Reportando-me ao artigo “Pesos e medidas 17”, do passado dia 26 de Setembro, o Edital de 3 de Junho de 1861 da Câmara Municipal de Ponta Delgada, de que se publicou a tabela das taxas de afilamento, contém ainda a seguinte disposição:
“As medidas de capacidade do antigo systema, que ainda vigoram, serão aferidas na mesma oficina, ficando extincta a MEDIDA CORTADA para os liquidos.”
Cessou assim a prática de se cortar as medidas, ou seja, reduzi-las em, salvo erro, um quinto da sua capacidade nominal, a título de imposto retido “à cabeça” para o município, quem sabe se com vantagens para o vendeiro e prejuízo para o freguês…
Continuando o Governo a adoptaras providências que lhe parecem as mais eficazes para realizara reforma dos pesos e medidas, são extintas em 1861 a Comissão Central dos pesos e medidas, criada em 1852, e a Inspecção Geral dos pesos e medidas, criada em 1858. A fiscalização dos afilamentos fica desde então integrada no serviço ordinário e permanente das direcções de obras públicas em cada um dos distritos administrativos do reino e ilhas adjacentes.
O afilamento das medidas, balanças e outros instrumentos de medir utilizados no serviço dos estabelecimentos do estado, é cometido aos aferidores das inspecções dos distritos em que esses estabelecimentos existirem e, no distrito de Lisboa, aos aferidores da Repartição de pesos e medidas.
Tendo entrado em vigor a medida linear “metro” em 1860e a medida de massa “quilo”em1861, falta, para completar a geral adopção do sistema métrico decimal em todo o reino, a entrada em vigor das medidas de volume e capacidade, “para substituir as medidas diferentes de variadissima construcção e capacidade que se usa hoje, com grande embaraço para o comercio, e gravissimo prejuizo para os povos”.
Se em relação ao metro e ao quilo, cujas adopções menos dificuldades ofereciam, foi cumprido o prazo constante do Decreto de 13 de Dezembro de 1852 (‘o novo sistema deverá estar em pleno vigor dez anos depois da publicação do decreto’), o mesmo não aconteceu relativamente às medidas de volume e capacidade.
Em 1867– já passavam uns anos da data-limite –aquele prazo de dez anos é prorrogado até 1 de Janeiro 1870pelacarta de lei de 16 de Maio do rei D. Luís.
No período que vai decorrer desde a data da publicação desta carta de lei até 31 de Dezembro de 1869, “o governo mandará concluir todos os trabalhos preliminares que são necessários para a geral adopção das novas medidas no reino e no ultramar”.
A carta de lei de 16 de Maio de 1867 contém imposições que visam o “corte” com o passado e que interessa referir:
–Dentro deste novo prazo, será designada em todos os contratos e actos públicos a correspondência entre as antigas medidas e as novas, cuja adopção for decretada.
– Cessam em todos os contratos e actos públicos a designação da correspondência entre os novos e antigos pesos.
– O uso ou a simples detenção de pesos ou de medidas falsas será punido nos termos do Código Penal.
–Serão punidos com multa (pesada) todos aqueles que, em anúncios, avisos, editais ou outras publicações que não sejam científicas, literárias ou políticas, empregarem para designar pesos e medidas denominações diferentes da nomenclatura do sistema métrico decimal, adoptada pelo decreto de 1852.
–Serão punidos com multa (pesada) os professores das escolas públicas e os directores e professores de colégios, liceus ou outros estabelecimentos particulares de instrução, que ensinarem sistema de pesos e medidas que não seja o legalmente estabelecido; a1.ª reincidência implicará a duplicação da multa e a 2.ª reincidência a demissão dos professores públicos e a proibição de os estabelecimentos particulares continuarem abertos.
– Se a infracção for cometida nos asilos e instituições de beneficência e caridade, a multa é menor e serão punidos unicamente os professores ou mestres.
Como veremos, o prazo até 1 de Janeiro de 1870 para a conclusão de todos os trabalhos preliminares irá revelar-se insuficiente. Em Agosto daquele ano de 1867 é publicado um decreto para pôr em vigor as medidas de volume e capacidade e também as medidas de superfície, mas só estas, por serem mais simples, entrarão em vigor.
Quanto ao litro, com os seus múltiplos e submúltiplos, os potes, cântaros, alqueires, fangas e quartilhos ainda vão durar uns tempos, até que finalmente o litro os substitua, primeiro nas cidades de Lisboa e Porto, e só depois no resto do reino, no “Portugal profundo”, como diríamos hoje.
Ferreira Almeida