Edit Template

Procissão de Nossa Senhora dos Anjos leva milhares de fiéis a Água de Pau “à procura de amparo e conforto”, diz o padre João Furtado

Correio dos Açores – As festas de Nossa Senhora dos Anjos de Água de Pau são as mais relevantes dos Açores?
Padre João Martins Furtado (Pároco de Água de Pau) – Eu não gosto de dizer isto assim. São festas muito bonitas, festas muito bem programadas, um programa muito bem elaborado, que contempla a parte pastoral, a parte espiritual, as lindíssimas celebrações da eucaristia. Ainda Domingo passado celebramos a profissão de fé para 30 crianças. As festas contemplam, também, as celebrações da festa, o tríduo, a preparação e, depois, a parte de expressão de cultura popular – os concertos de bandas e grupos de cantares, de grupos musicais, o fogo-de-artifício. Vamos inaugurar a exposição ‘As mais belas profissões de todos os tempos’, que é uma mostra muito interessante.
É um programa de festas muito bom, mas não sou eu que devo classificar…

São festas que levam muitos fiéis à Água de Pau…
É uma festa que galvaniza muita gente. A procissão tem 10 bandas de música e nota-se que é uma festa que se impõe, uma festa que atrai multidões.
Em termos paroquiais, é a festa que tem mais dinâmica em São Miguel. É uma festa muito bonita. Pessoalmente gosto muito e tenho uma belíssima comissão de festas. Nós trabalhamos todos em conjunto. Há um colectivo que trabalha.

Há ainda pessoas que não compreendem bem que, ao longo do percurso da procissão, a imagem da Nossa dos Anjos esteja a recolher rodas de dinheiro. Como é que se explica esta situação a essas pessoas?
Isto acontece mais por parte de pessoas de fora da terra. Mas é preciso compreender que é uma tradição muito antiga. E qual é a interpretação que eu devo fazer? Aquilo manifesta a generosidade das pessoas, põem aquele dinheiro ali por zonas e fazem isso com muita seriedade e muito espírito de generosidade. Aproveitam a imagem para colocar exactamente aqueles donativos que irão servir para as despesas. Vejo que as pessoas fazem aquilo com muita seriedade e com este espírito também de ajudar e contribuir para as festas, para as despesas das festas.

Em termos pastorais, qual é a mensagem que vai deixar nestas festividades?
É uma mensagem de chamar a atenção das pessoas para o amor a Nossa Senhora, que é a Mãe de Jesus, é Mãe de todos nós; cultivar muito este amor filial à Virgem, à Nossa Mãe. E cultivando este amor a Nossa Senhora, estamos a cultivar e também a crescer no amor a Jesus, a Cristo. Para mim, o fundamental é Cristo, e com Cristo, ele revelou o Pai, o nosso querido Pai Eterno e o Espírito Santo.
Chamar a atenção para o amor a Deus Uno e Trino e amor a Nossa Senhora, que é importante, a Virgem Mãe de Deus, Senhora dos Anjos. E, depois, é procurar viver este Espírito Cristão, este ideal de perfeição cristão, aceitando todas as propostas de Jesus. Jesus vai-nos dando propostas a todos os níveis, fala-nos do amor. Temos que aprender a amar o próximo, mesmo aqueles que não gostam de nós, porque o amor para além de ser um acto do coração, também é um acto da razão: a frieza das convicções. Amar o próximo a começar pela família, começar por todos aqueles que estão à nossa volta. Viver o espírito das misericórdias, chama-nos a atenção para a oração, que é muito importante, a oração, a ligação com Deus que se manifesta com palavras e com atitudes.

A igreja de Água de Pau tem estado cheia durante as missas?
Nós estamos a viver um tempo mais difícil. Sou Padre há 41 anos e já apanhei várias épocas. Agora, uma coisa é certa: a Igreja de Nossa Senhora dos Anjos, tal como outras igrejas, certamente, há momentos que tem menos gente, mas há momentos que está bastante cheia.
Temos 340 crianças na catequese, elas participam nas festas, tanto no Sábado, com o primeiro, segundo, terceiro, quarto e quinto ano; e no Domingo, com o sexto, sétimo, oitavo, nono e décimo. Mas, depois, vão para férias e aí há uma descida. Contudo, vi a igreja cheíssima na profissão de fé e estes são momentos lindíssimos. A participação nas eucaristia oscila um pouco, mas não há razões de queixa, o fermento está ali, as pessoas que têm convicções e têm o santo hábito de participar na eucaristia – porque a eucaristia é o fundamental, é o tesouro por excelência que Jesus nos quis deixar.

