Em 1979, nasceu, por entre críticas, a Festa da Flor, em moldes diferentes.
A festa não podia circunscrever-se a uma exposição numa sala do Ateneu. Para ser um cartaz internacional teria de se programá-la com variados números, que fossem atrativos, capazes de trazer à Madeira turistas.
Quarenta e cinco anos depois, o seu mentor abriu o cortejo com a ex-Secretária Conceição Estudante. Fê-lo recordar o dia em que, em bicicleta, abriu o primeiro cortejo, perante alguns incrédulos. Hoje, a Festa da Flor é um dos maiores cartazes do turismo da Madeira.
Uma das mensagens deixadas pelo ex-Presidente do Governo Regional da Madeira, Dr. Alberto João Jardim, no passado dia 4 de maio: “Parabéns João Carlos Abreu pela estratégia equilibrada com que a criaste, pela mobilização popular e pedagógica conseguida, e pela solidez como a estruturaste. Tudo a permitir os sucessos de hoje.”
É como se o tempo não tivesse passado e eu me situasse na altura em que tudo começou, na época em que tornava realidade um dos meus sonhos: trazer para a rua a Festa da Flor. Não bastava uma exposição de diferentes espécimes, numa sala do Ateneu do Funchal, a quem nunca retirei o mérito da iniciativa. Era necessário fazer da Festaum cartaz internacional que trouxesse à Madeira turistas e possibilitasse aos madeirenses demonstrarem as suas capacidades criativas. Desde a primeira hora que acreditei no sucesso do projeto a que me propus e, perante os incrédulos, apenas dizia: logo veremos! Do que eu nunca me convenci é que chegaria até aqui, com vida, e poderia testemunhar a beleza extraordinária de um cortejo que mais valorizou os olhos de milhares (calcula-se mais de trinta mil) madeirenses e estrangeiros a assistirem e a aplaudirem a criatividade, a cor, a alegria, o ritmo, de 1800 figurantes, que emprestaram ao acontecimento a beleza e a poesia de um espetáculo inesquecível para aqueles que, pela primeira vez, assistiram ao cortejo do Flor.
Há 45 anos montado numa bicicleta, tendo ao meu lado uma jovem lindíssima, abri o cortejo, dando o exemplo de que todos, independentemente de cargos ou condições sociais, deveríamos estar juntos para ajudar a construir a Festa. Quando um dia me sugeriram nomes para coreografar os grupos, respondi-lhes: jamais! Os madeirenses são tão capazes como todos os outros. Eles serão os ideólogos e os obreiros das suas iniciativas. Um povo que nasce e cresce rodeado de tantas paisagens românticas e corajosamente atravessa as veredas, espreitando os abismos, é um povo cujos sonhos se agigantam nas suas imaginações. Assim, aconteceu durante estes 45 anos.
Mas, para colocar o meu sonho na realidade, necessitava de uma equipa tão coesa quanto crente, tão imaginativa quanto persistente. Eu tinha a vantagem de conhecer bem os elementos escolhidos: Maestro Pereira Júnior, JoelCamacho e Pedro. Estes três colaboradores coadjuvavam-se e tinham por mim, como superior hierárquico, admiração e estima. Depois chamei seis madeirenses que, amando a Madeira, sonhavam e acreditavam não só que éramos capazes, mas também que era necessário criar um grande cartaz para a Região: o Artur e a Dina, um casal de professores, artistas com uma imaginação fabulosa, D. Ângela Figueira, D. Alice, D. Flávia e a Daniela Morna. Infelizmente, quatro deles já morreram, mas na minha memória estarão sempre vivos e exaltá-los-ei com a gratidão que habita na minha alma.
Os meus possíveis leitores compreenderão a minha felicidade, após 45 anos, abrir de novo o cortejo da Festa da Flor, levando a meu lado a antiga Secretária do Turismo, uma madeirense bonita, correspondendo assim ao desafio lançado pelo artista João Egídio, que há quarenta anos abre, com os seus carros maravilhosos, o cortejo.
Deus, apesar de todas as minhas maleitas, privilegiou-me dando-me esta oportunidade de poder dizer a alguns daqueles que me criticaram, incrédulos, que afinal, com amor, imaginação e persistência a minha equipa de amigos, criou o maior cartaz turístico da Madeira.
Há um aspeto que não posso deixar de mencionar: todos os três Secretários que me sucederam, Dra. Conceição Estudante, Dr. Eduardo Jesus e Enga. Paula Cabaço, não só não deixaram morrer a iniciativa, mas também entusiasmaram os participantes a continuarem a realizar os seus sonhos, porque esses eram importantes para a Madeira.
O Muro da Esperança: Centenas de crianças construíram um muro com flores num apelo de paz
Como nasceu o Muro da Esperança, é uma pergunta que me põem muitas vezes. Tento sempre explicar-lhes que as crianças, como disse Pessoa, “são o melhor do Mundo”, e, portanto, ninguém melhor do que elas, poderiam dar um grito de paz, de uma pequena ilha do Atlântico, para o mundo, simbolizado nas flores. Cada uma das flores envolta no amor puro das crianças, era um apelo, quando a iniciativa nasce, contra o Muro do Berlim, que separava parentes do mesmo país. Alemães divididos pela tirania de ditadores. Alemães, tantos, que morreram ao atravessarem o muro.
Estive, muitas vezes, antes do muro cair, em Berlim Oriental, cuja vivência, entre o Oriente e o Ocidente, era abissal. Sempre considerei cruel a separação de seres-humanos, pertencentes ao mesmo povo, por um muro. Foi a partir daí que incluí no programa da Festa da Flor esta cerimónia, cujo simbolismo é património de uma riqueza espiritual, que todos os anos, comove milhares de madeirenses e turistas, quando as crianças atravessam as ruas com uma flor na mão num gesto de amor e pureza, levam nos olhos a esperança de um Mundo Melhor.
Por ironia do destino, três dias após a queda do muro, eu estive ali e, de martelo na mão, ajudei a destruir o mesmo. Povos de todo o mundo abraçaram os polícias, os soldados, as mulheres, os homens e as crianças. E lá estava eu emocionado, com tantas outras pessoas de tantos países, gritando Liberdade! Liberdade! Tão alto que ressoava no amplo espaço como se fosse uma só voz.
Hoje, o Muro da Esperança multiplicou-se por muitos muros, em diversas localidades da Madeira, como um apelo à Paz e que, em vez de metralhadoras, cresçam flores em todos os recantos do mundo.
As ruas do Funchal registam milhares de turistas que disfrutam de um convívio único, alegre e agradabilíssimo emoldurado pelo ritmo dos cantares e das danças dos grupos de folclore.
Na pessoa do Sr. Secretário Regional do Turismo e Cultura, Dr. Eduardo Jesus, envolvo num abraço de parabéns todos aqueles que, com tanto amor, construíram a Festa da Flor, cujo sucesso percorre o mundo como uma mensagem de beleza e poesia, testemunhando a capacidade criativa dos madeirenses.
João Carlos Abreu