a maior verba estimada do Plano (275 milhões de euros), o que representa 37,55% da dotação disponível. Seguem-se a Secretaria Regional da Saúde E Segurança Social com 90 milhões de euros (12,28%) e a Secretaria Regional das Finanças, Planeamento e Administração Pública (SRFPAP) com 85,3 milhões de euros (11,62%).
As restantes 8 entidades, situam-se com verbas entre os 3,4 e os 68,5 milhões de verba do plano. “É expectável que algumas Entidades Executoras/ Programas beneficiem igualmente de outros fundos (que totalizam um montante total de 164 milhões de euros para 2024). No caso da Secretaria Regional da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, a verba de outros fundos representa valores muito próximos aos previstos no Plano Regional de 2024, sendo que no caso da Secretaria Regional da Juventude, Qualificação Profissional e Emprego, a verba de Outros Fundos é superior em 28% à verba prevista no Plano Regional de 2024.
Orçamento de 1,8 milhões de euros
Relativamente ao Orçamento da Região para 2024 a despesa pública regional estima-se em 1 854 milhões de euros, cujo financiamento da provém de três fontes de receita. As Receitas Próprias são “a principal fonte de financiamento” do orçamento da Região, estimando-se em 978,64 milhões de euros, o que corresponde a 56,1% da totalidade da receita. As transferências do Orçamento do Estado, com um montante estimado de 378,22 milhões de euros, representam 21,7% do total da Receita. E as transferências da União Europeia (Fundos Comunitários) asseguram 22,2 % da receita com um valor previsto de 387 milhões de euros.
Relativamente ao valor global das Receitas e das Despesas previstas para o ano de 2024, o Orçamento faz referência de que “o saldo primário (correspondente ao saldo efectivo deduzido de juros e outros encargos) é de -5 milhões de euros, menos 24,9 milhões de euros do que o correspondente valor da ante-proposta de 2023. Já o saldo global ou efectivo de 2024, fixa-se em -75 milhões de euros, precisamente o contra-valor do saldo de gerência do ano anterior.”
No Orçamento acrescenta-se ainda que, “apesar da contenção imposta às despesas de funcionamento, observada pelos decréscimos das verbas afectas às aquisições de bens e serviços e de bens de capital (-5,9 % e -3,2%, respectivamente), as mesmas registam um acréscimo de 8,1%, em resultado dos necessários reforços para os sectores da saúde e da educação, bem como para juros e outros encargos.” A previsão de receita efectiva para 2024 é de 1 667 milhões de euros. Segundo a ante-proposta do Orçamento para 2024, “em termos de estrutura, prevê-se que a receita fiscal represente 51,4% da receita total efectiva e 95,1% da receita própria efectiva.”
A receita própria efectiva, a exemplo dos orçamentos passados, “é a principal fonte financiamento” do orçamento da Região ultrapassando os 54% do total da receita efectiva. Para 2024, estima-se que as receitas próprias se situem nos 901,8 milhões de euros, registando este agregado um acréscimo de 10,0% face ao período anterior, sendo o aumento das receitas fiscais a principal razão do referido crescimento.
O aumento previsto das receitas fiscais é de 69,3 milhões de euros, face à execução de 2023, a qual foi de 788,3 milhões de euros.” Destaca-se, ainda, que o IRS estimado para 2024 é de 230 milhões de euros, o que representa um aumento homólogo de 4%, enquanto que o IRC previsto arrecadar em 2024 será de 63,5 milhões de euros, representando um aumento de 1,3% em relação a 2023.
Por sua vez, prevê-se que o IVA em 2024 seja de 401 milhões de euros, sendo o maior imposto cobrado nos Açores. O Imposto Sobre o Tabaco, com 54,1 milhões de euros, e o Imposto Sobre os Combustíveis, com 31 milhões de euros, merecem igual destaque na estrutura fiscal dos Açores.
Relativamente à Despesa, a sua estimativa “atinge o valor de 1 732,9 milhões de euros, mais 10,9% comparativamente à dotação revista de 2023. Este incremento de despesa está essencialmente relacionado com o aumento das despesas do Plano de Investimentos e com o aumento dos juros e outros encargos da dívida.”
As despesas com pessoal registam um aumento de 9,4% face à dotação de 2023, que se estimam “ser suficientes para abarcar os aumentos salariais e as progressões nas carreiras que se vierem a verificar no corrente ano de 2024.” Segundo o Orçamento, as transferências correntes, agregado com maior peso no total das despesas de funcionamento, incluem as verbas a transferir para o Serviço Regional de Saúde, as quais registam um reforço de 20 milhões de euros de financiamento regional e as verbas afectas aos estabelecimentos escolares, com um reforço de 24,6 milhões de euros, face ao ano de 2023.”
A dotação de juros e outros encargos em 2024 é de 70 milhões de euros, valor que foi estimado tendo por base a dívida actual da Região, no pressuposto de que as taxas de juro, no decorrer do ano 2024, não observarão alterações muito significativas face às taxas actualmente em vigor.”