A Igreja aceita o conceito de cristão não praticante?
Eu acho que isso não é muito correcto. Sou cristão pelo baptismo e nada mais. Acho que o ser cristão deve envolver a pessoa, deve-se comprometer com Jesus, com Cristo. Um dos sinais de prática cristã, tem a ver com a participação na Eucaristia, com a oração, com a vivência em estado de graça. E também o apostolado, o ser cristão na vida real, quer dizer em casa, no trabalho. E esta coisa de não ser praticante, eu entendo que não faz sentido.

Enquanto pároco como é que olha para a família em Água de Pau?
Nós sabemos que em todas as comunidades paroquiais, as comunidades são constituídas por famílias, por pessoas que estão em família. Sabendo nós que a família é uma instituição divina, o próprio Deus é quem institui a família: o homem deixa o pai e a mãe para se unir à sua esposa e os dois tornam-se numa só pessoa. Não separe o homem o que Deus uniu, quer dizer, os dois, pelo amor que têm um pelo outro, em que dois corações se cruzam, os dois tornam-se numa família abençoada por Deus
É claro que, tanto em Água de Pau como em outras comunidades, há famílias que estão muito bem estruturadas, muito bem organizadas e há famílias que, porventura estão com maiores dificuldades. Isso é como tudo e em toda a parte. Os tempos, hoje, são mais difíceis. Portanto, há famílias que estão bem organizadas, com os seus filhos a corresponder também com os pais, a obediência e tudo. Há outras famílias que vivem problemas e, por vezes, não é fácil ajudar e resolver, porque ninguém tem a varinha mágica para resolver nada.

Disse uma frase que já não se ouve muito; ‘Não separe o homem aquilo que Deus uniu’. As coisas são cada vez menos assim…
Bom, mas é o que o Nosso Senhor disse que temos de fazer, porque o matrimónio é indissolúvel e, portanto, é assim o matrimónio: ele e ela optaram por se constituir em família e, portanto, é o amor que está aí na base, o amor de noivado, e depois é confirmado no dia do sacramento do matrimónio. Jesus é que instituiu este sinal, que é o matrimónio. Uma das boas definições de matrimónio é uma comunidade muito íntima de amor e de vida. E um amor que está na base, que tem que ser construído e vai crescendo.
O amor é algo que se está sempre a aprender. Nunca se sabe tudo. Às vezes digo: no dia do casamento, o amor que é confirmado ali entre ele e ela, em que os dois corações estão cruzados, duas histórias que se cruzaram e aquele amor vai crescer. Passa por um momento de fogosidade, mas depois vai passar por outras etapas e não é uma pequena discussão, parece-me, que vai interromper ou destruir toda esta belíssima relação que eles quiseram construir entre marido e esposa; e, depois, como fruto deste amor, vêm os filhos. Os filhos são os frutos do amor entre os dois.
Tenho celebrado bodas de ouro matrimoniais e dá gosto de ver ele e ela amigos, quer dizer, pertencem um ao outro, gostam muito um do outro, o amor foi crescendo, e, portanto, esses são casos que a gente deve acatar como pessoas felizes.

Que espaço reserva a Igreja aos divorciados?
A Igreja tem um olhar também de carinho para com todos aqueles que, porventura, se separaram, são filhos de Deus, são pessoas muito queridas. E, portanto, a igreja é a continuadora de Jesus, dos seus pastores e deve acolher sempre muito bem pessoas que já estão separadas. Algumas conseguiram a declaração de nulidade e, portanto, podem casar novamente, catolicamente, porque já têm uma declaração de um tribunal eclesiástico. Mas uma coisa é importante dizer aqui alto e bom som: eles são muito queridos, muito queridos e amados por Deus. Ninguém é excluído de nada. E, portanto, nesse sentido, a Igreja tenta acolher, e bem, todos aqueles que estão nestas situações, que os faz sofrer, mas são bem recebidos.

Essa sua forma de fazer Igreja é um dos segredos para a adesão ao templo de Nossa Senhora dos Anjos de Água de Pau?
Temos de ser muito abertos e acolher bem seja lá quem for. Com 41 anos de sacerdócio, entendo que devemos ser muito mais tolerantes e muito mais acolhedores. Quer dizer, não vou muito por uma corrente de regras. Temos que ter regras na nossa casa, na nossa vida pessoal, na nossa igreja. Há regras, mas não nos devemos deixar escravizar por regras que, se calhar, não têm grande importância, depois desprezando aquilo que é o essencial.

