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Jovem de 25 anos viveu mais de cinco anos nos Açores, sente-se açoriano, tem a família na Região e hoje é piloto de aviação

Pedro Nazoliny é um jovem de 25 anos que trabalha como piloto de avião na ASL Airlines Ireland. Entre os 11 e os 16 anos e durante quase mais um ano depois de ter terminado o curso de piloto, o jovem viveu na ilha de São Miguel. Apesar de estar a residir em Lisboa, Pedro tem um grande carinho pelos Açores; quase todos os seus amigos são do arquipélago e os familiares vivem cá. Ao Correio dos Açores, Pedro Nazoliny explicou as dificuldades em arranjar emprego na área, descreve como é o dia-a-dia de um piloto e a importância da preparação e formação para garantir o bom trabalho como piloto.

Correio dos Açores – Sempre sonhou ser piloto de avião?
Pedro Nazoliny – Queria ser piloto, bombeiro ou polícia desde pequeno. Entretanto, quando tive de escolher o que queria fazer: ir para marketing, queria ser piloto, queria ser polícia ou queria trabalhar na rádio. Sempre gostei de comunicação, tanto que fui aceite numa universidade para um curso de comunicação, que foi uma candidatura que fiz na altura porque não sabia se poderia dar certo a escolha para ir para o curso de piloto. Este era um dos backups e marketing também. Acabei por ser escolhido para o curso de piloto e fui para lá.

Em que ano começou o curso de piloto?
Comecei em 2017 e acabei em 2021. Houve muitos atrasos em Portugal, inclusive a escola atrasou um bocado. Então, decidi sair de lá e ir para Espanha. Continuei a fazer o curso em Espanha, mas tive de parar cinco meses por causa da pandemia da Covid-19. Não podia fazer este curso através de plataformas online devido à componente prática. Quando voltei ao curso, as coisas andaram muito devagar. Se não contar com a parte de Portugal, demorei sensivelmente 16 meses. Comecei a trabalhar em 2023.

Quais foram as principais dificuldades no início da carreira?
Antes de ter um trabalho nesta área, tive, infelizmente, muita dificuldade para encontrar um emprego. Depois de ter acabado o curso em Novembro de 2021, fiquei parado porque havia a pandemia e não havia trabalho pelo menos para pessoas sem experiência. Mesmo pilotos com experiência não arranjavam emprego. Por isso, voltei para a ilha de São Miguel e estive a trabalhar fora da área durante cerca de um ano. Entretanto, temos de validar o curso anualmente e a licença se não estiver a trabalho. Fui para Espanha e ofereceram-me um cargo de instrutor teórico. Como estava um indeciso na altura se queria ser instrutor teórico, adiei sempre sem dizer que não. Entretanto, o meu contrato de trabalho nos Açores terminou, disse para mim mesmo que tinha de voltar para a aviação porque, caso contrário, tudo o que aprendi e os conhecimentos que conquistei começariam a desaparecer – assim dizendo. É preciso estar envolvido no meio, tanto na vertente prática como na teórica.
As entrevistas na área da aviação costumam ter várias fases. Uma delas é a componente teórica, onde és questionado por dois comandantes sobre matéria teórica. Por isso, é necessário estar sempre a estudar para saber.
A primeira grande dificuldade foi conseguir uma entrevista. Mesmo quando se consegue uma entrevista, é complicado entrar. Tive uma entrevista em que eram 80 candidatos para 10 vagas, ou seja, uma em cada oito pessoas iriam entrar. Havia pilotos com todo o tipo de experiência. Escusado será dizer que não fui aceite. Até conseguir ser chamado é pura sorte… Além de ser muito difícil ser chamado para uma entrevista, quando se é chamado, é-se, testado dos dedos ao cabelo. Não é fácil de todo. Se não estás envolvido na área, não há desculpas, nem há pena de ninguém: ou tens sorte ou não tens sorte. Tenho colegas que acabaram antes de mim e que não têm trabalho como piloto de avião na parte da aviação comercial. Sem exagerar, enviei mais de 300 candidaturas e se fui chamado em mais de três, tive sorte. É mesmo difícil. Há muita concorrência nesta área. É preciso ter o perfil psicológico que eles pretendem.

