Paulo Nascimento Cabral, candidato da AD ao Parlamento Europeu
Correio dos Açores – Como está a decorrer a campanha eleitoral?
Paulo Nascimento Cabral (Candidato da AD ao Parlamento Europeu) – Está a correr bastante bem. Tenho sentido um grande apoio das pessoas, nomeadamente de velhos conhecidos. E isto, para mim, é uma grande mais-valia, o facto de ter trabalhado, durante mais de 10 anos, nas instituições europeias e ter que lidar com todas essas entidades, associações, representativas da agricultura, das pescas e da sociedade civil.
Basicamente, a campanha tem sido não só de contacto porta-a-porta com as pessoas que têm uma grande aceitação, e revejo velhos amigos ao longo destes anos todos, que temos travado várias lutas e em que temos feito um trabalho em conjunto. Portanto, é muito gratificante estar com estas pessoas com quem, ao longo destes anos, trabalhei, pedi apoio, pedi ajuda, colaboraram com o nosso projecto a nível europeu com as eurodeputadas Sofia Ribeiro e, anteriormente, a eurodeputada Maria do Céu Patrão Neves. Temos aqui a continuação deste trabalho. Tem sido bastante positivo.
E as pessoas sentem-se mobilizadas??
As pessoas estão mobilizadas. Pelo menos têm noção da importância das eleições europeias. Não encontrei nesta campanha quem me dissesse que não sabia que ia haver eleições e não encontrei ninguém que me dissesse que a União Europeia não era relevante para aquelas que são as prioridades da Região. Agora, esta é tradicionalmente e historicamente uma eleição menos participada. Há cinco anos apenas tivemos 20% de participação, ou seja, quatro em cada cinco açorianos não votaram. Isto é algo que nos envergonha e que nos deve fazer mudar. Não pela questão de qualquer tipo de pagamento ou de retribuição por aquilo que a União Europeia nos dá, mas, sim, pela afirmação europeísta da Região no projecto europeu.
Os açorianos dizem que entram milhões da União Europeia nos Açores mas os problemas continuam…
Percebo esta perplexidade de alguns açorianos quando temos mais de 5 mil milhões da União Europeia desde a nossa adesão e que ainda temos indiciadores que não são os mais animadores, nem os que mais nos orgulham. Sobre isto, temos de compreender duas coisas. Em primeiro lugar, os Açores são uma região ultraperiférica com especificidades próprias. Além de sermos uma região ultraperiférica, somos arquipelágicos, somos nove ilhas. Temos aqui uma grande distância do continente europeu, temos uma dificuldade de acesso às cadeias de distribuição de matérias-primas, e exportação de produtos de valor acrescentado. Temos outra limitação que, a meu ver, é muito importante: muitos destes apoios da União Europeia vêm para sectores que podem não ter um desenvolvimento estratégico mas que servem para nos Açores, por exemplo, termos alimentos a preços acessíveis, uma produção agrícola e das pescas que sejam comportáveis para aquilo que são as nossas realidades. Há investimentos europeus que não se traduzem naquilo que é uma economia produtiva, digamos assim, mas apenas uma compensação nos sobre custos da realidade insular e arquipelágica dos Açores.
Por estarmos num patamar mais abaixo não deveríamos crescer mais rápido para chegarmos ao nível dos parceiros europeus?
Sim. Perdemos, talvez, muitos anos numa lógica de distribuição de fundos e não de investimentos. Éramos campeões da execução dos fundos, mas não significa que gastávamos bem esses fundos. Penso que, de alguns anos para cá, estamos a mudar o paradigma e começar a perceber que estes apoios são fundamentais para a compensação da ultraperiferia. No entanto, ao mesmo tempo, temos de transformar a nossa economia. Temos de estar a par daquelas que são as transições energéticas, as transições ambientais, as transições vitais para estarmos cada vez melhor preparados para um o mundo pós-2030. Manifesto aqui alguma preocupação, mas que não me demove daquilo que é a ambição e a motivação profunda de defender os Açores e os açorianos no Parlamento Europeu se assim for essa vontade dos açorianos. Mas, tenho alguma preocupação de que na próxima revisão do quadro plurianual haja uma alteração das regras e que nós possamos ter aqui algum tipo de necessidade de adaptação a essas novas regras e novas formas de ver o fundo europeu. Uma coisa é certa: O grande volume de fundos europeus que recebemos, quer do PO – Programa Operacional 2030, quer do PRR, penso que não se irão repetir.