Preocupações do CESA: Apelo a “mais prudência”
O Conselho Económico e Social manifesta algumas preocupações sobre o Orçamento para 2024 e faz algumas recomendações. Começa por citar o Conselho de Finanças Públicas quando refere que “o alcance de saldos primários positivos é fundamental para uma estratégia de redução da dívida pública”. E, neste contexto, recomenda que” seja implementada uma estratégia orçamental mais efectiva de melhoria do saldo primário num contexto de aumento muito expressivo do endividamento, que já decorre desde 2015.” No entender do CESA, o facto de as receitas correntes apresentam um acréscimo de 9,7%, enquanto o aumento das despesas correntes é de 14%, “não pode deixar de suscitar preocupação, por estarmos perante a continuação das receitas correntes serem inferiores às despesas correntes.” “Salienta-se que o crescimento de 9,4% das despesas com pessoal, num ano em que a inflação prevista é de 2,9%, poderá acarretar um risco para equilíbrios orçamentais futuros,” refere. No entender o Conselho Económico e Social, as receitas fiscais partem de um cenário “muito optimista, quando o contexto é de incerteza e de desaceleração da actividade económica.”
Alerta para o facto da ante-proposta de Orçamento da Região “registar como um dos factores decisivos para o crescimento do PIB dos Açores o investimento público, assente em larga medida na execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), (…).” Ora, como já foi debatido em anteriores plenários do CESA, “existe um risco significativo na execução, (…) pelo que se recomenda que a ante-proposta de Orçamento da Região seja mais prudente no crescimento da despesa corrente.”
Endividamento zero: “cautelas”
O Conselho Económico e Social Constata, “novamente”, a opção por uma política orçamental de “endividamento zero”, a qual “se deve sublinhar face à necessidade de inverter a tendência de agravamento do endividamento público regional.”
Ainda assim, refere o CESA, “deverá acautelar-se o cumprimento do compromisso estabelecido no Acordo de Parceria Estratégica 2023/2028, celebrado entre o Governo Regional e Parceiros Sociais, e que, nesta matéria, salvaguarda que a política de ‘endividamento zero’ não deve comprometer o aproveitamento integral de Fundos Comunitários”.
Contudo, prossegue o CESA, “mantém-se a preocupação com os impactos negativos para o tecido empresarial da Região da política de endividamento zero para 2024 previsto nas antepropostas de orçamento e plano…”
“Mesmo havendo a disponibilidade do Orçamento de Estado 2024 para a conversão de 75 milhões de euros de dívida comercial por dívida financeira. (…) é imprescindível inverter a tendência de agravamento do endividamento público regional, mas esta deve ser feita de forma planeada e gradual, para não adiar ou mesmo inviabilizar investimentos estratégicos e o acesso a fundos estruturais, bem como evitar a persistência de atrasos nos pagamentos a fornecedores do sector público,” lê-se no parece do CESA.
“O controlo da redução da dívida pública deve ser feita com o aumento das receitas próprias e num controlo apertado das despesas correntes e opções correctas de investimento,” conclui.
As verbas comunitárias
No que respeita aos Programas da União Europeia disponíveis para a Região em 2024, o CESA destaca os “elevados” montantes que a Região terá acesso no próximo quadro comunitário, nomeadamente: o Programa Açores 2030, incluído no Portugal 2030, terá uma dotação de 1 140 milhões de euros (sendo 680M€ do FEDER e 460M€ do FSE+), acrescido de uma verba de 10 milhões de euros designada de Assistência Técnica – dedicada à gestão, monitorização e avaliação do programa.
O Programa para o Mar e Pescas (financiado pelo FEAMPA), contempla uma dotação de cerca de 75 milhões de euros para a Região, também acrescido uma verba de 0,2 milhões de euros para Assistência Técnica – dedicada à gestão, monitorização e avaliação do programa; e o programa MAC com uma verba de cerca de 16,4 milhões de euros para projectos promovidos por beneficiários dos Açores. Para além destes programas, a Região contará ainda, através do Plano Estratégico da Política Agrícola Comum em Portugal (PEPAC), com um novo Programa de Desenvolvimento Rural, que irá suceder ao ProRural +, e que prevê uma dotação global para a Região de 196,7 milhões de euros para o período 2023-2027. Adicionalmente, também se estimam, no domínio agrícola, outros fundos de que a Região irá beneficiar no âmbito do POSEI, que poderá ascender a 76,755 milhões de euros. “É ainda expectável” que a Região tenha também acesso a programas temáticos nacionais do Portugal 2030, à semelhança do que aconteceu no anterior período de programação (2014-2020).
Para já, neste âmbito, “temos” o Sustentável 2030 – O Programa Acção Climática e Sustentabilidade (PACS), com uma verba estimada de 136 milhões de euros para a Região, destinado a apoiar o desenvolvimento do sistema de mobilidade regional, “reforçando a sua integração, intermodalidade e sustentabilidade”.
A Região conta ainda com o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), cujo período de execução deverá ter lugar até 2026, com iniciativas que conduzem à implementação de 11 investimentos inicialmente contratualizados como aos que resultam do processo de reprogramação que foram criados ou ampliados. No total registam-se 18 investimentos na Região com um envelope financeiro de 725,1 milhões de euros. A estes, acresce ainda a possibilidade de as entidades regionais se candidatarem, no âmbito de avisos nacionais, ao PRR de Portugal.
“Mostra-se, assim, imprescindível”, no entender do CESA, “uma gestão eficiente dos recursos públicos, e de aproveitamento integral dos fundos comunitários disponíveis para a Região, quer no contexto do PRR, quer no contexto do Horizonte 2030 e dos programas INTERREG-MAC.
“ É assim fundamental que se consiga garantir a maior execução possível dos programas comunitários, para além do Plano para 2024, para não só potenciar o investimento privado, como forma de alavancar o desenvolvimento da economia regional, mas também a mitigar os efeitos de desaceleração económica previstos,” refere o CESA.
J.P.