O candidato do PS/A às eleições europeias do próximo Domingo visitou o jornal Correio dos Açores, esteve reunido com a Direcção e, em entrevista a um dos jornalistas, falou da importância da União Europeia para o dia-a-dia dos açorianos, quer sejam empresários, empreendedores, agricultores, pescadores e sociedade civil no seu conjunto. E deixa uma mensagem bem vincada: sem a União Europeia, os Açores não seriam o que são hoje, apesar das dificuldades que ainda existem e que precisam ser ultrapassadas com a presença açoriana em Bruxelas.
Correio dos Açores – Como está a decorrer nos Açores a campanha eleitoral para o Parlamento Europeu?
André Franqueira Rodrigues (candidato do PS/Açores ao Parlamento Europeu) – Tem corrido com o entusiasmo de quem tem um projecto político próprio e que considera que estas eleições europeias são muito importantes para o futuro dos Açores. Isto porque, das instâncias comunitárias, do Parlamento Europeu, emana 80% da legislação que depois sai do Parlamento Nacional e do Parlamento Regional, sobretudo, em áreas que são tão importantes para os Açores como a agricultura, as pescas, o ambiente, a sustentabilidade, as acessibilidades. Tudo isto, hoje em dia, tem uma primeira conformação jurídica no Parlamento Europeu. Por isso, estas eleições têm que ser vistas do ponto de vista da necessidade de apelarmos, em primeiro lugar, à participação dos açorianos. Os Açores que hoje somos e, sobretudo, os Açores que queremos ser, resultam muito dessa nossa integração europeia em 1986. Nem tudo resultou como desejaríamos, nem tudo funcionou como nós gostaríamos, dos sucessivos governos de diferentes partidos. Não tenho hoje dúvidas em afirmar que os Açores são uma região substancialmente diferente do que aquela que existia antes da nossa integração europeia. Isto não significa que não temos problemas. Continuamos a ter problemas estruturais que carecem de uma atenção especial e de políticas que possam acelerar a convergência e a coesão dos Açores em termos sociais, territoriais e económicos. Este esforço tem que ser feito. O exercício que os açorianos devem fazer é que Açores não seriam o que são se não fizéssemos parte desse mercado único e desse espaço único.
O que os açorianos dizem é que entram milhões de Euros da União Europeia nos Açores e continuámos a ter os mesmos problemas…
Não continuámos a ter os mesmos problemas. Os açorianos não dizem isso porque sentem bem na pele o desenvolvimento que nós temos. Por exemplo, hoje em dia, os Açores têm uma classe média que, apesar de tudo, tem outro vigor e tem outra dimensão do que aquela que existia antes da nossa integração europeia. Temos hoje índices de desenvolvimento, do ponto de vista de rendimento, que são substancialmente diferentes do que aqueles que existiam antes de 1986. Isso verifica-se na educação, nas questões próprias da salubridade das famílias e das casas açorianas. Se olharmos para os indicadores sociais anteriores a 1986, se olharmos para o nosso parque habitacional, se olharmos para aquilo que eram as nossas infraestruturas, tudo isto sofreu uma transformação muito significativa. Agora dir-me-á assim: ‘Mas continuamos a ser uma das regiões mais pobres’.
Por partirmos de um patamar de desenvolvimento mais baixo, não teríamos de crescer mais que os nossos parceiros na União Europeia?
O que acontece é que temos dificuldades que outros não têm. Estamos afastados dos grandes centros europeus, temos problemas estruturais que outros não tinham. Por exemplo, há quem fale dos países do leste e faça uma comparação com o nosso país. No entanto, o índice educacional desses países, a base de partida é muito superior à portuguesa. É preciso ver que o papel e a análise estatística aceita diferentes perspectivas. Agora, não tenho dúvidas em afirmar que, apesar dos problemas estruturais que ainda temos e que carecem de políticas mais activas para acelerar o nosso desenvolvimento, ainda assim o balanço é bastante positivo.
Qual é o motivo para os açorianos irem votar no dia 9 (Domingo)?
As eleições europeias, apesar de parecer que é algo distante para eleger representantes do nosso país para o Parlamento Europeu, são eleições que, de facto, têm a ver com a nossa vida quotidiana. É no Parlamento Europeu que se decide muitas das regras com os quais estamos confrontados no nosso dia-a-dia, quer na área dos transportes, quer na área do ambiente, quer na área da agricultura, quer na área das pescas, quer na área da economia…
Vai ao Parlamento Europeu defender o POSEI Transportes?
Vou ao Parlamento Europeu defender aquilo que nós temos no nosso manifesto que é a necessidade de termos uma alocação específica no âmbito das regiões ultraperiféricas que possa servir para termos transportes de mercadorias inter-ilhas; dos Açores para o exterior e do exterior para os Açores, para resolver problemas de constrangimentos que temos na nossa economia.
