“Quem consome a nossa banana sente a diferença do sabor”. Quem o diz é Carlos Araújo, Presidente da Cooperativa Agrícola Açoreana de Hortofruticultores – Frutaçor, C.R.L, que comemorou 30 anos no passado dia 4 de Agosto. Ao Correio dos Açores, Carlos Araújo, que assumiu a Direcção da Cooperativa há 10 anos, explicou como a tornou rentável, após encontrar “a cooperativa praticamente falida” e revela algum receio, pois o mandato vai terminar no final do ano, sem haver ainda qualquer substituto a querer para o cargo.
Correio dos Açores – A sua Direcção lidera a Cooperativa há 10 anos. Como tem sido o percurso desde 2014?
Carlos Araújo (Presidente da Frutaçor) Esta cooperativa foi criada em 1994 e situava-se na Ribeira Grande. Comercializavam maracujá, citrinos e outras frutas, mas em pouca quantidade. Vieram montar-se em Vila Franca por causa da banana. Para os associados terem direito ao POSEI, aqui em São Miguel e na Terceira, têm de estar associados a cooperativas. Entretanto, há 10 anos, quando pegamos nisso, a Cooperativa estava praticamente falida. Esta Cooperativa estava a ser mal gerida e achei que tinha potencial para crescer e cheguei-me à frente.
Meu pai deu-me umas terras onde fazia plantação de bananas e achei que não podia continuar da maneira que estava. A Cooperativa facturava, então, 180 mil euros. Neste momento factura, à volta de, 1 milhão e 600 mil euros. Em 10 anos, passamos de comercializar 200 toneladas de banana para estar a comercializar anualmente 1400 toneladas. Comercializamos não só a banana, mas tudo o que seja frutas regionais: cerca de 50 toneladas de ananás, enquanto exportamos mais de 10 toneladas de maracujá, anonas e citrinos.
Fazemos a distribuição para o mercado regional. Actualmente vai um contentor de banana por semana para o continente. Existe a procura por ainda mais banana, mas não temos a quantidade. A banana que vai para fora tem de ser banana de primeira qualidade. Temos pedidos para Lisboa e para o Porto, mas para o Porto só enviamos quando temos mesmo muita quantidade.
Só exportam para território nacional?
Sim. Temos um cliente que nos compra e que exporta para a Alemanha e França. Mas nós, só metemos até Lisboa. A partir daí, já é da responsabilidade desse cliente. Fazemos a separação cá para ele.
Temos também, aqui nas nossas instalações, uma cozinha onde transformamos fruta em compota. Tem tido muito sucesso e fazemos compota com várias frutas, como amora, banana, maracujá e figo. Felizmente tem havido muita procura, especialmente da parte de casas de alojamento local e também para o Duty-Free do aeroporto e lojas Maviripa com os nossos packs de compotas. No Verão há uma procura muito grande do ananás por parte da restauração.
Quando se mudaram para a Vila Franca, já foi com a intenção de começar a exportar banana?
Não, não tínhamos quantidade para exportar. Só começamos a exportar depois de angariar mais associados, porque a maior parte dos associados ou era independente ou estava em outras cooperativas como a Profrutos, que faliu. Há maneira que fomos tendo quantidade é que fomos há procura de mercado. E nesta procura começamos a fazer exportação.
A nossa prioridade é sempre o mercado dos Açores. Primeiro abastecemos o mercado dos Açores e só depois exportámos para o continente. Se faltar banana para o mercado dos Açores, nós não exportamos. De Inverno, é muito difícil encher um contentor. Agora, de Verão, entram 50 toneladas de banana por semana e de Inverno entram entre 15 a 20 toneladas. É uma quebra muito grande na produção.
A gente diferencia-se das outras bananas que estão no mercado devido à qualidade. Nós colhemos a banana numa maturação mais adiantada para esta absorver os açucares e os amidos. Temos tido uma procura muito grande no continente porque está a diferenciar a banana dos Açores da banana da Madeira, que já está muito industrializada e não temo aquele sabor original que tinha antes.
Qual a importância de manter o sabor original da banana?
É essencial porque temos de nos diferenciar dos outros. Produzimos aqui cerca de 30 a 40% da produção regional e temos cerca de 70% da produção de São Miguel. Temos de nos diferenciar dos outros para conseguir mercado, senão não se consegue.
Quem consome a nossa banana sente a diferença do sabor, porque a banana que vem de outro lado é colhida mais cedo e não tem o sabor que a nossa tem.
É importante que a banana da Cooperativa tenha a marca Açores?
É, para o continente. E além da Marca Açores temos também uma certificação de produção integrada. É para diferenciar das outras bananas e as grandes superfícies exigem esta certificação, porque senão não conseguimos entrar no mercado.
Estamos a pensar, ainda este ano, começar com produção com Global G.A.P que é uma exigência ainda superior. Mas é preciso primeiro convencer os produtores, porque a produção terá ainda mais exigências.
Sente que pode convencer os produtores para a certificação Global G.A.P?
O caminho é este, caso contrário não conseguiríamos valorizar o nosso produtor. A valorização disto depende da valorização do produto que a gente tem. Sem produto não conseguimos valorizar. E isto só vem com a qualidade.
O facto de estarem sedeados em Vila Franca faz com que a exportação de banana se sobrepunha às outras frutas…
No fundo, a produção da banana é feita em Vila Franca. Temos associados da Lagoa, do Pico da Pedra e de outros locais mas, no fundo, Vila Franca é que se diferencia do resto da ilha.
