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Engenheira húngara encontra ‘o paraíso’ nos Açores e torna-se blogger e guia turística

Depois recuperar de uma doença considerada incurável, a húngara Rita Perlaki encontrou nos Açores a sua nova casa. Por cá criou o blog EdenAzores, um projecto que inicialmente serviu para partilhar a sua experiência com familiares e amigos, mas que rapidamente começou a atrair turistas húngaros para a Região. Hoje, tem cerca de 10.000 seguidores na sua página de Facebook e de Youtube Azori Éden; e organiza passeios turísticos pela ilha de São Miguel.

Correio dos Açores – O que a motivou a mudar-se para os Açores e como foi o seu percurso antes de chegar aqui?
Rita Perlaki – Mudei-me para os Açores após um capítulo desafiante da minha vida. Os médicos disseram que a minha doença era incurável, mas, com o apoio inabalável dos meus pais, a ajuda de profissionais de saúde que usavam remédios naturais e profundas mudanças internas, consegui uma recuperação milagrosa. Senti-me compelida a escrever um livro sobre esta experiência, mas o meu regresso ao trabalho deixou-me pouco tempo para tal projecto. Devido à minha doença, acabei por passar muito tempo em casa e nesta altura ansiava por mudança e por viajar.
Um dia, conheci açoriano e quando lhe perguntei onde vivia, apenas disse: “No Paraíso”. Foi a primeira vez que ouvi falar dos Açores e em poucas semanas aceitei um convite dele e de um amigo para visitar esse dito paraíso. Fiquei nas Furnas e senti uma ligação imediata. Neste momento, ficou claro para mim que era aqui que precisava de terminar o meu livro e passar a próxima fase da minha vida. Fiz a mudança no meu aniversário (seis meses depois) com o apoio inabalável dos meus pais. Terminei o livro sobre a minha recuperação, mas nunca publiquei.
Antes dos Açores, a minha vida também era encantadora. Tenho dois mestrados – um em engenharia bioquímica e outro em administração de empresas. O meu trabalho, que estava maioritariamente ligado à minha formação em administração, era muito gratificante. Viajar sempre foi um foco enorme na minha vida; levou-me à Itália e à Austrália, onde (e digo-o com orgulho) frequentei a universidade com uma bolsa generosa. Explorar novas culturas, conhecer pessoas e aprender idiomas diferentes, moldou completamente o meu percurso e fez da minha estadia em vários países uma parte significativa da minha história. Considero-me uma pessoa bastante corajosa, não tenho medo dos desafios de descobrir novos países e culturas.

Após sete anos, como descreveria a sua experiência de viver em São Miguel?
A vida em São Miguel mudou muito com o aumento do turismo, antes era muito mais calma. Aqui, a vida é, ao mesmo tempo, simples e difícil. Se tivesse de apontar o que me mantém por cá, diria que é a tranquilidade, a natureza deslumbrante e os meus amigos.
Alguns aspectos da vida aqui são muito desafiantes: as interacções sociais, as oportunidades de aprendizagem e a possibilidade de ter uma vida vibrante e cheia de dança são limitadas. Eu era dançarina e sinto muita falta disso. A cultura é bastante diferente da minha, o que levou anos para me ajustar. Formar amizades também foi um processo lento e desafiante.
Tenho uma inclinação muito forte para a aprendizagem contínua e cursos de alto nível são essenciais para mim. Infelizmente, não encontrei muitos que correspondam aos meus interesses em São Miguel, mas estou sempre atenta. Esta procura constante por conhecimento faz-me sentir que a minha caminhada ainda não está completa.
Muitas vezes sinto falta do meu país e da minha família, razão pela qual passo os Invernos em casa (Hungria). Adoro a neve, mas quando começa a chegar a Primavera, sinto uma falta profunda dos Açores e adoro voltar aqui.

