“Tudo está ligado. Devem ensinara os vossos que o solo que pisam são as cinzas dos nossos avós. Inculquem nos vossos filhos que a terra está enriquecida com as vidas dos nossos semelhantes, para que saibam respeitá-la.”
Estas palavras sábias fazem parte da mensagem que, em 1854, o Chefe Seathl escreveu ao Chefe Branco de Washington.
Passados 983 anos, essas palavras estão atuais e constituem um apelo: aos responsáveis pelas diversas instituições ligadas ao ambiente; aos governos e a todos nós, porque todos somos envolvidos e responsáveis pelo ambiente. As terras não nos pertencem, temos como obrigação defendê-las e alertar as diferentes entidades, as que têm o poder de não permitirem que os homens, tão conscientemente, mantem os seus semelhantes. Não me chocam as manifestações que se fazem em defesa do ambiente, admiro-as, porque passivamente, elas chamam a atenção para infernal degradação do ambiente que se vive. As palavras proféticas de um selvagem, que passados tantos anos ressoam, ainda hoje como um conselho, prevendo os perigos que o mundo iria viver:
“Tudo o que acontecer à terra, acontecerá aos filhos da terra.
Se os homens cospem no solo, cospem em si próprios.
Isto sabemos: a terra não pertence ao homem; o homem pertence à terra, isto sabemos.
Tudo está ligado, como o sangue que une uma família.”
Em 1985 escrevi uma carta aos autarcas da minha terra, como simples cidadão, alertando, não criticando, algumas anomalias que se estavam, então, a verificar:
Preocupa-nos a degradação e a adulteração do nosso ambiente, equilíbrio que, no dia a dia, nos acompanha na limitação destes 57 quilómetros (apenas) de comprimento.
Terras e rochas que muitas gerações anteriores a nós, num esforço titânico, único. Legaram-nos, transformadas já em socalcos e povoadas com construções simples perfeitamente integradas nesta paisagem. Eles aqui nasceram e como tal carregados de sabedoria e conhecimento traçaram diretrizes de construções que eram as adequadas à paisagem e ao clima.
Eles estabeleceram verdadeiros pactos com esta terra, porque foram eles que a transformaram, durante tantas décadas, quando o mundo não acreditava sequer que eles fizessem destas rochas e abismos verdadeiros jardins atlânticos.
Mais ou menos por esta altura, fui convidado, pelo Diretor do museu canário, a proferir, ali, uma conferência sobre o ambiente. Felizmente que já se criou uma consciência que permite que sejam mais as vozes a gritarem e a apelarem para defesa de um património que a todos nós pertence: porque tudo quanto fizermos à terra cairá sobre nós.
Numa sala completamente cheia os canarinos puseram muitas questões e apontaram muitos pontos negativos que, infelizmente, estavam a se verificar nas ilhas Canárias; um desenvolvimento, segundo eles, descontrolado, sem regras, que no futuro iria ser prejudicial.
Por minha iniciativa e, em colaboração com a televisão, era então diretor, o meu antigo colega no jornalismo Armindo Abreu, lançamos uma campanha com um slogan: “Assim sim. Assim não”. Uma campanha que tinha em vista o aconselhamento das cores a usar na pintura das coisas e de evitar deitar lixo para o chão. A campanha teve resultados excelentes, porque os madeirenses corresponderamao apelo; consciencializaram-se de quanto era importante para a Madeira e para eles próprios colaborarem na defesa da paisagem, não “cuspindo-a” com todas as misturas de cores, algumas de péssimo gosto.
Como as que se estão de novo a verificar: cor de cenoura, verde-choque, vermelho berrante, azul meia-noite.
Uma das regras da liberdade é respeitarmosas leis, entre essas as camarárias.
A paisagem madeirense não comporta todo o tipo de construções, nem muito menos o uso de cores desadequadas. São interferências pouco recomendáveis. Desenvolvimento não é aceitar tudo quanto querem os investidores, mas sim num gesto de boa vontade de colaboração, cumprirem as regras para que se verifique um equilíbrio que todos possam beneficiar.
Em relação à Madeira é preciso recordar: a terra não nos pertence, estamos aqui apenas de passagem. Não destruamos a sua paisagem, o seu ambiente, pois isso seria atraiçoar as gerações vindouras que certamente não nos perdoariam.
João Carlos Abreu