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Sobre a disputa interna dos socialistas

A esperada saída de cena de Vasco Cordeiro deu lugar à aguardada candidatura de Francisco César à liderança da estrutura regional socialista. O partido que Medeiros Ferreira considerava ser «o melhor partido socialista do país», vai a votos com o futuro completamente definido, mas com esse futuro profundamente incerto. Se muitos, muitas vezes, têm criticado o rumo da força política que governou ininterruptamente a região durante vinte e quatro anos, de forma mais contundente nos tempos mais recentes, muitos outros mantêm, ou um silêncio sepulcral, ou uma devoção estridente sobre a perfeição dos caminhos trilhados, agora prestes a ser conduzidos pelo filho de Carlos César. Não devemos ter vergonha da família, mas também não a devemos esconder.
O declínio que o partido tem vindo a sentir, sendo normal, tem igualmente as suas justificações. Cada vez maior afastamento entre quem exerceu o poder e o eleitorado, visível em iniciativas previamente definidas com intervenções combinadas, evitando situações potencialmente mal geridas, e a criação de momentos de aperto para as lideranças. Existência de múltiplos vícios de poder, amplamente noticiados pela comunicação social regional e nacional, como o benefício a familiares e amigos em concursos públicos, que ao invés de serem censurados publicamente pela liderança, eram por ela justificados, levando a que as pessoas comuns julgassem que estariam apenas uns a encobrir os outros. O protelamento de questões pendentes, regionais e nacionais quando o partido de governo era o mesmo, como ainda é o caso do estabelecimento prisional, como se gerir expetativas fosse governar, apenas a pensar no ato eleitoral seguinte. A preferência pelo seguidismo, em detrimento da competência.
Apesar da grande proximidade de Vasco Cordeiro aos problemas das pessoas, de algumas propostas muito pertinentes, como a criação de listas eleitorais abertas, da sua generosidade e lealdade genuínas, não foi nunca capaz de se afastar, e de afastar os seus protagonistas, dos excessos da administração anterior. A mesma, agora na oposição, que encabeçará os despojos de uma força política que se virou para dentro, através de procedimentos administrativos e circunstâncias estatutárias, privilegiando o pensamento único, e ostracizando qualquer um, fosse para lugares menores da hierarquia dirigente, fosse mesmo para fora dela, que tivesse uma opinião contrária às evidências resultantes do secretariado, mesmo que essas divergências fossem manifestadas internamente.
E assim chegamos à situação contemporânea e ao momento atual. Os nomes que acompanham Francisco César são, na generalidade, pessoas que têm beneficiado das prebendas por si distribuídas ou se encontram na expetativa de delas virem a beneficiar, ou saudosos do tempo em que Carlos César exerceu o poder, utilizando-o para manter uma corte de estimáveis quadros a quem recorria quando disso tivesse necessidade. Os que lhe censuram os comportamentos, a atitude pretensiosa, que têm vindo a criticar o trilho que o partido tem vindo a tomar desde, pelo menos, há doze anos, encontram-se nas franjas do poder, dos lugares de eleição certa nas autarquias, no parlamento regional e nacional, agora que o poder executivo secou e não se sabe muito bem quando voltará a ser frutuoso. Na maior parte são nomes válidos, que foram deixados de parte, saneados, porque têm pensamento próprio, demasiado pensamento próprio, o que é sempre inconveniente para quem tem a função de gerir. Não deverão apresentar candidato, pois parece ser mais um grito de alerta para que, chegado o futuro, esse grito seja lembrado. Mesmo que fosse proveitoso para a discussão, estão certos de que perderiam.
A primeira indicação de que o partido se começou a fechar sobre si próprio, e manteve esse caminho durante estes anos, foi a escolha de quem haveria de suceder a Carlos César. De forma unânime, foi noticiado na altura, Vasco Cordeiro foi indigitado para presidir à estrutura regional socialista, e com isso ser o candidato a presidente do executivo regional. Sem oposição, com distribuição de responsabilidades, de cargos e de poder. O contrário do que foi feito na Madeira, quando Albuquerque teve de subir a pulso, e enfrentar um secretário regional de Alberto João Jardim. E ganhou, ganhando o partido, saneando o passado e construindo a sua equipa. Francisco César não esperaria tão cedo assumir as funções que o destino lhe tinha prometido, mas poderá desta forma eternizar-se no poder e naquilo que ele dá, sem ter de dar contas a ninguém. Mesmo que o PS/A se mantenha moribundo durante os anos que aí vêm.

Fernando Marta

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