De que forma é que tem evoluído as festas de Nossa Senhora dos Anjos?
A vida é sempre igual. Os nossos rituais são muito parecidos, todos eles! A vida é uma repetição permanente e o que importa é dar colorido, sentido e beleza àquilo que se vai repetindo, muito embora seja uma repetição com alguma criação – criação pontual porque ninguém consegue fazer coisas completamente diferentes este ano do que foi o ano passado, ninguém o faz. Mesmo na nossa vida pessoal e em família, há umas pequenas coisas diferentes. Portanto, é preciso aceitar a vida, mas com os seus rituais os seus hábitos ao nível pessoal e ao nível da família, bem como ao nível da comunidade.
E podemos colocar uma ou outra situação diferente, uma criação ou uma inovação, para ir colorindo um pouco mais mas, no fundamental, as celebrações, a procissão, os arraiais, os momentos de expressão cultural popular… E, depois, como novidade, por exemplo, ‘As mais belas profissões de todos os tempos’. É uma coisa diferente, vem dar um colorido e representa uma exposição lindíssima.
Com a experiência que eu tenho, de 41 anos de sacerdócio, mesmo repetindo as mesmas coisas, elas têm um sabor diferente. Quando presido a uma celebração de profissão de fé este ano, sinto que está a ser diferente do ano passado. Pequenos pormenores, o estado de alma, o estado de espírito, outras caras, outras crianças. Quando estou a celebrar num Domingo um baptismo e tudo mais, eu sinto que a Eucaristia é única naquele momento, diferente. É igual, são os mesmos rituais, mas são ditos naquele contexto, naquele dia, e se calhar um pouco diferente do Domingo atrás. É aí que esta a beleza. Imagine-se, 41 anos a celebrar a missa e nunca me cansei de celebrar a missa e a Eucaristia, porque é um tesouro que Nosso Senhor nos quis oferecer. E felizes daqueles e daquelas que participam na Eucaristia.
Estive na Itália de 10 a 14 de Junho. Fui até Assis e estive também na cidade de Roma com um colega, um padre amigo que me acolheu. E estive em Assis, gostei muito e vi o corpo de um jovem que vai ser canonizado, Carlo Acutis. Morreu com pouca idade, e ele era um devoto, era um especialista, um génio na internet, e conseguiu com a sua capacidade lançar estas convicções: o amor à Eucaristia, a Eucaristia que é um sinal de presença de Cristo.
E, portanto, quando celebramos a Eucaristia, os rituais são muito iguais, mas é com a obediência a Jesus Cristo. Ele disse: ‘fazei isto em memória de mim’ e fazemo-lo com este amor a Jesus, porque ele é que manda fazer. Portanto, fazer e nunca se cansar de participar na Eucaristia. A vida é assim. O que é que traz de diferente? Há um pormenor ou outro que é diferente…

O sermão de uma missa festiva em memória de Nossa Senhora dos Anjos tem mensagens específicas?
Sim. Falar de Nossa Senhora, e sempre em ligação a Jesus Cristo. E falar em Maria como exemplo máximo de mulher, o sinal perfeito de humanidade, ela que é Imaculada na sua concepção; ela que, ao chegar ao fim dos seus dias, Deus não permitiu que o seu corpo fosse corrompido, mas que subia aos céus em corpo glorificado. Dá gosto de falar de Nossa Senhora, e as pessoas gostam muito de que se fale de Nossa Senhora porque é um exemplo máximo de mulher, de mulher crente.
No catecismo católico, ela é apontada como um modelo de mulher de fé que acreditou no cumprimento da vontade de Deus. Nossa Senhora foi visitar a sua prima Santa Isabel, a sua velha e respeitada prima, a Ein Kerem – terra onde nasceu São João Baptista – e a própria Isabel é que reconheceu: ‘Quem sou eu para que venha ter comigo a mãe do meu Deus e Senhor? Feliz aquela que acreditou no cumprimento da vontade de Deus’. Isabel foi iluminada pelo Espírito Santo para sentir e com a convicção que aquela donzela que estava ali, já com o seu filho, Jesus, era a mãe do Senhor, a mãe de Deus. ‘Feliz daquela que acreditou’. E Maria é este exemplo.
Eu tenho pregado por aqui e acolá, e levo sempre um esquema, estudo e falo de Maria e dos dogmas em relação a Eva. Este dogma da Ascensão da Nossa Senhora do dia 1 de Novembro de 1950. O dogma da Imaculada Conceição, a definição dogmática. Quer dizer, o Papa, interpretando todo o pensar da Igreja – todo o sentir, todo o pensar e todas as convicções de todos os cristãos, pastores e doutores da igreja de escolas universidades católicas – chegou à conclusão, no dia 8 de Dezembro de 1954, que Maria é imaculada na sua concepção. Quer dizer, está isenta de mácula. Maria é um caso único e as pessoas gostam quando explicamos tudo isso. É falar de Nossa Senhora como alguém que é a fonte de inspiração para nós sermos bons cristãos.