Às vezes, as pessoas esquecem-se que já temos uma alocação específica no âmbito das regiões ultraperiféricas para o transporte aéreo inter-ilhas que ronda os 76 milhões de euros. Não temos uma alocação semelhante para o transporte de mercadorias por via marítima e, no nosso manifesto, defendemos este objectivo. Dir-me-á que isso é o POSEI Transportes. O nome em si, para nós, não é o mais significativo. O mais significativo é criar condições para que o nosso transporte marítimo não seja alvo desses constrangimentos para que possamos melhorar as condições de competitividade da nossa economia porque só assim é que podemos aceder, verdadeiramente, ao mercado único.
O mercado único não foi feito apenas para os cidadãos europeus que vivem no centro da Europa, foi feito para todos nós. O mercado único contemplou na sua origem a liberdade de circulação de pessoas, de mercadorias, de capitais e de serviços e precisamos de ter em conta e atender às especificidades que os Açores têm. Não podemos ser competitivos nem podemos ter igualdade de oportunidades perante os outros se continuarmos a ter os constrangimentos que temos ao nível, nomeadamente, ao transporte de mercadorias por via marítima.
A União Europeia tem a tendência de regulamentar genericamente sem ter em conta as especificidades de regiões como os Açores. O que vai fazer para alterar essa tendência?
É importante podemos verificar isso mesmo nos últimos cinco anos em resultado da falta que nos fez não termos uma voz açoriana no Parlamento Europeu. É determinante acompanhar o trabalho que é desenvolvido nas comissões parlamentares, especificamente, da agricultura, das pescas ou do desenvolvimento rural. Muitas vezes, a introdução de uma pequena frase num relatório pode ser suficiente para salvaguardar especificidades que existem nos Açores. Isto já aconteceu na agricultura e nas pescas. É fundamental ter alguém que possa sensibilizar para a nossa realidade que é diferente e possa, inclusivamente, trazer pessoas, colegas do Parlamento Europeu e de outras instâncias comunitárias aos Açores para se perceberem que aqui também é Europa e é uma Europa que se projecta no Oceano Atlântico e têm condições diferentes do que aquelas que existem no centro da União Europeia.
Já está a pensar no seu Gabinete em Bruxelas?
Já estou a pensar, até porque existe esta necessidade. O Parlamento Europeu toma posse no dia 16 de Julho, no entanto, antes disso, e contrariamente ao que sucede com a experiência política portuguesa, já existe um conjunto de reuniões que ocorrem logo a seguir às eleições. Irei participar em algumas dessas reuniões ainda antes da tomada de posse se, entretanto, for – como espero ser – eleito ao Parlamento Europeu. E, por isso, ainda antes da tomada de posse há a necessidade de termos pensado alguns elementos do nosso gabinete para poder corresponder, nomeadamente, a quais comissões é que fazemos parte. Tudo isto é decidido antes da tomada de posse.
E quais são as Comissões?
Como representante dos Açores, as áreas de excelência e importantes para a nossa região continuam a ser as mais óbvias: agricultura; pesca e desenvolvimento rural.
Será um defensor do aumento do envelope financeiro do POSEI Agricultura?
O POSEI Agricultura não é revisto desde 2009. Muita coisa mudou desde então: o aumento de custos das matérias-primas; custos de contexto; custos de transportes. O que não se alterou no POSEI Agricultura que tem um envelope a rondar os 76 milhões de euros, foram duas coisas: em primeiro lugar, a necessidade de percebermos todos que há quem na União Europeia tenha vontade e interesse em acabar com o POSEI; e em segundo lugar, entendo que ele não só se deve manter como deve ser reforçado porque existe características muito próprias que só atendendo a essas especificidades é que temos condições para competir no tal mercado único de que falei.
A agricultura açoriana é fortemente subsidiada, mas a agricultura portuguesa também é fortemente subsidiada, a agricultura francesa é fortemente subsidiada, a agricultura alemã é fortemente subsidiada. Toda a agricultura europeia, se quisermos, é fortemente subsidiada porque esta é a única forma que nós temos dos produtos alimentares chegarem à mesa dos consumidores a preços acessíveis e de forma sustentável.
Dito isto, defendo o reforço do POSEI e defendo que, a partir de 2025, quando se começar as primeiras conversas relativamente à discussão do novo quadro plurianual, devemos manter uma política agrícola comum robusta que possa garantir rendimento a quem trabalha porque a questão da transição verde, da transição ecológica que se fala – e que muitas vezes é vista como inimiga da política agrícola-comum. É preciso lembrar que a política agrícola-comum já tem metas e objectivos ambientais contidos na própria estrutura e arquitectura dessa política bastantes fortes.
