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O Memorial é um grande “Livro de Família” e da Identidade Histórica da Praia da Vitória

Qual o historial bibliográfico, autoral e temático deste emblemático livro de referência açoriana?
Esta edição do Memorial da Praia da Vitória, tal como a sua primeira publicação (em 2002), traz a chancela da Câmara Municipal da Praia da Vitória e foi preparada na sequência de um projecto repensado e acordado com a actual presidente do Município.
Iniciativa editorial e cultural, em parte integrada não só na presente programação e conjuntura festivas da cidade da Praia – a par da coincidente inauguração do Núcleo Expositivo do Forte de Santa Catarina e da representação teatralizada sob o lema da Batalha de 11 de Agosto de 1829 – atendeu também, para além dessas formas de encenação simbólica e de representação estético-mostrativa e documental, a uma declarada intenção visando acentuar uma correlativa componente propriamente mais histórico-cultural, socio-memorial, patrimonial, narrativa e documental, aprofundadamente evocativa e até complementar. Deste modo, o Memorial sobremaneira visou também a respectiva inscrição da História desta antiga Vila terceirense no horizonte, mais amplo, das problemáticas críticas do Liberalismo em Portugal, embora aqui por relação mais próxima ou imediata aos vários acontecimentos ali encenados, conquanto integráveis nos múltiplos significados e demais implicadas leituras, ficcionais ou real e rigorosamente societárias, sociológicas e histórico-ideográficas daquele complexo fenómeno…
De resto esta nova edição (2024), tal como a anterior (2002) chama-se Memorial da Praia da Vitória, e é distinta, integrando contudo a reprodução integral do primeiro Memorial da Muito Notável Vila da Praia da Vitória (organizado por Vitorino Nemésio, em 1929, também a pedido da Câmara da Praia, precisamente para assinalar então o Centenário da referencial Batalha de 11 de Agosto de 1829).

Pode caracterizar essas sucessivas edições do Memorial, diferenciando-as?
Sim. Trata-se temporal, objectiva e efectivamente de uma diferenciação evolutiva, embora seguindo nós a forma modelar ou esquemática da selecção e da configuração evocativas e temáticas nemesianas, isto é, aquela que ele tinha em vista, viabilidade de acesso documental, situada percepção histórico-institucional, óptica académica, confluência estilística e literária, etc., além de um particular horizonte existencial bem timbrado de memória e reflexão… Porém, regressando à especificidade do nosso Memorial, devo salientar principalmente, como fiz na Sessão de Lançamento e Apresentação desta obra, o seguinte:

  • Esta nova publicação da Câmara Municipal da Praia da Vitória constitui como que uma segunda edição da obra que, em 2002, havia retomado, aumentando-o e atualizando-o já então, tal como agora mais se íez, com novos textos e imagens, o raríssimo e íamoso Memorial da Muito Notável Vila da Praia da Vitória.
    Tratava-se então, em 1929, de celebrar a efeméride centenária e um acontecimento socio-histórico que a obra nemesiana naquela data contemplaria em especííicos contextos e interesses multidisciplinares, numa articulação de discursos historiográíicos, narrativos, estéticos e literários, cujos núcleos, diíerenciados e explanados em vários géneros de produção intelectual, estudo e escrita, acabariam, aliás, por coníluir e maniíestar-se tanto na sua Obra literária (romanesca, contista e poética) como na sua Obra propriamente académica, cientííica e ensaística, ao longo da vida e de uma paradigmática auto-reíerenciação.

Este Memorial da Praia da Vitória continua a ter, actualizado novamente, um carácter de antologia, à semelhança do antigo Memorial da Vila da Praia…
Exactamente! A obra que agora apresentamos reveste-se precisamente de um perfil histórico-bibliográíico e de um conteúdo temático e compósito único e sequencial, porquanto integra, numa linha complementar idêntica e antologicamente coerente, imagens e textos bem datados e de proveniências autorais diferentes (v.g., sobre Nemésio e Garrett, os meus próprios e os de Carlos Reis e Alberto Sampaio da Nóvoa), para além daqueles, naturalmente preservados, cuja autoria era (e é) do próprio Nemésio:

