Dizem que todos choram, que a Humanidade inteira geme sob o acicatedador e que esse sofrimento é o preço do pecado introduzido na Terrapelos “nossos primeiros pais”—Adão e Eva.
Afirmam outros que as dores e aflições deste mundo são o meio de que Deus se vale para experimentar-nos e aferir a nossa fé, ou para aumentar os nossos méritos, a fim de que maiores sejam nossos gozos no paraíso.
Se é assim, por que uns sofrem mais do que outros? Por que alguns vivem apenas algumas horas, sem pelo menos tomar consciência de si mesmos, enquanto outros têm de viver sessenta, oitenta ou cem anos, conhecendo toda a sorte de agruras? Por que uns nascem belos, saudáveis, e assim atravessam toda a existência, enquanto outros nascem monstruosos e enfermiços, pré-condenados a uma vida miserável e dolorosa? Por que uns vêm ao mundo em ambientes sadios, em que recebem fina educação e aprendem a cultivar as virtudes, ao passo que outros surgem em meios sórdidos, onde medram os vícios mais infamantes e lhes é ensinado a detestar o trabalho, a furtar e até a matar, meios esses que são verdadeiras antecâmaras de salões hospitalares ou de cubículos penitenciários?
A conceção de que as misérias desta vida são decorrências do pecado original, ou provações necessárias a todas as almas, para que, depois de sua passagem por este mundo, saibam apreciar melhor as alegrias e as doçuras da mansão celestial, forçoso é convir, não explica essas anomalias e diversidades, e há induzido muitos homens a descrerem por completo da Providência, ou seja, da sabedoria suprema com que Deus conduz todas as coisas.
Estava reservado ao Espiritismo, o Consolador prometido pelo Cristo, oferecer o esclarecimento desse ponto, sem negar nem infirmar nenhum dos atributos da Divindade.
O sofrimento, segundo a Doutrina Espírita, é a consequência inelutável da incompreensão e dos transviamentos da Lei que rege a evolução humana.
Sendo Deus soberanamente bom e justo, não haveria de permitir que fôssemos excruciados, salvo por uma boa razão ou uma causa justa; assim, se sofremos é porque, por ignorância ou rebeldia, ficamos em débitocomaLei,seja nesta ou em anteriores encarnações.
Criados para a felicidade completa, só a conheceremos, entretanto, quando formos perfeitos; qualquer jaça ou falha de caráter interdita-nos a entrada nos mundos venturosos e, pois, é através das existências sucessivas, neste e em outros planetas, que nos vamos purificando e engrandecendo, pondo-nos em condições de fruir a deleitável companhia das almas santificadas.
Quanto maiores tenham sido nossas quedas, tanto mais enérgico precisa ser o remédio destinado a curar nossas chagas; então, aqueles que muito sofrem são os que mais culpas têm a expiar, e devem alegrar-se à ideia de que as lágrimas do sofrimento, suportado com paciência e resignação, lavam a consciência e acrisolam o espírito, constituindo-se, por assim dizer, o preço com que se adquirem as mais suaves consolações na vida futura.
Explicada a missão providencial da dor e sua benéfica influência na reforma e melhoria das almas, agora, já podemos compreender o alcance das palavras do Mestre, quando proclamava:“Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados”. (Mateus, 5:5.)
Rodolfo Calligaris
Livro: O Sermão da Montanha