Como tem sido o processo de aprender o português?
Estava muito entusiasmada no início porque adoro aprender. No entanto, não consegui encontrar professores ou mesmo um tutor particular que fossem suficientemente inspiradores para me manter motivada (tentei algumas oportunidades). Apesar disso, consegui lidar com tudo o que veio ao longo dos anos. Falo bem inglês e consigo comunicar em português, embora com menos fluência. Muitos dos meus amigos falam comigo apenas em português para me ajudar a praticar. Como trabalho principalmente com turistas estrangeiros, o meu português não melhorou tanto quanto gostaria, embora tenha um conhecimento básico da língua e fale bem inglês. Se alguém conhecer uma comunidade ou curso interessante, estou aberta a melhorar.

Sente que o facto de não falar português fluentemente pode ser uma barreira para quem quer conhecer profundamente a cultura açoriana?
Talvez sim, talvez não. Acredito que o mais importante é ter o interesse e a vontade de aprender mais sobre outra cultura — e mergulhar nela — participando em eventos que mostram a cultura local. Tenho um interesse enorme na cultura açoriana, e é precisamente por isso que o meu lugar favorito da ilha é uma quinta onde mostram como as pessoas viviam no passado. Sempre que surge algo novo, faço perguntas, leio sobre isso (leio muito bem em português) e converso com os meus amigos. Apesar de muitas pessoas falarem um português mais fluente em comparação ao meu, algumas delas não se esforçam tanto para aprender ou partilhar o seu conhecimento com os outros. Tenho orgulho no esforço que coloco em aprender e garantir que os turistas não apenas desfrutam da paisagem e dos miradouros, mas também aprendam sobre a cultura e os costumes açorianos, gastronomia, religião, natureza, etc.

O que a levou a criar o seu blog sobre os Açores? Em que momento sentiu essa necessidade?
A decisão para criar o blog foi inspirada pela minha mudança para São Miguel. No início, queria apenas anotar as novas descobertas e conhecimentos, uma espécie de diário para os meus pais e amigos húngaros — há sete anos, não havia muito conteúdo húngaro sobre os Açores. Agora, a página de Facebook Azori Éden é um pouco mais activa do que o blogue EdenAzores e também tenho um canal no YouTube, Azori Éden, e a minha página no Instagram, EdenAzores, onde partilho apenas conteúdo em inglês.

Pode falar um pouco sobre o tipo de conteúdos que partilha no seu blog e a quem se destinam?
A minha audiência está espalhada pelo mundo, cerca de 10.000 pessoas, mas são principalmente húngaros, americanos, portugueses, alemães, eslovacos e romenos, e também tenho alguns seguidores dinamarqueses. O conteúdo que partilho passa principalmente pelas minhas experiências e descobertas sobre as ilhas, algo que quero que outros vejam e experimentem quando visitam os Açores. Os leitores consideram o meu conteúdo muito útil porque, como residente, os meus insights são mais autênticos do que os de um blogueiro que vem numa visita breve e escreve alguns artigos para atrair seguidores. O meu objectivo é fornecer informações genuínas e interessantes durante os meus passeios.

Como descreveria o seu estilo como guia turística? O que a diferencia dos outros guias?
Experimentei vários passeios com guias locais durante eventos e devo dizer que a qualidade dos guias de São Miguel é excepcional em todos os sentidos – são fantásticos! Dado o meu background académico, tenho um profundo interesse em biologia, química e plantas, e os meus passeios focam-se no conhecimento ambiental, na natureza e na flora e fauna locais. Por exemplo, adoro contar histórias sobre projectos de conservação, o pássaro Priolo e os esforços extensivos necessários para manter o seu habitat no Nordeste. Organizei vários voluntários (dos meus hospedes) para ajudar a salvar o Cagarro e limpar o ambiente. Por ser o local onde vivo, o meu passeio pelas Furnas é totalmente único; não vou apenas aos pontos mais populares, mas levo os meus clientes a um jardim de camélias para conhecerem estas flores e os produtos locais com óleo de camélia; a um lugar para experimentar o chá local com diferentes águas apresentado por um bioquímico local; e incluo sempre informações sobre feriados religiosos locais, procissões, gastronomia e sustentabilidade. Por vezes, também vamos juntos para alguns festivais e posso dizer que sou amiga da maioria dos meus clientes após o passeio. Também ofereço passeios especializados para famílias com crianças, com foco nos vulcões, animais, plantas e pássaros. Para as crianças, há actividades de acordo com a sua idade. Um guia turístico deve continuar a desenvolver-se e inovar, e eu esforço-me por fazer exactamente isso. Adoro trabalhar com locais e mostrar o que eles têm para oferecer — estou sempre à procura de colaborações.