  • O primeiro Memorial abria com o Preâmbulo laudatório e agraciador (dirigido “aos leais habitantes da Ilha Terceira”), do Decreto Real de 12 de Janeiro de 1837, cujo Artigo 2.° (relativo à Vila da Praia, ao seu novo Título de “Muito Notável” e às suas respectivas Armas de Brasão camarário) é ali transcrito.
    Segue-se-lhe a fabulosa “Carta-Prefácio”, datada de 3 de Julho de 1929, dirigida por Vitorino Nemésio a Ramiro Machado, onde o jovem académico coimbrão salienta que o seu Memorial “não é uma história da Praia, senão, na parte que poderia naturalmente ter pretensões a isso, uma sebenta do que se refere nos Annaes”, ou seja, à prosa de Ferreira Drummond, à qual Camilo, diz parenteticamente o praiense, «numa hora de crueldade, chamou ‘indigesta e mal feita’»…
  • Vem depois um extracto da História Insulana do P.e António Cordeiro, com a “Descrição da Praia e seu termo”, logo seguido do longo e central repertório do próprio organizador da obra, feito essencialmente a partir de Drummond, rebuscando a “História Geral da Vila”…
    E de seguida aparecem Almeida Garrett com a sua alusiva Ode-Canção “A Lealdade em Triumpho ou A Victória da Praia”, antecedendo o detalhado estudo de Belisário Pimenta sobre “A acção do dia 11 de Agôsto de 1829”, para de novo surgir um outro texto de Nemésio, “A Terceira durante a Regência (1830-1832)”, notoriamente já sob o percurso da sua investigação para a Tese de Doutoramento sobre Herculano. Finalmente, o Memorial nemesiano de 1929 encerra com o estudo do Prof. Vergílio Correia sobre “Os Portais da Matriz da Vila da Praia da Vitória”.
  • Agora, a presente publicação, com novos e contemporâneos arquivos fotográficos sobre aspectos urbanísticos, patrimoniais, culturais e paisagísticos da Praia da Vitória, contém também uma “Nota Introdutória” da presidente desta Autarquia (que substitui a do anterior presidente José Fernando Gomes), os extensos Ensaios, Estudos e outros Documentos relativos às Comemorações Garrettianas e Nemesianas praienses, uma Resenha histórica da igreja Matriz de Santa Cruz da Praia da Vitória, entre demais peças documentais e de imagens mais antigas (décadas de 1900-30), contrapostas às outras mais recentes (1999, 2001, 2002 e 2024), como foi explicado.
    Deste modo, esta edição atualizada do Memorial da Praia da Vitória (já de há 22 anos), que tive o gosto e a honra de tornar a coordenar, prefaciar e cuja direcção bibliográfica e aditamento de estudos e ensaios é igualmente da minha responsabilidade, foi publicada com a chancela da Câmara Municipal (actualmente presidida por Vânia Figueiredo Ferreira), nas suas páginas incluindo-se o texto central e as ilustrações originais do trabalho de Nemésio (cuja capa e textos foram inteiramente reproduzidos), mas abrangendo logo o primeiro registo das Comemorações Municipais do Bicentenário do Nascimento de Garrett (1999), do I Centenário do Nascimento de Vitorino Nemésio e do XX Aniversário da Elevação da Praia da Vitória a Cidade (2001 e 2002), efeméride esta que também foi consequentemente relembrada no dia 20 de Junho último, na Sessão Solene do 43.° Aniversário da elevação a Cidade desta antiga e histórica Vila terceirense.
  • Como se poderá ver pelos conteúdos que acima explicitei, e já anteriormente pude cotejar, tanto o nosso Memorial de 2002 quanto este de 2024 (ambos, portanto, já não somente réplicas daquele de 1929), titulando-se desde então e doravante ambos como Memorial da Praia da Vitória, distinguem-se do original, prolongando-o e aumentando-o substancialmente, não só bibliograficamente retendo aquilo que os nossos antepassados e antecessores comemoraram, festejaram, também herdaram e viveram na iniciais décadas do século passado, e ao qual, de maneira directa ou indirecta, foram, eles próprios, dando forma evolutiva, historicidade identitária e memória colectiva (sempre tecidas estas, como afirmei, na conjugação destinal da chamada intra-história de Unamuno com a longa duração de Braudel, por entre muitos dos grandes, universais e cruciais desafios e respostas que Toynbee tematizou…).
    Por outro lado, nestes mesmos propósitos inseriu-se este ano a escolha, que propus, do historiador Sérgio Rezendes, especialista em História Militar, e que foi intencionalmente formulada para acentuar a dimensão não só estratégica (em estrito sentido militar) quanto uma vertente institucional, político-administrativa e, enfim, socio-ideologicamente implicada e potencialmente dirigida à questão do Poder Regional e Nacional (e por aí até às contemporâneas questões da Autonomia.).

Afirmou no seu discurso que este renovado Memorial era de certo modo um “livro de família”. Porquê?
Porque, para além de tudo o que na Tábua Gratulatória e na Ficha Técnica quis deixar explicitamente recordado e registado – e que se reflectiu no todo da obra, desde o esmerado trabalho gráfico até à generosidade de todas as colaborações, quase intemporais, que me foram prestadas. -, com vinte e dois anos de distância entre as duas edições do Memorial que coordenei e dirigi, atendi ao que a actual presidente da nossa Câmara havia escrito no seu “Prefácio”, testemunhando que este livro constitui “um estimável e erudito livro de referência, como obra emblemática e como guia de acesso a algumas das fontes mais importantes da História da Praia, e afinal da própria História de Portugal”, até por ser também “fruto e património de sucessivas gerações que aqui constituíram e ergueram vida, trabalho, família, sonhos e esperanças, enfim, uma Identidade e um Percurso que nos devem orgulhar, tal como este nosso Memorial exemplarmente regista, documenta, testemunha e mais deve solicitar, fazer merecer, preservar e engrandecer para o Presente e o Futuro!”:

  • Tive pois o dever e o gosto em subscrever e agradecer aquelas palavras, até porque, de certo modo, como alguém me dissera antes com perspicácia, este é afinal um livro de família, isto é, de famílias, raízes e heranças de muitas gerações de gente nossa e da nossa estima, na multisecular vida da Praia da Vitória e daquela história antiga, distante e todavia próxima e presente, enfim, como aquela a quem, no seu tempo, o Organizador do Memorial de 1929 recordou, recorreu e agradeceu, e eu, Coordenador e apresentador desta edição do nosso evolutivo Memorial, passados 95 anos sobre a publicação nemesiana, e 195 anos sobre a Batalha de 11 de Agosto, igualmente leguei à minha terra.
    (*) PROFESSOR UNIVERSITÁRIO. Texto revisto da Entrevista concedida ao “Diário Insular” e gentilmente cedido pelo Prof. Dr. Eduardo Ferraz da Rosa ao “Correio dos Açores”.
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