A nossa alimentação deve incluir os nutrientes necessários para nos fornecem energia e para a manutenção e reparação dos tecidos do corpo. Mas para além dos nutrientes há um grupo alimentar muito importante, designado fibra alimentar, constituído por hidratos de carbono que os enzimas do organismo humano não conseguem digerir.
A fibra alimentar encontra-se em alimentos de origem vegetal como frutas, legumes, grãos e cereais integrais, e é importante para a saúde do sistema digestivo, ajudando na regulação do trânsito intestinal, prevenindo a obstipação e contribuindo para a saúde da microbiota intestinal, ou seja, das bactérias que vivem no nosso intestino. Além disso, a fibra pode auxiliar no controle do peso, da glicemia e do colesterol, sendo recomendada a ingestão diária de 38 g/ dia de fibra alimentar para um homem de 19-50 anos, enquanto a dose recomendada para uma mulher nesta faixa etária é de cerca de 25 g/dia.
De acordo com a sua menor ou maior solubilidade em água, as fibras alimentares podem classificar-se em insolúveis ou solúveis. Muitos vegetais contêm os dois tipos de fibra, mas em proporções variáveis.
As fibras insolúveis em água, como a celulose e a lenhina das paredes das células vegetais têm um rápido esvaziamento gástrico e, como tal, podem diminuir o tempo de trânsito intestinal e aumentar o volume fecal, promovendo assim a regularidade digestiva e contribuindo para a saúde do cólon. São muito ricos neste tipo de fibra os vegetais de folha verde, os cereais integrais, as cascas dos frutos, as nozes, as sementes e o farelo de trigo, entre outros alimentos.
As fibras solúveis incluem as pectinas, mucilagens, beta-glucanos, frutanose alguns amidos resistentes. Estas fibras criam uma espécie de gel no estômago, causando uma sensação de saciedade e favorecendo a perda de peso. Por outro lado, diminuem a absorção de gorduras e de colesterol no intestino, diminuindo os níveis de colesterol e triglicerídeos, regulando também o aumento dos níveis de glucose. Além disso servem de alimento para as bactérias benéficas do intestino, a “boa” microbiota, diminuindo inflamações e melhorando a nossa saúde.Estas fibras também são resistentes à digestão pelos nossos enzimas, mas são fermentadas no intestino por bactérias da nossa flora intestinal, formando ácidos gordos de cadeia curta, que contribuem ainda mais para regular o nível de colesterol. Encontramos este tipo de fibra, por exemplo, na aveia, cevada, chia, linhaça, maçã, limão, banana, laranja, morango, cenoura, batata-doce, ervilha, couve-flor, lentilhas, feijão e cogumelos.
São particularmente interessantes as fibras solúveis das algas marinhas, e há cada vez mais estudos científicos que comprovam os seus benefícios para a saúde. As algas contêm hidratos de carbono com uma composição diferente dos que encontramos no meio terrestre, como os alginatos, o agar e os fucanos. Esses polissacáridos, que permitem às algas reter a humidade e resistir aos raios UV quando estão fora de água na maré baixa, e que as protegem contra a violência das ondas, entre outras agressões do meio marinho, constituem uma fibra solúvel de excelência. A sua capacidade de reter água permite-lhes formar géis que, para além de aumentarem o volume do bolo alimentar, podem atuar como protetores do estômago e impedir o refluxo gástrico. Os nossos enzimas digestivos não conseguem hidrolisá-los, mas são excelentes promotores do crescimento da “boa” microbiota do nosso intestino, que tem enzimas capazes de os utilizar como fonte de energia, produzindo substâncias capazes de estimular o sistema imunitário, de combater a inflamação, a diabetes e as doenças cardiovasculares.
Curiosamente, as capacidades que a flora intestinal tem de transformar os polissacáridos das algas não é igual em todas as populações. Por exemplo, os japoneses, que têm uma tradição milenar de comer algas, têm na bactéria intestinal Bacteroidesplebeius um verdadeiro arsenal de enzimas capazes de degradar polissacáridos marinhos, que se pensa terem sido transferidos de uma bactéria que habita nas superfícies de algas como o nori. E há outros exemplos, em populações costeiras onde as algas fazem tradicionalmente parte da alimentação humana. Quem sabe se não encontraremos exemplos semelhantes nos Açores, onde ainda hoje se preparam as deliciosas tortas de “erva patinha”, típicas das Flores e do Corvo e feitas com a alga Porphyra (ou os saborosos ovos mexidos com “erva patinha” da Azores Essentials nas Furnas)?
Maria do Carmo Barreto