A boutique Flor do Campo, uma das primeiras lojas de pronto a vestir no concelho da Ribeira Grande, está na família de Vitória Paiva desde a sua fundação em 1983. No dia 1 de Maio deste ano, inauguraram a casa de chá, tapas e vinhos Museu do Leite, um projecto que não só homenageia a tradição local como também preconiza a criação de um verdadeiro museu dedicado à cultura leiteira na freguesia da Maia.
Correio dos Açores – Pode falar-nos um pouco sobre a história da Flor do Campo?
Vitória Paiva (proprietária do Museu do Leite) – A Flor do Campo, deve o seu nome e conceito à minha avó materna, Maria da Conceição Serpa Costa Rita que, juntamente com 4 dos seus 6 filhos, abriu em 1983 as portas de um dos primeiros estabelecimentos de pronto a vestir do concelho. Vendiam-se tecidos, malas de viagem, confecção de homem, mulher e criança, representavam-se as melhores fábricas nacionais e criou-se um espaço dedicado à qualidade da produção nacional.
Mais tarde, e já sob a gerência individual da minha mãe, Geraldina Rita Paiva, o negócio expandiu e o conceito alargou-se para a ourivesaria, prataria portuguesa e bordados.
De que modo é que este negócio familiar foi crescendo e se foi inserindo na própria história da freguesia da Maia?
A Flor do Campo tornou-se num estabelecimento de referência para muitos dos que vivem na Maia, desde logo porque a oferta comercial era escassa nos anos 90, mas também pela confiança que os nossos clientes nos depositaram ao longo de várias gerações. Por exemplo, uma cliente que ao comprar o enxoval de comunhão para a neta, relembra que o vestido de noiva da filha também fora comprado connosco. São relações que perduram no tempo.
Também ainda há quem se recorde das passagens de modelos protagonizadas pelos seus filhos e cujas roupas acabavam frequentemente na árvore de Natal, ou o “Pai Natal da Flor do Campo”, uma tradição que recuperamos em 2023, com distribuição de presentes por toda a freguesia.
O que a inspirou a criar o Museu do Leite?
A palavra museu remete para tradição, cultura e conservação. Esta também é a missão do nosso novo espaço – celebrar a produção açoriana e contribuir para a valorização do seu património.
Ademais, a freguesia da Maia, com a sua herança nas agro-indústrias do chá e do tabaco, patentes nas unidades fabris e museológicas existentes, não contava ainda com uma referência explícita à cultura leiteira. Para além de objectos afectos a esta actividade, no seio do espaço do Museu do Leite também se poderá aprender sobre a produção leiteira através de posters temáticos.
A criação de gado para produção leiteira é a actividade económica com maior impacto na paisagem, na organização do território e até na cultura e património da região. A história desta actividade é também a história da freguesia da Maia. Tanto dos seus avós, como dos actuais jovens agricultores. Creio que não haverá outra matéria-prima tão estruturante para a identidade da Região, motivo pelo qual defendemos o desenvolvimento de uma unidade museológica.
Sempre teve a intenção de dar continuidade ou preservar o negócio de família?
Comecei muito cedo a tomar conta da loja, a atender clientes, a escolher mercadoria. E, mesmo durante os anos em que estive fora da ilha, as ligações ao negócio não esmoreceram. Com o meu regresso a São Miguel, tornou-se natural assumir um papel activo na próxima fase do projecto familiar. Senti, todavia, a necessidade de encontrar um ângulo diferente para o conceito da Flor do Campo com novas respostas para o consumidor actual.
Como tem sido a adesão do público ao Museu do Leite?
Temos sentido um carinho especial por quem nos visita. Os locais manifestam alegria, sentem que o espaço celebra a sua cultura, que valoriza a freguesia. Alguns clientes mais assíduos, motivados pelo projecto, deram contributos muito generosos para a decoração do Museu do Leite – desde bilhas, rendas antigas e louças.
Por outro lado, os turistas mostram grande apreço pelo carácter do espaço, pela sua autenticidade, atendimento personalizado e desfrutam de uma experiência multissensorial, com sabores, cores, cheiros e música com marca nacional.
Quais são as especialidades da parte da cafetaria? Há algum produto regional que se destaque particularmente?
O Museu do Leite celebra a qualidade de produtos locais – lacticínios, chá, massa sovada, vinhos, conservas, pastelaria e produções de cooperativas de desenvolvimento local e com o primado de economia solidária. Temos orgulho em representar o pequeno produtor, o jovem empreendedor, o artesão, bem como as organizações que os apoiam.
O que podemos esperar do Museu do Leite nos próximos anos?
O projecto Museu do Leite – Açores é maior do que a casa de chá que o acolhe de momento. Acreditamos na relevância do desenvolvimento de uma verdadeira unidade museológica dedicada à cultura leiteira e seu impacto no território e na população. Para já, contudo, temos para quem nos visita um chá com leite, como se bebe na Maia e estamos muito orgulhosos disso.
Daniela Canha