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Padre “avant garde” dos tempos conciliares

Neste mês de Junho, em cada ano, multiplicam-se datas e efemérides alusivas às ordenações sacerdotais que, na Diocese, decorriam, normalmente no final do ano lectivo e nas proximidades litúrgicas sempre cativantes deste mês em que Pentecostes, Corpo de Deus, Coração de Jesus e Trindade dão as mãos como festas lembradas.
E, pensando em dia de São Pedro, não podia esquecer uma destas datas e um Padre açoriano que admiro, prezo e respeito muito, por me ser símbolo de autenticidade e cumplicidade social com a palavra evangélica. Falo de Monsenhor Weber Machado Pereira que hoje, 29 de Junho, comemora os 66 anos da sua ordenação sacerdotal, em Roma, na Catedral Basílica de São João de Latrão, pelo Cardeal D. Gonfaloniere, no ano em que se licenciou em Teologia na Universidade Gregoriana daquela mesma cidade, a que se seguiria a frequência no “Goethe Institute”, na Alemanha, com uma bolsa de estudos atribuída pelo Governo alemão e, logo a seguir o Curso de Ciências Matemáticas em Lisboa e Coimbra, onde se licenciou.
Falar dos 66 anos de sacerdócio do Padre Weber Machado Pereira não é tarefa fácil, nem cabe neste Postal evocativo desta data. O Professor, o Conselheiro, o Pároco, o Formador, o Cuidador, o Denunciador e a presença anónima e constante junto dos marginalizados da sorte, são o seu verdadeiro retrato. Ciente da força da palavra, desde sempre, concretamente desde os tempos de Aluno do Seminário de Angra, com o Suplemento do jornal A União “Pensamento” de que foi fundador e um dos directores, até à actualidade, é presença assídua nos jornais e frequentemente solicitada em rádios e televisão, para além da sua participação em Congressos, Seminários, Conferências e actos culturais e cívicos.
No entanto, e tendo como lema que “Palavra sem obras é letra morta” o Padre Weber dedicou toda a sua vida à acção directa, frontal e imediata junto de quem precisa e pelas causas que abraçou, a maior delas todas a Cáritas e os sem-abrigo. Para cada momento procurou a solução possível que fosse a mais humana, a de maior proximidade e a que conferisse mais dignidade humana às pessoas abrangidas. Nunca se conformou com “institucionalização” das pessoas mas sim com trabalhar com elas com vista à sua integração. Mesmo nos abrigos que criou, gostava que os utentes lhes chamassem a “sua casa” e que pudessem ter uma chave para entrar e sair.
Os livros que publicou, “Flashes, Roteiros e Vivências” e “Denunciar, Formar e Amar”, ambos com chancela da Gráfica Açoreana Lda., proprietária deste “Correio dos Açores”. São o testemunho disto mesmo, destas duas trilogias de vida que exprimem bem o ser do “Padre dos Pobres”.
Sobre o primeiro livro, lembro-me do que escreveu D. António Marcelino: “o padre Weber tinha o dever de publicar este livro. Ele é sementeira que fica na cidade de Ponta Delgada, na Ilha de S. Miguel, na comunidade humana e cristã dos Açores e chegará a outros lados. Padres, leigos e consagrados encontram aqui um caminho aberto. Há sempre irmãos pobres, marginalizados, esquecidos e não amados que precisam de quem os olhe com olhos de amor e de entrega. E isso é possível, é necessário, é urgente. A Igreja de Cristo só se pode dizer de Cristo, se for serva e pobre, se os pobres a socorrer e a por eles dar a vida, forem a sua verdadeira riqueza, o seu tesouro, a sua preocupação”.
Como também me recordo das palavras de Américo Viveiros na apresentação do livro “Denunciar, Formar e Amar” cujos textos tive a honra de selecionar e coordenar: “ Monsenhor Weber foi um padre “avant garde” que ia ao terreno para cuidar da miséria do lado de fora da porta, mas também escrevia para fazer-se ouvir junto de quem decide, ajudava a socorrer os pobres com ações concretas e aceitava a ajuda de quem como ele estava disposto a servir” disse ainda sublinhando que foi e “é o líder de uma cruzada que nem todos compreendem” mas que lhe valeu o epíteto de “Padre dos Pobres”, com um trabalho “incansável”, influenciado pelos ventos do Concilio Vaticano II e sobretudo pela Gaudium et Spes (documento incontornável da Igreja).
O livro espelha o pensamento e a obra de um padre que percorre caminhos paralelos à igreja para denunciar, formar e amar usando a doutrina do Concilio Vaticano II e que foi desenvolvida pelos papas Paulo VI, João Paulo II e agora pelo Papa Francisco, e nesta luta, nem sempre foi acompanhado pela Igreja que servia e que, paulatinamente, se foi “ritualizando” e “afastando das periferias”.
Nos 66 anos de sacerdócio de Monsenhor Weber é assim mesmo: Caridade, porque ele a vive de uma forma empenhada e evangélica, denúncia porque nunca teve medo dos poderes instituídos e formação porque em toda a sua acção sempre teve como norte não ficar pela assistência imediata, mas promover as pessoas para que ocupassem com dignidade um lugar na sociedade.
Ainda recentemente em plena crise pandémica falou bem alto o gesto de se ter desfeito de algum património pessoal para comprar e distribuir cerca de três milhares e meio de cabazes alimentares por famílias carenciadas nos diversos concelhos da Ilha.
Conhecido é também o processo de doação de uma residência para apoiar sacerdotes idosos e que deu origem a um infeliz litígio com a Diocese que deveria fazer corar de vergonha alguns responsáveis pelos bens materiais da Igreja.
Conheço o Dr. Weber Machado Pereira desde 1964, ano em que começou a leccionar no Seminário de Angra. Nunca mais nos desencontrámos. Há amizades que não necessitam de palavras e onde elas até estão a mais.
É por isto, é por ter tido o Padre Weber presente na minha vida, em muitos momentos e principalmente na doença e nas fragilidades (até a Alcoitão me foi visitar), por me ter acompanhado sempre que dele precisei para ajudar na paróquia da Ribeira das Tainhas, a pedido dos respectivos párocos e por frequentemente telefonar ou bater à porta para uns momentos de conversa, que sinto a alegria do dever estar hoje aqui nas colunas desta nosso Correio dos Açores para um abraço de parabéns, de votos de saúde e de merecido descanso de tantas e tão profícuas lides na vida e para a vida de tantos. “Omnia omnibus”, diria São Paulo!

Santos Narciso

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