Há um grande sentido de fé…
Sim, é a fé que está na base. Nossa Senhora é o modelo, por excelência, de alguém que acreditou na vontade de Deus, nos desígnios de Deus a seu respeito. E, portanto, ela é uma fonte de inspiração, além de exercer a sua maternidade espiritual sobre nós, porque ela tornou-se nossa Mãe, na pessoa de São João – João, o evangelista, o discípulo amado. No alto da cruz Jesus disse: ‘João, eis a tua mãe’ e disse para ela ‘mulher, eis o teu filho’. E na pessoa de São João ficámos todos filhos e espirituais de Maria. Isso é muito importante. E, portanto, ela é uma mãe solícita, uma mãe carinhosa, que olha para todos os seus filhos que são queridos com um olhar de predilecção. No olhar, a gente manifesta o que está cá dentro, são janelinhas do nosso interior e de toda esta casinha que está aqui, do coração espiritual. Todos são queridos e amados por Maria e, como tal, ela quer-nos levar ao seu querido filho, que é Jesus, o Senhor de Cristo. Jesus é que é tudo para nós e com ele adoramos e amamos o nosso Querido Pai. Gosto de dizer isto: ‘Querido Pai’.
E também vou dizer uma coisa: depois de uma pessoa ter umas perdas de família, um irmão, um pai, uma mãe, já não os tem. E cada vez mais o amor e a fé se intensificam mais para com o nosso querido Deus, Pai Filho e Espírito. E Nossa Senhora ajuda-nos muito a aceitar tudo isto com carinho e com amor. Nós estamos aqui de passagem. Essa vida de transitoriedade é irrepetível – é só uma vez que passamos por aqui. Além de mais, é irreversível, não volta atrás. E vamos caminhando sempre para uma eternidade e uma das coisas mais belas que eu posso acreditar é na eternidade.
E Jesus fala-nos tantas vezes da eternidade que é mistério. Quem não compreende, não compreendemos, somos umas criancinhas sem saber de nada, mas temos a luz da fé que nos leva a dizer: ‘a vida não acaba por aqui, a vida passa por aqui e depois dá um outro salto de qualidade’. Acredita em Jesus, ele é que nos fala, ele é que nos diz que a vida não pára por aqui: ‘Eu sou a ressurreição e a vida. Quem acredita em mim, ainda que venha a morrer, viverá. E tudo o que vive e crê em mim, não morrerá jamais’. Ele disse isso a Marta, a irmã de Lázaro, e ao dizer isso a Marta, diz a cada um de nós. Portanto, nós intensificamos cada vez mais estas convicções, amadurecemos as convicções, amadurecemos e crescemos na fé, nesta luz que é a fé que nos ilumina e que nos faz confiar em alguém que não se engana nem nos pode enganar que é Jesus. Jesus é verdade. Não nos diz mentiras.
Eu acredito que estamos aqui como peregrinos e Nossa Senhora ajuda-nos a fazer esta peregrinação, a fazer esta romaria da vida até um dia entrarmos na plenitude. Ou seja, no encontro definitivo com o nosso Deus (…).

Alguns milhares de pessoas que vão para Água de Pau assistir à procissão de Nossa Senhora dos Anjos vão atrás de quê?
Vão atrás de quê? Vão participar. É um momento bonito, e mesmo os imigrantes e os forasteiros vêm de fora porque aqueles são momentos que as pessoas gostam; gostam de ver uma procissão. Eu tenho esta coisa que foi criada por mim de colocar a procissão na rua ao mesmo tempo que vou explicando tudo em síntese…

Sente que as pessoas vão à procura de conforto?
Sim. Eu acredito que há muita necessidade de amparo e também de conforto. As pessoas precisam.

O que é que ficou por dizer?
Deixar uma saudação a todos. Saudar com muito carinho. Desejar boas-vindas às festas de Nossa Senhora dos Anjos. Abrimos os braços para todos para poderem participar nas celebrações, nos arraiais e na procissão. Todos são bem-vindos e todos são queridos e queridas por Nossa Senhora e pelo nosso querido Deus Uno e Trino, o Pai o Filho e o Espírito. Isso é que importa.

João Paz/Daniela Canha
Edit Template
Notícias Recentes
PS/Açores abre porta para aprovar o Plano e Orçamento 2025 em acordo com o Governo dos Açores do PSD/A
Descarregadas 852,71toneladas de pescado em lota no mês de Agosto representa uma queda de 23,7% em relação a igual período de 2023
Encarregados de educação queixam-se das condições precárias em que se encontra a Escola do Aeroporto em Santa Maria
Empresa blueOASIS “quer tornar os Açores no Silicon Valley das tecnologias oceânicas”
Empresa blueOASIS “quer tornar os Açoresno Silicon Valley das tecnologias oceânicas”
Notícia Anterior
Proxima Notícia
Copyright 2023 Correio dos Açores