E vêm aí mais 2 mil milhões de euros do Plano Operacional 2030 e do PRR…
Este é o bolo até 2027. Após 2027, que é quando o quadro financeiro termina, não sei o que vai acontecer na negociação em 2025. Obviamente que vamos fazer tudo e lutar para manter o volume de fundos que nós temos tido e, acima de tudo, garantir que há – não diria que é uma discriminação positiva – essa compensação por aquilo que é a nossa realidade para estarmos ao mesmo nível das outras regiões. Não queremos estar acima das outras regiões, não podemos é estar abaixo. A União Europeia é um projecto de coesão territorial e um projecto de coesão social. E agora o relatório da competitividade defende um novo conceito que é ‘o direito para ficar’. Temos de garantir em todas as regiões que qualquer europeu, independentemente da região onde esteja, tenha o direito a ficar lá e ter direito a todas as condições necessárias para aquilo que é a configuração da sua vida e do desenvolvimento do seu dia-a-dia.
É um defensor do POSEI Transportes…
Não só sou defensor como esta é uma proposta do PSD já há vários anos. Portanto, hoje em dia, fico muito satisfeito por ver muitos outros partidos políticos defenderem essa proposta e o que é certo é termos esta defesa há vários anos do POSEI Transportes. Esta proposta é a agregação num programa tipo POSEI, como temos o POSEI Agricultura, de todos os mecanismos de apoio ao sector dos transportes. Neste momento, temos uma parte de apoio aos transportes, nomeadamente, no POSEI Agricultura, que é o regime específico de abastecimento. Queremos pegar em toda a legislação europeia, por exemplo, gestão da transição ambiental e há verbas para descarbonização do sector dos transportes; a questão dos combustíveis eficientes e há verbas para aposta de inovação e investigação de combustíveis eficientes. Colocar tudo isto num pacote chamado POSEI Transportes, devidamente majorado e adequado às nossas necessidades. E, a partir daí, fazer as nossas próprias candidaturas a este conjunto de ferramentas que existem e termos uma celeridade nestes processos. Hoje em dia, há muitas verbas em muitos regulamentos e muitas directivas que nos passam ao lado. Se conseguirmos agregar tudo isto num instrumento específico denominado de POSEI Transportes, penso que sairíamos todos a ganhar.
Consegue ver o POSEI Transportes como uma auto-estrada dos Açores para o continente europeu…
Uma auto-estrada com dois sentidos: não só naquilo que é a mobilidade das pessoas e na importação das mercadorias, especialmente, para aquelas que fazemos aqui ao nível de utilização da nossa indústria e da nossa produção para podermos transformar aqui os nossos produtos; e, depois, garantir a exportação dos produtos a um preço competitivo. Estive, recentemente, em algumas empresas de exportação e incubadoras de empresas e uma das coisas que ouvi foi que nos Açores temos de importar coisas grandes com volume e peso, mas para exportar tem que ser coisas leves e com pouco volume e pouco peso porque se pagava muito para exportar, por via marítima, para Portugal continental e outros lugares. O transporte não pode limitar aquilo que é a nossa criatividade e a nossa capacidade de inovação e de transformação. Isto não faz sentido. Produzir em qualquer uma das nossas nove ilhas, independentemente daquilo que é produzido, tem que ter uma forma rápida de se exportar e a um preço competitivo e justo para poder colocar estes produtos em qualquer local do continente europeu. Além disso, também não pode haver discriminação inter-ilhas que é algo que tenho percebido. Por exemplo, os factores de produção em São Miguel ou na Terceira têm um custo diferente do que no Pico, em São Jorge, no Faial ou no Corvo. Isto não é bom para a coesão interna da própria Região.
A União Europeia tem a tendência para regulamentar genericamente sem ter em conta as especificidades de regiões como os Açores. Como é que se pode mudar isso?
Estou aqui acompanhado pela última eurodeputada do PSD, Sofia Ribeiro, que, de facto, fez um trabalho excepcional exactamente para evitar isto, para evitar que a União Europeia regule sem se preocupar com as especificidades dos Açores. Temos o estatuto da ultraperiferia, temos o artigo 349 do Tratado da União Europeia que garante ou obriga as instituições europeias a ter em conta o que é a nossa realidade antes de qualquer proposta legislativa. O que estamos a defender agora são as avaliações de impacto desenvolvidas pela Comissão Europeia. Queremos que, antes de qualquer proposta legislativa, haja um separador e segmento específico para as regiões ultraperiféricas. Isto não tem acontecido até agora. Temos que perceber que impacto tem nos Açores qualquer proposta legislativa da Comissão Europeia e só depois, então, perceber se precisamos de excepções ou não. Uma outra coisa que queria alertar está relacionada com as consultas públicas. Infelizmente, a Região participa muito pouco naquilo que são as consultas públicas da Comissão Europeia. São lançadas regularmente consultas públicas sobre as mais variadas áreas e uma das coisas com que eu tenho deparado tem a ver com o facto de pedir derrogações, excepções e tentar defender os interesses dos Açores e a Comissão Europeia remete para a consulta pública e diz que não há nada sobre as regiões ultraperiféricas nas consultas públicas. Por isso, é importante para nós – e comprometo-me em continuar o trabalho de proximidade que foi desenvolvido por outros eurodeputados, desde logo pela Sofia Ribeiro, – que é manter uma interação constante com as forças vivas dos Açores, quer a nível da sociedade civil, quer dos sectores da agricultura, das pescas e também do Governo dos Açores para que participem activamente sempre que saem consultas públicas com contributos porque isto faz toda a diferença.
