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A democracia é outra coisa

O conceito de democracia tende a variar conforme o emissor. Ao contrário do que chegou a acontecer no passado histórico recente, hoje não se conhece um país que não se assuma democrático. Muitos teoricamente, outros de forma prática, para os padrões a que estamos habituados, europeus ocidentais. É objetivo que as construções variáveis de projetos democráticos têm em apreço a dialética associada a processos de luta pela libertação do domínio de potências estrangeiras, tradições e realizações seculares, influências externas e procedimentos circunstanciais aleatórios, consequências instáveis de processos que começam sem se saber muito bem como terminam. O fim de um regime é isso. Instabilidade, sem a certeza clara, durante muito tempo, de que a transição para a pluralidade democrática acontecerá.
Sobre a República Democrática da Alemanha (RDA) veio a saber-se, quando o muro foi destruído para que as pessoas fugissem para o outro lado, que de democrática tinha pouco, pelo menos para os padrões europeus contemporâneos. A República Democrática do Congo (RDC), apesar de ostentar a democracia na sua designação oficial, não é propriamente dada como exemplo das maiores garantias de igualdade e liberdade no continente africano.
A República Popular Democrática da Coreia (RPDC), a designação oficial daquela monarquia oriental na qual o poder passa de pai para filho, é o clímax do exemplo da melancia: uma coisa por fora, outra por dentro.
A caracterização de uma democracia, ainda assim, tende a ser simples: eleições livres, multipartidarismo, soberania nacional assegurada pelas forças armadas e de segurança, todas elas submetidas ao poder civil eleito.
E todos eles, obrigados ao cumprimento da lei, geral e universal, administrada pela justiça.
Vivemos quarenta e oito anos em ditadura, por isso sabemos bem reconhecer uma democracia quando a vemos. Sabemos que antes do 25 de abril o direito de manifestação não existia, e as pessoas podiam ser encarceradas de forma puramente discricionária, tratadas como terroristas e acusadas de intentarem contra as instituições do país, quererem destruir a paz social e a harmonia da sociedade. Todas as entidades que tinham por função administrar o poder faziam dele o que entendiam, sem grande probabilidade de virem a ser punidos.
Os partidos políticos eram proibidos, e toda a imprensa era censurada, a cultura controlada e a população constantemente educada para a adoração do regime e do seu líder. Por precaução, os candidatos a oponentes do regime eram detidos e interrogados e, se isso não os demovesse, agredidos e encarcerados para servirem de exemplo.
Quando a violência do regime não é suficiente, aumenta-se a repressão através dos órgãos do Estado. Exaltam-se os seguidores a vir para a rua defender o regime, quando o que se pretende é apenas manter o status quo dos seus dirigentes. E cada vez que aumenta a pressão popular para o derrube do governo considerado ilegítimo, mais as ações policiais e militares desproporcionais dos meios do Estado são postas ao serviço dos detratores, contra o povo que protesta nas ruas.
Nestas condições, o poder policial e militar não é um mero executor das ordens do poder político, mas dele beneficia igualmente, através da exploração das riquezas do país para seu benefício pessoal e familiar. Segurança em troca de riqueza.
Os crimes das elites política e militar são ignorados pelo poder judicial, trabalhando em circuito fechado e concorrendo assim, para a manutenção e perpetuação de todos no poder. Prendem-se os opositores, deixando apenas os alinhados ou aqueles que não têm reais hipóteses de vencer.
Mantém-se o despautério da usurpação das riquezas naturais do país, cada vez com maior ganância. O povo passa fome, uma crise económica grave não desaparece por meio da oratória inflamada. O povo passa fome e quer que o seu voto valha o suficiente para mudar de vida. Num democracia ocidental imperfeita teria mudado.
Na pátria de Bolívar ainda não é possível. Mas o povo, lá como cá, é quem mais ordena. Basta que chegue o tempo certo.

Fernando Marta

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