A Autoridade da Concorrência (AdC) condenou na última semana, “uma associação empresarial e cinco dos principais grupos laboratoriais a operar em Portugal ao pagamento de coimas no valor global de €48.610.000 pelo seu envolvimento num cartel que operou no mercado português para a prestação de análises clínicas e testes COVID-19 entre, pelo menos, 2016 e 2022”.
De acordo com a nota publicada pela AdC, “o cartel em causa, estabelecido entre os laboratórios e com a participação da associação do sector, teve por objectivo a fixação dos preços aplicáveis e a repartição geográfica do mercado de prestação de análises clínicas e de fornecimento de testes COVID-19.
A concertação entre os cinco laboratórios ter-lhes-á permitido aumentar o seu poder negocial face às entidades públicas e privadas com as quais negociaram o fornecimento de análises clínicas e de testes COVID-19, levando à fixação de preços e de condições comerciais potencialmente mais favoráveis do que as que resultariam de negociações individuais no âmbito do funcionamento normal do mercado, impedindo ou adiando a revisão e a redução dos preços”.
Na mesma nota é referido que “a capilaridade dos postos de colheita e a capacidade para a realização massificada de testes COVID-19 representavam um complemento fundamental para o esforço desenvolvido pelo Serviço Nacional de Saúde no combate à pandemia em Portugal. Foram realizados, em Portugal, até 30 de março de 2022, mais de 40 milhões de testes.
Uma vez que o processo teve origem em pedido de dispensa ou redução da coima ao abrigo do Programa de Clemência, foi concedida dispensa da coima à empresa que apresentou o pedido e que cumpria todos os requisitos aplicáveis.
A presente decisão foi precedida por duas decisões condenatórias no mesmo processo, adotadas em 21 e 26 de Dezembro de 2023, que resultaram do recurso ao procedimento de transacção por parte de dois grupos laboratoriais multinacionais”. Estas empresas, através da adesão ao procedimento de transição, abdicaram de contestar a imputação da AdC e procederam ao pagamento voluntário das coimas aplicadas no valor global de €8.900.000, tendo optado por colaborar com a investigação e fornecer à AdC prova relevante da existência das práticas anti-concorrenciais em causa. Uma das empresas que recorreu ao procedimento de transacção beneficiou ainda de uma redução adicional da coima ao abrigo do Programa de Clemência, como s elê no documento. O procedimento de transacção constitui um instrumento processual que tem por objectivo a adopção de decisões de forma mais célere e eficaz, promovendo o interesse público mediante a economia de recursos, a redução da litigância e o reforço da prevenção geral, na base da cooperação do visado e da respectiva recompensa mediante redução da coima”.
Ainda de acordo com informação disponibilizada, “o Programa de Clemência prevê um regime especial de dispensa ou redução da coima em processos de cartel investigados pela AdC. A primeira empresa a denunciar um cartel em que participe poderá beneficiar da dispensa da coima e as demais empresas que apresentem também pedidos no âmbito deste Programa poderão beneficiar de uma redução da coima, reduzindo-se a percentagem de redução progressivamente. Assim, no conjunto, este processo envolveu um total de sete grupos laboratoriais e uma associação empresarial, com um total de coimas aplicadas de €57.510.000, dos quais €8.900.000 foram voluntariamente pagos”.
Não sendo possível excluir, como é referido na nota, que algum ou alguns dos comportamentos investigados possam estar ainda em curso, a AdC impôs ainda às visadas a imediata cessação da prática. Terminada a instrução do processo, a AdC conclui que a associação e os laboratórios visados acordaram a estratégia a adoptar em negociações com entidades públicas, como SNS e a ADSE e privadas, como as seguradoras, que a eles recorreram para a prestação de análises clínicas e para o fornecimento de testes COVID-19. No âmbito da sua atividade, os grupos laboratoriais visados celebram convenções e protocolos com sistemas de saúde públicos e privados.
Neste contexto, de acordo com o que a AdC apurou, pelo menos desde 2016, os grupos laboratoriais visados acordaram não aceitar descidas de preços e boicotar a prestação dos serviços, caso fossem efetcivamente confrontados com uma redução dos preços convencionados com o SNS, tendo acabado, aliás, por boicotar a aplicação do desconto estabelecido em Acordo celebrado com o Ministério da Saúde tendo em vista a sustentabilidade do SNS. (…) A partir de março de 2020, os laboratórios visados concertaram entre si os preços para o fornecimento de testes COVID aos utentes do SNS e da ADSE e impuseram-nos nas negociações com a tutela. Os laboratórios visados ameaçaram, aliás, a tutela com um boicote ao fornecimento de testes COVID em represália contra as atualizações (reduções) dos preços convencionados.(…) Em 2021, perante o contexto de pandemia, a AdC definiu como prioridade manter-se “vigilante quanto à deteção de abusos ou práticas anticoncorrenciais que explor[ass]em a […] situação, por exemplo em matéria de combinação de preços ou de repartição de mercados, em qualquer nível da cadeia de abastecimento”, lê-se ainda A violação das regras de concorrência não só reduz o bem-estar dos consumidores, como prejudica a competitividade das empresas, penalizando a economia do país. A decisão final da AdC é susceptível de recurso de impugnação judicial e não se encontra ainda transitada em julgado, lê-se na mesma nota.
N.C.