Qual foi a sensação no primeiro voo?
Vou relatar a sensação que tive no meu primeiro voo de sempre e no meu primeiro voo comercial. Na escola, pensei que não iria conseguir porque era muita coisa e podia não conseguir lidar com tudo. Quando saí do voo estava meio tonto, o que era normal, mas estava entusiasmado! Foi uma grande sensação de liberdade. Sempre sonhei pilotar um avião. É uma sensação que não consigo sentir em mais nenhum lado na minha vida. No entanto, também há um certo risco de responsabilidade porque não há ninguém para te salvar. Quando estava a ter o curso na escola, ensinaram-me a voar, a descolar e a aterrar. Depois de passar sensivelmente 20 horas, mandam-te para voar sozinho mas só depois de passar um exame. Após esse exame, somos obrigados a fazer x horas a pilotar sozinhos e outras x horas a pilotar com o instrutor. Em primeiro lugar, começamos a fazer viagens entre aeroportos diferentes e é a fase inicial, que é a fase dos voos visuais – são voos menos profissionais. De seguida, começamos a pilotar profissionalmente como se faz nas companhias aéreas: entrar nas nuvens, pilotar em condições mais adversas.
No meu primeiro voo comercial, voltei a pensar se o meu cérebro conseguiria assimilar isto tudo, era muita coisa a acontecer ao mesmo tempo. Diria que para quem está na aviação comercial não é assim tão divertido porque é exceptável que sejas profissional e que saibas o que estás a fazer. Acaba por ser um bocado doloroso porque estás a aprender muita coisa ao mesmo tempo e há muita informação que nos é dada de uma vez. Começa a ser mais divertido e satisfatório, a meu ver, quando se começa a ficar mais confortável pois conseguimos ser nós próprios. Quando acabei o meu primeiro voo comercial, senti mesmo um sentimento de tranquilidade e de paz.

Qual é a sensação de se sentir responsável por várias vidas?
No meu caso, sou um profissional altamente qualificado e não penso no dia-a-dia que tenho muitas vidas nas minhas mãos. Vou fazer bom trabalho, fui treinado para fazer bom trabalho e sei que vai correr tudo bem. Isto já faz parte da minha rotina. Além de ter as vidas das outras pessoas nas minhas mãos também tenho a minha própria vida nas minhas mãos. Não sinto uma grande responsabilidade nas minhas costas porque é um trabalho e fui formado para fazer bom trabalho. Tenho a minha mentalidade. Penso sempre nas pessoas, claro. Penso que tenho de levá-las de um local para outro, quero sempre chegar às horas previstas, ou então ainda mais cedo se for possível, e quero dar sempre a viagem mais confortável possível. Nunca penso que a vida delas está nas mãos delas. É a mesma coisa que andar na rua e pensar que tenho constantemente a minha própria vida nas minhas mãos.

Como é o dia-a-dia de um piloto?
O meu dia-a-dia mudou desde que fui para outra empresa. Agora trabalho durante a noite. Trabalho durante duas semanas, uma semana de reserva e outra em que descanso. Apesar de viver em Lisboa, voo na Europa toda menos para Lisboa. A empresa tem um horário mensal, eles mandam-me o horário e a estadia em certos sítios. Por exemplo, vou daqui para Marselha (França) e depois começo a trabalhar no dia seguinte. Como trabalho à noite, vou às 22h ou às 23h para o aeroporto, de Marselha, de onde voo para o Aeroporto Paris Charles-de-Gaulle (França), onde descanso 1h30 ou 2h. E depois vou para o Aeroporto Liege (Bélgica). Em algumas ocasiões ainda volto para Paris. É assim o meu dia-a-dia nesta empresa. Na outra empresa, o meu horário era diferente. Trabalhava durante o dia e começava, por exemplo, às 5h e acabava às 10h ou das 8h às 16h ou das 16h até à noite. Isto tudo se não houver qualquer problema. Tenho de me apresentar normalmente 1h30 antes do voo para discutir o voo com o comandante e o que vamos fazer. Na outra empresa fazia quatro a sete voos por dia. Ficamos totalmente arrebentados. No momento, não nos percebemos disso porque estamos com a adrenalina, mas quando chego ao hotel sinto mesmo o cansaço e o corpo começa a pesar.