Há quem queira acabar com o POSEI Agricultura. A Região quer não só mantê-lo como aumentar o seu envelope financeiro…
Antes de mais, quero esclarecer que o programa POSEI é um programa específico. O nome interessa, porque o POSEI é um programa específico para as regiões ultraperiféricas para fazer face aos problemas de insularidade. E o POSEI Agricultura tem sido uma luta travada, também pela antiga deputada Sofia Ribeiro, para se manter autónomo, algo que não conseguimos fazer com o POSEI Pescas, que foi extinto.
A nossa candidatura tem defendido a manutenção do POSEI como programa. Num segundo nível, defendemos um aumento da sua dotação financeira porque há já no POSEI Agricultura uma verba avultada que está a ser injectada pelo Orçamento regional. Estamos a fazer uma coisa que é da responsabilidade da União Europeia. Consideramos que a União Europeia deve compensar aquilo que já está a ser feito e que não pode ser o Governo dos Açores a assumir isto, mas sim um reajustamento do POSEI Agricultura. Estamos numa fase em que a União Europeia está a transformar aquela que é a sua visão para uma autonomia estratégia, que também é uma autonomia alimentar. E a produção de alimentos nos Açores obviamente se enquadra nesta autonomia alimentar da União Europeia. Por isso, não faz qualquer sentido os nossos agricultores serem penalizados por aquilo que é o seu afastamento e a sua insularidade quando existe um programa específico para isso que não é actualizado há muitos anos, apesar de ter sido sempre um luta constante. Uma das coisas que é preciso dizer é que manter o POSEI com o envelope financeiro que tem é perder dinheiro porque há um factor de depreciação de cerca de 2% ao ano, que significa que temos de aumentar o envelope para mantermos o mesmo nível de financiamento, face aos últimos anos.
A Comissão Europeia aboliu os apoios para a renovação da frota pesqueira. E, no caso dos Açores, isso é considerado injusto porque temos uma frota envelhecida, sem meios técnicos a bordo suficientes para a segurança. Como se pode sensibilizar a União Europeia para alterar o seu comportamento face às pescas nos Açores?
Já não há POSEI Pescas. Há agora um artigo no próprio FEAMPA (Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos, das Pescas e da Aquicultura). E, quando se extinguiu o POSEI Pescas e foi integrado neste FEAMPA, nós perdemos autonomia porque passamos a ficar integrados no Plano Nacional Mar2020 e agora Mar 2030. Não somos nós que definimos os critérios de apoio à nossa frota. Estes são definidos a nível nacional. Além disso, aumentou a burocracia e, no meu entender, o mais grave de tudo foi a perda da ligação directa com a Comissão Europeia para passar ser uma ligação com o Estado e o Estado com a União Europeia. Como vamos resolver o problema da renovação das frotas de pesca? A luta tem sido entre a ciência e aquilo que é uma visão também da ciência mas com uma preocupação social. Temos que sensibilizar a União Europeia para a renovação e modernização da nossa frota de pesca explicando que não vai aumentar o esforço de pesca, não aumenta a potência do motor e desde que haja critérios associados à segurança e até à questão da formação dos marítimos. Saiu agora uma comunicação muito interessante da Comissão Europeia sobre a transição energética nas pescas que pode ser favorável à frota de pesca dos Açores. A substituição de motores por motores mais eficientes e com menos emissões, a própria questão relacionada com as rotas da pesca para serem mais eficientes e consumirem menos combustíveis, a própria construção das embarcações serem mais eficientes para consumirem menos energia; e a própria dificuldade na transição dos motores de combustão para motores eléctricos cuja dimensão é muito superior e invalidaria termos motores eléctricos a bordo de embarcações de pesca sem aumentarmos essas mesmas embarcações.