Quem são os turistas que mais procuram os seus serviços?
Como não há muitos guias turísticos húngaros na ilha, o meu blogue e passeios em húngaro foram uma forma de atrair turistas húngaros para a Região. No entanto, também tenho cada vez mais visitantes dos Estados Unidos, Dinamarca, Eslováquia, Roménia, Inglaterra e Itália, pois também posso realizar passeios em inglês e um passeio em italiano. Olhando para o futuro, quero expandir a minha oferta para incluir mais passeios em línguas estrangeiras, como italiano e checo. De todos os meus passeios, acredito que o melhor é o das Furnas, pois é onde vivo – e vou além das atracções principais para incluir tesouros escondidos e informações menos conhecidas. O passeio no Nordeste, que se foca na natureza e nos pássaros, também tem o seu quê de fascinante. Além disso, o passeio na Quinta do Agricultor é um favorito, oferecendo uma compreensão abrangente dos Açores em apenas 3-4 horas – muito mais completa do que aquela que se poderia aprender ao ler livros sobre este lugar durante um mês.
Qual é a sua ligação à Quinta do Agricultor e que tipo de actividades desenvolve lá?
Os proprietários da Quinta do Agricultor são a razão pela qual ainda estou nos Açores. Conhecemo-nos num momento muito importante das nossas vidas, ajudámo-nos imensamente e tornamo-nos grandes amigos. A dada altura, quase desisti de viver aqui porque para uma mulher sozinha era incrivelmente difícil construir uma rede de contactos; por minha vez, eu ajudei-os com as minhas ideias para os passeios na quinta. Essas ideias originaram um projecto fantástico que apresenta aos visitantes a vida e cultura tradicional dos Açores – através de pequenas degustações gastronómicas, mostram de forma autêntica como é que os açorianos viviam no passado e como vivem actualmente. Agora, os meus passeios incluem uma visita à quinta, onde os proprietários nos guiam. Estes passeios são sempre o destaque para os viajantes, e recomendo-os vivamente, tanto para turistas como para locais, pois muitas crianças e adultos normalmente não estão familiarizados com os seus arredores, ervas e plantas, algo que se altera depois destes passeios; onde também se aprende muito sobre gastronomia. Gosto imenso de estar na Quinta do Agricultor e ajudo sempre que posso.

Quais são os seus planos futuros para o blog e para a sua vida nos Açores?
Gostaria de melhorar a secção em inglês do blogue, porque a parte em húngaro é a que está mais completa, mas o facto é que preciso de ajuda profissional para aprimorar o conteúdo em inglês. É também por isso que a página de Facebook Azori Éden funciona melhor em duas línguas. Além disso, pretendo desenvolver o canal do YouTube Azori Éden com novos vídeos — algo que estou a aprender, mas estou aberta a assistência profissional. Se alguém puder ajudar, apreciaria imenso.
Neste momento, estou novamente à procura de uma mudança e estou a considerar fazer um curso de pós-graduação na Universidade dos Açores, talvez relacionado com vulcões, sustentabilidade ou turismo. O meu objectivo é chamar a atenção das pessoas para a sustentabilidade para os fantásticos projectos locais que apoiam o ambiente. Para tal, estou à procura de colaboradores e inspiração para concretizar este objectivo.
Daniela Canha

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