Afirma que o desgaste é um dos aspectos mais desafiantes na profissão. Quais são os outros desafios?
Temos que ser muito fortes mentalmente. Há o desgaste físico e o psicológico, principalmente agora que estou a trabalhar à noite. Esta profissão exige muito de nós constantemente porque temos de estar sempre a estudar. É-se constantemente testado para não pensar que temos todo o peso nas costas e tenho de ir para os simuladores em cada seis meses para ser testado. Na primeira vez em que vou para os simuladores é para ver se estou capacitado para levar os passageiros e, na segunda vez que vou, é para manter a minha licença válida. Nessas duas vezes por ano em que vou para o simulador – posso ir mais vezes se a empresa achar que não estou bom o suficiente durante o trabalho – estam-me com tudo. Somos testados para todo o tipo de situações e constantemente testados durante a profissão. É stressante saber que se for ao simulador e não tiver a performance desejada ficarei sem licença. Além disto tudo, também é preciso exercitar para manter a forma física. Houve uma vez que cheguei a casa à meia-noite para depois ter um voo às 8h. Temos sempre um limite mínimo de descanso para garantir boa performance.

Como é a interacção e a comunicação com a equipa e o controle de tráfego aéreo durante um voo?
70% da comunicação com o meu colega é não-verbal. Quando comunicamos com alguém, 70% daquilo que estamos a absorver é linguagem corporal. Os pilotos estão lado-a-lado e, em princípio, nós não estamos a observar um ao outro. Então, a comunicação tem que ser sempre simples, clara e coesiva. Se eu disser que dois mais dois é quatro, não vais duvidar que é quatro. A comunicação não pode dar espaços a se’s. É preciso ser o mais simples possível, falar o menos possível – em situações de emergência, claro – e ser o mais directo possível para as pessoas não pensarem outras coisas. É preciso ter muita confiança com o outro piloto.
Sobre a comunicação com o controle de tráfego aéreo, temos de mudar de rádio várias vezes quando vamos para um país diferente. A torre sabe a que horas nós vamos chegar e quando vamos chegar. Por exemplo, quando a minha hora de chegada é às 17h e há muito tráfego a torre dá sempre ordem para fazer holding, dar voltas antes de chegar. Temos de estar sempre atentos, mas em teoria não vai acontecer nada. Dão sempre instruções se o tráfego estiver descoordenado.

Todos os aviões têm a mesma segurança? Os aviões maiores são mais seguros do que os mais pequenos?
Todos têm um nível elevados de segurança. Claro que os aviões maiores têm mais redundância porque têm quatro rodas e não duas rodas. São todos seguros no mesmo nível. A aviação aprendeu muito com os erros do passado. A segurança é o objectivo número um da aviação. Por exemplo, quando um médico faz uma cirurgia e há um problema, nem sempre é notícia para todos; quando um piloto bate com o avião, é notícia para toda a sociedade. A segurança é algo muito importante e que levamos muito a sério.

Pretende voltar aos Açores?
Gostava de voltar a viver nos Açores, só que não há muitas oportunidades no arquipélago. Inicialmente, procurei um trabalho nos Açores nesta área, era o meu objectivo inicial para a carreira. No entanto, não encontrei e procurei um emprego fora da Região.
Considero-me também açoriano. Cresci em São Miguel, a maior parte dos meus amigos estão na ilha e os familiares também estão.

Pretende acrescentar algo mais no âmbito desta entrevista?
Se eu conseguir, qualquer um consegue em qualquer área do mundo. Uso sempre muitas vezes a frase de José Mourinho como frase de motivação: ‘Não sou melhor do que ninguém, mas ninguém é melhor do que eu’. Somos capazes de tudo.

Filipe Torres
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