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“Média de jovens portugueses viciados em internet é superior à média europeia”, constata o Neuropsicólogo João Ribeira

O Neuropsicólogo João Ribeira afirma que a dependência dos jovens portugueses relativa à internet deve-se ao facto de não haver alternativas interessantes e mais saudáveis. Ao ‘Correio dos Açores’ refere também algumas maneiras como se poderiam controlar estas dependências, quais os sintomas das mesmas e que medidas deveriam ser implantadas para as combater.

Correio dos Açores – Quais são os principais sinais de dependência da Internet a que os pais devem estar atentos?
João Ribeira (Neuropsicólogo) –
Como no caso de qualquer outra dependência, devemos estar atentos a alterações significativas no comportamento dos jovens, como isolamento, retracção social, deixar de realizar actividades que anteriormente eram consideradas prazerosas. Claro que a irritabilidade, particularmente quando se retira o jovem da sua “ligação online”, as alterações do sono por passar demasiadas horas na internet são também sintomas frequentes.

Existem dados específicos sobre a prevalência da dependência da Internet entre os adolescentes nos Açores?
Tanto quanto sei, não. Existe um estudo bastante abrangente sobre o consumo de tecnologias nos jovens, feito pela Dove em 2023, que tem algumas informações que podem ser úteis. Por exemplo: 86% dos jovens portugueses admitem estar viciados nestas plataformas, um valor superior à média europeia (78%), e 90% já as utilizam desde os 13 anos.

De que forma a dependência da Internet está a afectar o comportamento e o desenvolvimento dos adolescentes açorianos?
A dependência da internet é isso mesmo, uma dependência. Como tal, o que estamos e vamos continuar a observar são aumentos das depressões e sintomatologia ansiosa, alterações das capacidades cognitivas, particularmente, da atenção e da concentração, que se traduzem em dificuldades de aprendizagem acrescidas. Comportamentalmente, já é visível um maior isolamento dos jovens, tendência para preferirem grandemente o contacto com o seu “smartphone” ao diálogo cara a cara com os pares, menor tolerância a frustração, mais baixa resiliência e motivação.

Quais são as principais redes neuronais afectadas pela dependência da Internet e como isso se manifesta nos adolescentes?
As dependências afectam, de forma global, os sistemas dopaminérgicos do cérebro. Esta alteração traduz-se, desde logo, em dificuldades em processar a recompensa, o prazer, e em alterações da motivação e da iniciativa comportamental. Ao mesmo tempo, outra rede neuronal muito afectada pela dependência é a atencional e, por conseguinte, os sistemas mnésicos. Em terceiro lugar, não podemos deixar de mencionar as redes neuronais de controlo de impulsos e gestão emocional, que são, também elas, fortemente enfraquecidas pela dependência “do online”. No geral, o que a investigação afirma com mais frequência é que a dependência da internet altera a ligação entre as redes neuronais na adolescência, o que traz consequências nefastas para todo um conjunto de actividades essenciais ao bom desenvolvimento dos jovens.

No seu entender, que estratégias devem ser implementadas nos Açores para combater a dependência da Internet entre os jovens?
Esta é uma discussão que venho mantendo com diversos intervenientes no contexto educativo, clínico e social e sempre chegamos à conclusão de que, por mais formação e informação que se continue a dar aos Jovens sobre o uso saudável das tecnologias, é absolutamente incontornável o envolvimento dos seus pais ou tutores. Não me parece possível combater este flagelo sem contar com regras, quiçá leis, que de alguma forma, incitem as pessoas a estarem mais presentes e a responsabilizarem-se pelo controlo, monitorização e acompanhamento que os nossos jovens fazem da internet e das ferramentas tecnológicas no geral.
Não obstante, é importante continuar o bom trabalho que já se vai fazendo em algumas escolas nos aspectos emocionais e sociais dos jovens para lhes dar ferramentas e capacidade de juízo crítico para fazerem um uso das redes sociais que seja produtivo e/ou benéfico para eles.

Que papel podem os pais e as escolas nos Açores desempenhar na prevenção da dependência da Internet?
Penso que respondi na questão anterior. Regras claras, instrução, formação, presença e consistência com os jovens, pais e a comunidade educativa no geral.

Como é que a cultura e o estilo de vida dos açorianos influenciam a forma como os adolescentes utilizam a Internet?
Não me parece que exista assim uma diferença cultural tão evidente entre a actual geração de açorianos e os demais jovens portugueses, ou até do chamado “mundo ocidental”. Dir-lhe-ia que, no geral, o grande problema está na falta de alternativas interessantes e mais saudáveis que o uso da internet ou das tecnologias globalmente entendidas.

Quais são as recomendações para os adolescentes açorianos gerirem o seu tempo online de forma saudável?
As novas tecnologias trazem, sem dúvida, um sem número de vantagens potenciais (sublinho potenciais) para o nosso desenvolvimento e bem-estar. A questão está, exactamente, na gestão do tempo online. Diria que procurem activar o corpo, combater o ócio e o sedentarismo. Diria que tentem usar a internet e as ferramentas digitais com objectivos específicos e concretos, como obter determinada informação ou conhecimento, contactar alguém com quem não possam falar de outra forma ou para partilhar algum documento ou recurso. Evitem o uso para o dito “entretenimento”, em particular o simples scrolling de micro vídeos que mais não mostram do que tolices sem qualquer tipo de utilidade ou vantagem, analise-se por que perspectiva se analisar. Isto equivale a sugerir um trabalho em termos da capacidade de visão crítica dos jovens, que é uma das maiores lacunas que encontro, actualmente.

Quais são as principais dificuldades enfrentadas pelos adolescentes açorianos devido à dependência da Internet em termos de desempenho académico e social?
Em termos académicos, as questões das alterações da atenção e, por conseguinte, de todo o processo de aprendizagem já foram aqui mencionadas e são, por ventura, das mais difundidas. Depois, existem os problemas ligados ao forçoso “multitarefa” que o uso, por exemplo, do smartphone enquanto se faz seja que outra actividade for implica, o que vai trazer maior dificuldade em concentração e dedicação a uma tarefa em específico, por exemplo, quando é preciso estudar.
Já socialmente, a paleta de dificuldades é diversa. Aqui, observamos, como também já mencionei, uma tendência para o isolamento e para a superficialidade das relações estabelecidas. É muito comum encontrar, decorrente disto, dificuldades no desenvolvimento de competências sociais como a empatia, a comunicação não verbal e a capacidade de ler pistas sociais. No fundo, estamos a desenvolver uma espécie de autismo (com todo o respeito pelos que são acometidos por esta diferença) devido ao uso excessivo de tecnologias.

Como é que a dependência da Internet pode ter impacto na saúde mental dos adolescentes nos Açores?
Bom, esta questão relaciona-se muito com a anterior, não é? Com as dificuldades em estabelecer relações significativas e profundas (presenciais) com pares, vêm todas as consequências de que já fomos falando. O aumento das depressões e da Ansiedade nos jovens, relativo ao estar sempre online é claríssimo e preocupante.
Por outro lado, salientaria as alterações do sono que a dependência da internet causa. Aqui abrimos a porta a todo um conjunto de problemas que vão desde as baixas competências de aprendizagem até alterações no sistema imunitário e nos níveis de energia e bem-estar geral dos jovens.
Frederico Figueiredo

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