O Cónego António Rego, do Cabido da Sé Patriarcal de Lisboa, comemora hoje os 60 anos da sua ordenação sacerdotal.
É uma referência incontornável na renovação da linguagem e da comunicação da Igreja em Portugal e também nos Açores porque, sendo ele “incuravelmente ilhéu”, aqui deixa marcas que permanecem, no afecto e na coragem.
Tinha 15 anos quando António Rego foi ordenado, na Matriz de Ponta Delgada, o que era, na altura, uma “lança em África”, pois que normalmente as ordenações decorriam na Catedral do Santíssimo Salvador de Angra. E lembro-me, do entusiasmo daquele tempo, no programa “Hoje é Domingo”, ao início da tarde de cada Domingo, no Rádio Clube de Angra, que fazia parar a cidade e que se estendeu, como sopro de espírito, a todos os Açores aonde chegavam as ondas da Voz da Terceira. Começava com o “Vitoire” de David Julien, o grande grito de júbilo pelo Concílio sonhado, fresco e vivido por tantos, no meio de tanta resistência ao que era novo, ao que era diferente. António Rego e a sua equipa, depois do toque renovador no jornal A UNIÃO, dava assim início à saga única de um padre jornalista quando muitos se interrogavam se um jornalista podia ser padre. E nunca mais parou. “Nota do Dia”, “Meditando”, Diálogo com os que sofrem”, “Esquema XIII”, “Verdade e Vida”, “Andar faz Caminho”, “Toda a Gente é Pessoa”, “ O Homem sem Tempo”, “Alfa e Omega”, “70×7”, “Palavra entre Pala-vras”, “Reflexo”, “Oitavo Dia”. Colunas de jornais, e programas de rádio e Televisão.
Nestes 60 anos de sacerdócio é bom ver juntos todos estes programas de televisão que há dez anos foram escalpelizados no livro “A Ilha e o Verbo” – Dos Vulcões da Atlântida à Galáxia Digital que em boa hora Paulo Rocha, voz autorizada no jornalismo da área religiosa, fez editar, numa grande entrevista onde, certamente não cabe uma vida como a de António Rego, mas cabem tantas vidas que marcou nestes agora 60 anos, principalmente porque me tocou interiormente ouvi-lo dizer que dentro das suas preferências pessoais, “podia falar do tempo que estive com a tribo indígena Yanomani, ou das visitas a mosteiros contemplativos. Mas, o mais emocionante foi contactar com as pequeninas comunidades de cristãos que estão escondidas, perdidas. Trazê-las para os media, rádio e televisão, no fundo é apregoar um Evangelho que está a ser vivido de forma humilde e discreta, mas que tem um valor extraordinário para a Evangelização de hoje”.
E é à sombra deste livro que tive a honra de apresentar em Ponta Delgada, já lá vão dez anos que repigo algumas notas sobre quem é este Ilhéu que domina a Palavra e vive a ilha mesmo nos horizontes mais distantes, mesmo nos tempos mais diferentes?
Capelense de gema, cujo mar conhece como poucos e regista sempre com entusiasmo crescente, a espingarda de mergulho repousa a maior parte do tempo nas memórias duma parede, tem na sua grande família, o seu outro arquipélago. Nas Capelas faz o seu ensino primário e em 1952 entra no Seminário de Angra: Foi convidado a ir para um seminário americano, de uma diocese que custeava os estudos dos alunos, mas o pai disse que “o meu filho não está à venda”. Brilha nas Letras, numa altura em que como ele próprio diz, havia uma grande distinção entre ciências e Letras. Escreve o seu primeiro artigo no Semanário a Ilha de Ponta Delgada, e na Santa Casa Mimosa que agora fez 160 anos, vive o dia-a-dia de tantos jovens de então, no estudo, no teatro, na Música, no futebol, no Escutismo e em muitas outras actividades. Ordena-se em 1964 na Igreja de São Sebastião, Matriz de Ponta Delgada, e celebra Misa Nova, ainda em latim, – decorriam os trabalhos conciliares que haveriam de adoptar em 1965 o vernáculo na liturgia, – na sua Terra, na Igreja de Nossa Senhora da Apresentação, Matriz da Ouvidoria das Capelas.
Depois, foi Angra, mais três anos, a paróquia, o jornal e a Rádio. Ondas e mais ondas, quando muitos não queriam ondas. Se calhar por isso, e embrulhada em outras rendas, um dia chegou, pelas mãos do prelado de então aquela “guia de marcha” que marcou a vida do padre Rego e a da comunicação social portuguesa em assuntos religiosos. Foi a Renascença, a RDP, a RTP e a TVI. Foi o curso na Pierre Babin em Lyon e depois foi este mundo, o nosso que se tornou dos outros e o dos outros que se tornou nosso, pela voz e pelo talento do Capelense que nunca se confinou a um estúdio, mas que fez do mundo o seu estúdio preferido.
E recordo aqui o que dele escreveu o Cardeal D. Manuel Clemente: “ António Rego tem aquela maneira açoriana de ser português, homem do mar em qualquer praia que chegue, usando os meios mais sofisticados do modo mais natural. Por isso terá os auditórios que quiser porque todos queremos ser tratados como pessoas entre pessoas – isto mesmo que ele sabe ser e fazer ser, tão espontaneamente”.
Ao Padre António Rego, nos seus 60 anos de sacerdócio, só posso desejar uma coisa: que do Outono da vida saiba fazer mil Primaveras de amor.
Santos Narciso