A computação quântica está a emergir como uma das áreas mais desafiantes e promissoras da tecnologia moderna. Com o potencial de resolver problemas complexos que estão além das capacidades dos computadores clássicos, os computadores quânticos representam uma revolução tecnológica com implicações vastas e profundas.
As primeiras conceções teóricas da computação quântica têm as suas raízes nas descobertas e teorias de vários cientistas ao longo do século XX, nomeadamente, David Deutsch, conhecido como o pai da computação quântica, ao estabelecer, em 1985, as bases teóricas e um modelo de máquina de Turing quântica.
A computação quântica, embora profundamente enraizada nas complexidades da mecânica quântica, resume-se essencialmente a quatro conceitos-chave: qubits, sobreposição, entrelaçamento e interferência quântica.
Os computadores clássicos, inclusivamente os designados supercomputadores, utilizam bits como a menor unidade de informação, que pode ser 0 ou 1. Em contraste, os computadores quânticos têm como unidade básica de informação os qubits (quantum bits), que podem estar no estado 0, 1, ou qualquer sobreposição de ambos, devido ao fenómeno da sobreposição quântica. Assim, os bits binários clássicos só conseguem representar um valor binário, 0 ou 1, o que significa que só podem estar num de dois estados possíveis. Contudo, os qubits podem representar 0, 1 ou qualquer proporção de 0 e 1, numa sobreposição de ambos os estados, com uma determinada probabilidade de ser 0 e uma determinada probabilidade de ser 1, criando uma multiplicidade de possibilidades computacionais.
A sobreposição permite que um qubit exista simultaneamente em múltiplos estados.
Os supercomputadores atuais são sistemas computacionais extremamente poderosos construídos para realizar cálculos intensivos em grande escala, recorrendo a arquiteturas paralelas, com milhares de núcleos de processamento que, operando em conjunto, permitem resolver problemas científicos e de engenharia complexos. A sobreposição dos qubits fornece aos computadores quânticos um paralelismo inerente, permitindo que processem milhões de operações simultaneamente.
Na computação quântica, a informação é codificada na sobreposição dos estados 0 e 1. Por exemplo, com 8 bits, poderíamos codificar 256 valores diferentes, mas é necessário escolher um deles para a respetiva codificação. Com 8 qubits, é possível codificar os 256 valores ao mesmo tempo. Este comportamento ocorre porque um qubit pode estar em sobreposição de todos os estados possíveis.
Neste contexto, a sobreposição permite aos algoritmos quânticos processar informações numa fração do tempo que os sistemas clássicos mais rápidos demorariam para resolver determinados problemas. A quantidade de informação que os sistemas de qubits podem representar cresce exponencialmente: os dados que, por exemplo, 500 qubits podem facilmente representar não seriam possíveis nem mesmo com mais de 2^500 bits clássicos.
O entrelaçamento é um fenómeno quântico em que dois ou mais qubits se tornam interdependentes, de modo que o estado de um instantaneamente afeta o estado do outro, independentemente da distância entre eles. Isso permite uma coordenação e processamento de informações numa escala sem precedentes: supondo dois qubits entrelaçados, ao analisarmos a propriedade de apenas um deles já saberemos de antemão a propriedade de ambos, ou seja, em termos de computação, será necessário processar apenas uma parte dos dados.
A interferência quântica é um fenômeno fundamental na computação quântica, utilizado para manipular e controlar os estados quânticos dos qubits durante os cálculos.
Quando os qubits, em sobreposição, são manipulados por portas lógicas quânticas, os seus estados podem interferir entre si de maneira construtiva ou destrutiva: interferência construtiva ocorre quando as probabilidades de certos resultados são reforçadas; interferência destrutiva ocorre quando as probabilidades de outros resultados são canceladas ou reduzidas.
A interferência ocorre naturalmente à medida que as portas quânticas operam. A forma como os qubits interferem entre si é determinada pelo design do algoritmo quântico.
Quando os qubits são medidos, a sobreposição colapsa para um dos estados possíveis. Devido à interferência, a probabilidade de observar o estado correspondente à solução correta é significativamente maior.