Estes são sinais de que a Comissão Europeia vai começar a atender às nossas reivindicações. Agora é possível porque há agora um quadro que permite a renovação das frotas de pesca. Só que a União Europeia diz para sermos nós a fazer esta reconversão com os orçamentos – regional e nacional -, o que é manifestamente impossível no caso dos Açores porque não temos verbas suficientes para isso. Cria-se aqui um problema de distorção da concorrência. Os outros Estados-Membros têm dinheiro para investir no sector e nós não temos. Defendemos que a FEAMPA deve garantir este financiamento de renovação das embarcações.
Porque os açorianos devem ir votar nas eleições europeias?
Convença-me, enquanto eleitor, para votar nas eleições de Domingo.
Sofia Ribeiro (antiga deputada do PSD/A ao Parlamento Europeu e actual Secretária da Educação) – Não tenho dúvida alguma e é com toda a convicção que afirmo que Paulo do Nascimento Cabral é o candidato açoriano que temos ao Parlamento Europeu de sempre o mais bem habilitado e o mais bem preparado. Tem um histórico de trabalho no Parlamento Europeu, tive a honra e o privilégio de o ter como meu chefe do meu gabinete, também trabalhou com a professora Patrão Neves, esteve inclusivamente a trabalhar ao nível da REPER (Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia). Portanto, ele tem um longo trabalho desenvolvido, mas também um trabalho muito plural e um conhecimento muito plural. É, sem dúvida, a pessoa indicada para este cargo.
Mas antes de mais tem de me convencer a ir votar numas eleições europeias. O que ganho com as eleições europeias?
Paulo do Nascimento Cabral – Mais de 80% da nossa legislação regional é influenciada pela legislação nacional que, por sua vez, é influenciada pela legislação europeia.
Não queria ir pela dimensão dos fundos que nós recebemos, mas que são uma realidade. Acima de tudo, quero ir por tudo aquilo que acrescentamos à União Europeia. Se nós estamos afastados do centro de decisão, isso é verdade, mas também, cada vez mais, com essa deslocação do centro de interesse europeu para o leste, temos de compensar essa deslocalização para aquilo que é uma centralização no Atlântico, para a dimensão do atlantismo da União Europeia no Atlântico. Os Açores têm esta posição privilegiada e quanto mais nós voltarmos a ter peso a nível europeu na investigação do mar profundo, na exploração do espaço e investigação do espaço, naquilo que é a nossa dimensão geoestratégica entre os dois parceiros do mundo ocidental (União Europeia e os Estados Unidos), nós garantiremos aqui uma alteração desta visão para o Atlântico.
Penso que será, desta maneira, que os Açores beneficiarão daquilo que é a ultra-centralidade, como se falava recentemente. Apesar de sermos ultraperiféricos, podemos transformarmo-nos numa ultra-centralidade. É verdade que o nosso histórico de emigração tem sido mais para os Estados Unidos e Canadá do que propriamente para a Europa. Mas, o que temos assistido ultimamente é a saída dos nossos jovens talentos para os países europeus, falo dos Países Baixos, da Irlanda, da Alemanha. Vão à busca de melhores salários e condições de trabalho. Por isso, a Comissão Europeia está a desenvolver estratégias de fixação de talentos das regiões europeias e que estas estratégias têm por princípio garantir as condições necessárias para que os jovens se fixem nas suas regiões. É o direito para ficar.
Agora, se se questiona sobre as razões para os açorianos votarem Domingo, acima de tudo, é por termos aqui um princípio cívico de participação activa na definição das políticas europeias.
Isso vai mesmo ao encontro da última questão: a Europa nunca esteve tão perto?
Somos a Europa. Essa é a questão. Consideramos sempre que a Europa é longe, é Bruxelas e os países à volta de Bruxelas. De facto, há uma série de condições que são dadas aos países lá à volta a que não temos acessibilidade. Por exemplo, há um grande financiamento para a ferrovia. Como não temos ferrovia para ligar a Europa e temos de transformar isso para a questão dos transportes aéreos e marítimos que é o que nos preocupa. Nós somos a Europa. Cada vez mais somos Europa. Em qualquer edifício, inauguração e estrutura de relevo na região tem a bandeira da União Europeia e é co-financiado com fundos europeus. Beneficiamos muito por sermos europeus. Agora, acima de tudo, tem de prevalecer nos Açores um espírito de europeísmo convicto.
Temos de valorizar aquilo que é a União Europeia e aquilo que tem feito por todas as nossas ilhas e, acima de tudo, valorizar o Estatuto da Ultraperiferia e aqui faço uma referência a Mota Amaral, que é o pai deste conceito da ultraperiferia que está afirmado no Tratado de funcionamento da União Europeia no seu artigo 349.
João Paz/Filipe Torres