Já várias pessoas me perguntaram onde vou buscar inspiração para versar, com a devida e merecida acutilância, os mais diversos e diversificados temas. Respondo que são precisamente as pessoas e o dia-a-dia que me dão o mote para, de vez em quando, escarrapachar em jornal o que me vai na alma, no espírito e no coração, motivo pelo qual alguns ávidos leitores me instigam para continuar a escrever, dizendo-me que escrevo tal qual falo, que coragem e frontalidade são o apanágio da minha maneira de ser e de estar na vida, embora alguns (poucos) tecem as mais díspares e disparatadas opiniões, acerca não só do carácter da minha pessoa, mas principalmente acerca do que escrevo, chegando alguns, pasmem-se, a encomendar-me a alma ao mafarrico. Quanto a estes últimos, reservo-lhes a minha indiferença, porquanto reza o sábio ditado: – Quem lava a cabeça a burros perde o tempo e o sabão.
Existem pessoas que, durante o percurso da estrada da sua vida, por algum tempo mais ou menos longo, lograram ocupar lugares cimeiros. Quando tal se verificou, deram ordens e emitiram pareceres dignos de nota, perscrutando no infinito do firmamento as melhores e mais céleres soluções para problemas inexistentes. Aí sentem-se perfeitamente realizados e valorizados, e então incham quais pombos de papo de vento, passam a falar mais alto e, pior ainda, fazem-no em bicos dos pés – se bem que de português não entendem patavina, porquanto os pontapés na gramática são uma constante. Mas passado este reinado – porque tudo na vida é perene, até mesmo a nossa própria vida é ténue –, no fim do mandado para o qual foram eleitos, finalmente voltam novamente à sua condição anterior de simples funcionários e assalariados. Depois, é vê-los tristes, cabisbaixos e subservientes.
Almejam e, após diversas peripécias dignas de registo, acabaram por ocupar, algum tempo, poisos de relevo na política ou na administração local. Quando muda o partido ou o padrinho/padreco leva um sumiço, estes espécimes são de imediato postos na prateleira, de onde nunca deveriam ter saído. Por incrível que pareça, ficam velhos/velhíssimos, emagrecem a olhos vistos, embranquece-lhes o cabelo, senão mesmo quando ficam com a careca à mostra, andam aos tremeliques, o brilho na vista torna-se turvo e a pele da cara macilenta.
Esta gente nem da sua própria vida soube tomar conta, pois não percebem nem conseguiram aprender nada da poda durante uma vida inteira. Se não fossem os subsídios, a maioria há muito estaria a calcorrear a estrada da incerteza e do desânimo. Até à falência dista apenas um passo. Esqueceram-se do significado da pujança que representa o TRABALHO. Julgaram que o resto da sua vida seria um constante cirandar de cá para lá, exigindo contrapartidas várias do Governo e da Comunidade Económica Europeia, frequentando feiras, exposições e certames, sem qualquer retorno de valor para a comunidade, delapidando dezenas de milhares de euros, palrando aos quatro ventos baboseiras sem sumo nem conteúdo. Na verdade, o trabalho cansa, nica e faz mossa. Toda a sua vida foi um constante navegar à vista, com o pescoço enterrado na lama e a cabeça prestes a afundar, mas o que mais lhes custa na vida é ver a concorrência na especialidade a dar cartas e a vingar a olhos vistos.
Outros, “poucos”, saltam da ribalta e assentam arraiais no Governo, depois passam pelas finanças, onde o seu desempenho é manifestamente péssimo, mas grandemente elogiado pelos meios de comunicação social. Os favores requerem reciprocidade… Quem é que não deseja um lugarzinho ao sol? A principal ambição é regressar novamente ao ponto de partida, com as consequentes e reforçadas mordomias, pois sabem que neste poiso, por pior que seja o seu desempenho, jamais o conseguirão levar à falência, e o pobre povo pagante destes desmandos fica sempre a . . . arder.
Jaime Neves