Não há ninguém que defenda o mundo rural como um produtor ou um agricultor. Isto ganha mais relevo e maior sentido nos Açores onde os principais defensores da nossa paisagem e intérpretes daquilo que é a boa sustentabilidade ambiental, são os nossos produtores. Por isso, faz todo o sentido defender uma política agrícola-comum robusta que garanta rendimentos aos nossos agricultores.
O POSEI Pescas tramou os Açores ao não permitir a renovação da frota açoriana que é envelhecida, de madeira, muito costeira, e sem os meios tecnológicos necessários. Esta é outra das suas bandeiras?
No que diz respeito ao sector da pesca, temos dados de 2023, se a memória não me atraiçoa, em que estavam registadas cerca de 711 embarcações dos Açores, a maioria das quais com menos de 12 metros. Nós temos nos Açores uma prática de pesca artesanal, sustentável, que difere daquela que é a prática de outras regiões ultraperiféricas e de outras frotas. Precisamos, nos Açores, – que é algo que defendo -, de garantir no próximo quadro plurianual que possa haver verbas destinadas à renovação da frota. A nossa frota tem uma média de idade de cerca de 32 anos. Precisa mesmo de ser renovada. Temos de fazer uma grande sensibilização junto à União Europeia neste sentido porque há uma falta de conhecimento da nossa realidade.
Quando os Açores solicitam apoio para a monitorização que é utilizada nas embarcações, Bruxelas tende a considerar que isso significa que será aumentar o esforço de pesca. Ora, esta posição é uma profunda injustiça para os pescadores açorianos, que têm práticas de pesca sustentáveis, artesanais e amigas do ambiente. Por isso, não podem ser comparados e não há nem haverá sobre – esforço de pesca por parte da nossa frota.
Além do mais, há uma questão de segurança. Se defendemos o aumento de monitorização desta frota que está envelhecida, é porque ir pescar nas condições do mar dos Açores não é o mesmo que pescar em águas litorais com outros tipos de condições que existem no continente europeu. Aumentar e melhorar a monitorização da nossa frota de pesca não significa que vai haver um sobre-esforço de pesca. É esse trabalho que temos de fazer para permitir que haja, novamente, uma dotação orçamental para renovar a nossa frota, correspondendo à ambição dos nossos pescadores e obedecer aos critérios que já temos de sustentabilidade ecológica e de renovação de stock no que diz respeito à pesca.
A Europa nunca esteve tão perto…
É verdade, mas às vezes parece que está tão longe. Está longe no que diz respeito à matéria do peso burocrático que ainda hoje impera sobre os nossos agricultores. Por exemplo, tem havido manifestações um pouco por toda a Europa exactamente pela carga fiscal e administrativa que tem feito cair no nosso sector primário. Por outro lado, as nossas empresas queixam-se que, para concorrer a alguns concursos, é preciso quase tirar um doutoramento de economia devido à carga burocrática que recai sobre essas candidaturas. É preciso descomplicar, é necessário retirar alguma dessa carga administrativa, simplificar e ter um processo de aproximação dos cidadãos para esta Europa ser real para todos, onde todos possam aceder e aproveitar os frutos que estão ao nosso dispor.
Para isso, é preciso que ela seja inteligível e acessível a todos os cidadãos europeus.
Convença o eleitor açoriano a votar no dia 9 de Junho.
É muito importante que se vote pelo futuro da nossa Região. E isso não é um lugar-comum. Os nossos centros de saúde, as nossas escolas, as nossas infraestruturas, os nossos transportes e os nossos aeroportos apenas foram possíveis construir com o apoio da União Europeia. Sei que os Governos Regionais e as Câmaras Municipais, em muitas ocasiões, aparecem como os grandes obreiros – e são, de facto, no terreno -, mas isto não teria sido possível se não fosse a nossa integração europeia.
Outro assunto muito importante é qual o modelo de sociedade que nós queremos. O modelo de sociedade que nós queremos de partilha, de solidariedade, de defesa do Estado de Direito Democrático, de tolerância e de respeito pela diferença de uns e dos outros está em causa nas próximas eleições.
A União Europeia está hoje constrangida, com grandes e graves ameaças em termos geopolíticos, com uma guerra à porta que não acontecia há décadas, com problemas relativamente ao alargamento depois do último alargamento que ocorreu há mais de 20 anos com mais de 10 países – há agora nove países para entrar -, com problemas aos recursos próprios relativamente à política de coesão, à política agrícola que representam dois terços do Orçamento Comunitário. E tudo isto numa convulsão muito grande de incerteza em relação ao futuro que necessita que nós, europeus, participemos nesse debate. É a própria ideia da União Europeia, – que, do meu ponto de vista, é o mais belo projecto político construído ao longo do último século pelos Homens, que está em causa. É na defesa deste projecto político, por aquilo que representa em termos de valores para nós como cidadãos que prezamos a democracia, que devemos ir participar neste processo e votar.
João Paz