Há planos para a Frutaçor se expandir?
Dificilmente, porque a produção de banana, e de fruta em geral, tem de ser feita em zonas urbanizáveis. Não podemos produzir acima dos 100 metros de altitude, senão só temos banana no Verão. O preço da urbanização está muito cara e com ofertas brutais por parte de pessoas do estrangeiro. Vamos andar sempre à volta das 1500 ou 1600 toneladas por ano. Às vezes com anos piores e outros melhores. Por vezes vem um temporal que afecta a produção. Dificilmente conseguimos um crescimento muito exponencial, porque se sairmos da zona de Vila Franca, as outras zonas têm bananeiras mas não têm bananas com qualidade.
Como justifica que estando na mesma ilha, só se consiga bananas de qualidade em Vila Franca?
Tem a ver com o frio, vento e terras diferentes. Esta terra aqui é mais rica em potássio. No fundo é isto.
Algum dia imaginou estar à frente da Cooperativa?
Nunca na vida. A minha vida não era nada disso. Era delegado de informação médica, vendia medicamentos. Não vendia banana. Vim para aqui, porque tinha uma produção e vim ver se conseguíamos endireitar isso. Nós, Direcção, analisamos primeiro as condições e vimos que existiam condições de dar a volta a isto.
Agora temos um problema. O código cooperativo limita os nossos mandatos a três anos e o nosso mandato acaba no final do ano. É preciso que apareça outra Direcção para tomar conta disso, porque senão todo o trabalho que foi feito está em risco.
Não há ninguém em vista que possa formar uma Direcção?
Até 31 de Dezembro há-de aparecer alguém, senão entramos em gestão. E estando em gestão temos os nossos limites.
Fizemos o nosso trabalho. Tínhamos um armazém que era praticamente lixo e agora estamos com três armazéns com câmaras que estão a trabalhar. Temos também monta-cargas e 20 pessoas que estão a trabalhar. Começamos um trabalho não do zero mas pior, porque pegamos numa cooperativa falida. Tivemos de reconstruir e de saldar as dívidas que existiam. Ainda tivemos de ir a tribunal porque a anterior Direcção exigia indemnizações, mas felizmente, em tribunal o juiz disse que não eram pessoas de bem e resolvemos a situação. É preciso pessoas com experiência na área, especialmente na parte de vendas.
O transporte é sempre por via marítima?
Não pode ser de outra maneira, são toneladas enviadas. Estamos a tentar melhorar junto dos transitários, mas há uma dificuldade muito grande, especialmente entre ilhas. Para o continente vai num contentor de frio, entre ilhas o problema é que o contentor de frio vai a cinco graus. Ora a esta temperatura, se demorar mais do que o que é suposto, a banana fica preta. O contentor deveria de estar a 12 graus. A cinco graus a banana queima.
Como se pode melhorar esta situação?
Teria de haver transportes regulados. Não é uma semana sai à Terça e na próxima já sai à Quinta. Depois, o cliente queixa-se de falta de banana porque a banana vai em dias diferentes. Varia consoante o transitário. Depois se houver problemas o navio não segue viagem.
Podíamos ter uma comercialização diferente entre as ilhas mas é muito difícil.
As outras ilhas também produzem banana. De Inverno os clientes querem porque não há, mas no Verão quando temos grande produção, os clientes não querem porque já existe banana local.
No fim, o trabalho é recompensador?
Nos primeiros oito anos, a Cooperativa não tinha condições de sequer recompensar monetariamente. Estou os dias todos aqui, a resolver os problemas que surgem, mas não diria que seja recompensador.
Como surgiu a Frutaçor
Após o encerramento da actividade da Fábrica de Licores Ezequiel de Melo Moreira da Silva, vários produtores frutícolas sentiram algum vazio para o escoamento da sua produção de maracujá, a que se juntaram produtores de outras espécies com necessidade de reabilitarem também as suas explorações.
Todas estas preocupações foram levadas às entidades oficiais que tutelavam o sector, sendo então a entidade mais sentida e próxima dos produtores da IAMA, através do seu Presidente, Luís Henrique Sequeira.
Depois de várias reuniões, foi assumida a ideia de que uma cooperativa seria a solução mais viável para absorver e envolver todos os produtores que quisessem assumir a ideia. Assim nasceu a Cooperativa Frutaçor, a 4 de Agosto de 1994, que tem no seu objectivo constitutivo várias áreas de explorações que vai da horticultura, floricultura e fruticultura.
O ramo que mereceu a atenção dos fundadores foi o da fruticultura.
Inicialmente, a actividade da Cooperativa desenvolveu-se em dois pólos distintos a saber: Um na Ribeira Grande, nas instalações do Posto Agrícola do mesmo nome, onde era transformando o maracujá e uma fabriqueta de compotas. O outro pólo é do parque industrial de Vila Franca do Campo, para o tratamento e comercialização da banana.
Os fundadores foram Carlos Teixeira da Silva, Jacinto Gil, Octávio Botelho, Victor de Sousa, Edgardo de Melo, José Cabral, Luís d’Aguiar, João Moura, Ezequiel Silva, José Dias Pacheco, Luís Cymbron Barbora e Lee Grozovinski
Frederico Figuereido // Filipe Torres