Há um ano choviam criticas sobre o mau desempenho da equipa do Santa Clara no campeonato da Primeira Liga de futebol, culminado com um desastroso último lugar, a pior classificação nas oito participações.
O fenómeno das redes sociais, que desde há uns anos permite a qualquer criatura, preparada ou impreparada, iletrada ou não, brotar asneira, foi o canal preferencial para classificar a nova administração da Sociedade Anónima Desportiva (SAD) de tudo o que lhe estava no fel.
A explicação de ter assumido o controlo da SAD já com os treinos a decorrerem e a 20 dias do início do campeonato, inviabilizando a construção de uma equipa com capacidade para uma participação condigna, nunca foi tida em consideração. Escreveram os maiores disparates, muitos ofensivos e até passíveis de procedimentos criminais.
Alertada ser a composição da equipa demasiado frágil, a nova administração procurou, através de emergentes talentos brasileiros, colmatar as falhas. Por várias razões, desde a adaptação, à qualidade, ao rendimento e à sucessão de resultados negativos, as exibições da maioria não foram convincentes. Muitas alterações ocorreram. As mudanças dos treinadores Mário Silva e Jorge Simão e as entradas em Janeiro de jogadores que se pensavam serem reforços, não surtiram o efeito desejado.
Além de o grupo não ter um número de jogadores com as credenciais indispensáveis para jogarem numa Liga exigente, somaram-se o factor sorte e os problemas no interior do grupo, reflectindo-se no campo. Os resultados negativos sucederam-se.
O grupo construído pela anterior administração, de acordo com as capacidades financeiras, também não apresentava garantias.
Com a afluência de processos, só o forte músculo monetário da empresa liderada por Bruno Vicintin impediu a SAD do Santa Clara de atravessar períodos muito complicados. A manterem-se os mesmos investidores, não havia rendimentos para pagar as muitas dívidas surgidas e as despesas do dia-a-dia. O Santa Clara, clube e sociedade, seguiria o exemplo do Vitória FC, de Setúbal: queda abrupta e insolvência!
QUANDO NO FINAL do mês de Abril do ano passado a administração concluiu a dificuldade de permanecer na Primeira Liga, deitou mãos à composição do plantel para uma Segunda Liga muito exigente e muito equilibrada. Dispondo de capital para investir, fê-lo com discernimento, com a visão de dotá-lo com atletas experientes nos sectores defensivo e ofensivo, mesclado com a irreverência de um grupo de jovens. Dotou a equipa de jogadores com valia para serem titulares quando surgissem lesões, suspensões ou abaixamentos de forma. Cada posição tinha mais do que um elemento ao mesmo nível. Se assim não fosse, não seria fácil colmatar a longa ausência de David Bruno e agora de Lucas Soares, entrando um Diogo Calila com veia goleadora. Nem de Serginho no meio campo.
Não foi por acaso que a primeira ou das primeiras contratações recaiu mo defesa Luís Rocha. Com 37 anos de idade, revela apetência para gerir o grupo e tem seis subidas à Primeira Liga nas últimas sete épocas.
Com um modelo de jogo assente numa defesa coriácea, reflectida nos 19 golos sofridos, a equipa chega à última jornada com o principal objectivo concretizado e com uma série de recordes estabelecidos. Um deles foi o de ter conseguido o que nunca foi obtido: não averbar uma derrota nos campos dos adversários. Nos 17 jogos do campeonato e nos dois da Taça de Portugal, venceu 10 e empatou 9!.
Em 21 das 33 jornadas, o Santa Clara ocupou o primeiro lugar. Para mantê-lo tem de ganhar à União de Leiria esta tarde. Um jogo muito complicado, a exemplo dos anteriores. Com uma enchente no estádio, porque as pessoas só no final despertaram, seria um desgosto não ver o a equipa campeã pela segunda vez.
MIGUEL SOUSA TAVARES é um dos muitos comentadores neste país. Fala e escreve sobre tudo. O estilo é carrancudo e o teor é de dono de toda a opinião. Inclui-se no lote de alguns que abordam o futebol para defenderem os clubes do costume. Miguel intercede, intransigentemente, pelo FC Porto. Uma vez por outra intromete-se em áreas que não tem o profundo conhecimento. Por isso mete água.
No último escrito no jornal “Record” classifica de “lastimável” o actual estado do relvado do estádio de São Miguel. Baseou-se na suspensão do jogo da Taça de Portugal com o FC Porto. Uma conclusão isolada, por isso leviana e errada.
Há 23 anos catalogou o relvado de “batatal” porque o estado em que ficou durante um jogo com o FC Porto foi péssimo. Quando chovia a relva rapidamente ficava revolta. Quando não chovia pedaços de relva levantavam após os 10 minutos iniciais. Teve razão. Rotulá-lo hoje de “lastimável” é desajustado e impreciso.
O jogo com o seu clube foi o único que assistiu pela televisão no estádio de São Miguel. Antes de escrever não se preocupou em ver as classificações do relvado em grande parte da época passada e nesta. Provavelmente nem sabe que existem.
NUMA ILHA onde a chuva é uma constante, com aguaceiros fortes, prolongados por vezes, é natural que um relvado com problemas de nascença tenha um escoamento mais demorado dos que receberam a areia e a terra apropriadas. Aconteceu. Mesmo com a evidente melhoria, não está livre de igual situação repetir-se.
Desde Janeiro de 2023, quando houve intervenção da SAD do Santa Clara, o campo de jogo recebeu da equipa da Liga Portugal 7 classificações de 4 ou mais, no máximo de 5 pontos, nos 10 jogos finais da Primeira Liga. Neste campeonato, nos 19 jogos realizados, teve uma única nota negativa (2,50), a 28 de Janeiro, num período de muita chuva que apanhou, uns dias depois, o tal jogo com o FC Porto. Nos restantes as pontuações atingiram os 4 ou mais ou próximo dos 4.
A corroborar o que escrevo, a Comissão Técnica de Vistorias da Liga, na inspecção de Novembro, atribuiu ao relvado do estádio de São Miguel a classificação de “muito bom”, numa avaliação final de 80%, sendo a escala máxima de 95%. Os outros dois níveis de classificação são 2 (75%) e 3 (55%). Em todos os parâmetros não houve nenhum nível 3.
Escrever “lastimável” apenas por ter sido num jogo com um mediatismo muito superior, frente à sua equipa, e por isso assistiu, é incorrecto e imprudente. Não teve critério na avaliação porque analisou uma situação em detrimento de 18 jogos ali disputados desde 27 de Julho do ano passado. Fica-lhe mal para mais quando evidencia saber de tudo. Afinal…
José Silva