Os computadores quânticos funcionam através da manipulação de qubits usando portas lógicas quânticas. Estas portas são análogas às portas lógicas clássicas (como AND, OR, NOT), mas operam de acordo com as regras da mecânica quântica. Os algoritmos quânticos são desenvolvidos para aproveitar as propriedades de sobreposição, entrelaçamento e interferência para realizar cálculos complexos com maior eficiência: uma série de operações quânticas é aplicada aos qubits para manipular os seus estados de maneira controlada; durante estas operações, os qubits podem-se entrelaçar e interferir uns com os outros, explorando o espaço de soluções possíveis simultaneamente; após a aplicação das portas lógicas, os qubits são medidos (as sobreposições são colapsadas para um dos estados possíveis); a medição fornece o resultado do cálculo quântico. A probabilidade de obter cada resultado é determinada pelas amplitudes dos estados quânticos antes da medição.
Os computadores quânticos, com capacidades únicas baseadas em princípios da mecânica quântica, prometem revolucionar diversas áreas de ciência e tecnologia.
Na área da criptografia clássica, por exemplo, a segurança de muitos sistemas criptográficos largamente utilizados, pode estar ameaçada (algoritmo de Shor).
O algoritmo de Shor é um algoritmo quântico desenvolvido por Peter Shor em 1994, que resolve o problema de fatorização de números inteiros de maneira exponencialmente mais rápida do que os melhores algoritmos clássicos conhecidos. Este algoritmo tem implicações significativas especialmente para os sistemas baseados em RSA (Rivest-Shamir-Adleman).
Para mitigar estes riscos de segurança associados à computação quântica, novas formas de criptografia, designada criptografia pós-quântica, estão a ser desenvolvidas e projetadas para serem seguras contra ataques quânticos.
A capacidade de simular sistemas quânticos complexos de maneira eficiente torna os computadores quânticos ideais para a pesquisa de novos materiais, medicamentos e processos químicos, que são extremamente difíceis de modelar com computadores clássicos, mesmo os supercomputadores.
Muitos problemas em diversas áreas, nomeadamente logística e finanças envolvem a otimização de sistemas complexos. Algoritmos quânticos, como o algoritmo de Grover, podem fornecer soluções mais rápidas e eficientes para esses problemas. O algoritmo de Grover é um algoritmo quântico, desenvolvido por Lov Grover em 1996, que fornece uma maneira eficiente de realizar pesquisas em bases de dados não estruturadas. Baseado nos princípios da mecânica quântica, especialmente sobreposição e interferência, consiste numa série de operações quânticas que amplificam a probabilidade de encontrar o estado desejado. Diferente dos algoritmos clássicos de pesquisa, que têm uma complexidade de O(N) para encontrar um item numa lista de N elementos, o algoritmo de Grover reduz esse tempo para O(√N).
A computação quântica pode acelerar algoritmos de aprendizagem máquina, permitindo a análise de grandes volumes de dados com maior rapidez e eficiência, proporcionando avanços significativos em inteligência artificial e análise de dados.
Apesar de seu enorme potencial, a computação quântica enfrenta várias dificuldades e obstáculos significativos.
Os qubits são extremamente sensíveis ao ambiente, nomeadamente ruído: manter a coerência quântica (estado de sobreposição) por longos períodos, assim como, construir computadores quânticos escaláveis, com um grande número de qubits interconectados e operando de maneira confiável, são grandes desafios.
Desenvolver métodos eficazes de correção de erros quânticos é essencial para garantir a precisão dos cálculos quânticos, exigindo a implementação de algoritmos complexos e hardware adicional.
A construção e manutenção de computadores quânticos são processos dispendiosos e complicados, pois requerem infraestruturas sofisticadas, com temperaturas extremamente baixas, próximas do zero absoluto (-273,15ºC).
A jornada da computação quântica está apenas a começar, mas as suas possibilidades são verdadeiramente promissoras e aparentemente ilimitadas.
Isaura Ribeiro